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1. AUTENTICAÇÃO E RECONHECIMENTO DE FIRMA

A pessoa que deseja abrir firma deve comparecer ao cartório com seu RG original. Lá chegando, deverá escrever sua assinatura três vezes em um cartão fornecido pelo cartório e preenche-lo com seus dados (esse cartão é chamado de cartão de autógrafo ou cartão de assinatura). A partir desse momento, a pessoa passará a ter firma aberta no cartório, e, quando necessário, qualquer interessado poderá lá comparecer para reconhecer a firma dessa pessoa nos documentos por ela assinados (reconhecimento de firma por semelhança).

Importante: Algumas pessoas mudam sua assinatura com o passar dos anos (exemplos: muda o nome quando se casa e inclui o sobrenome do marido ou até mesmo a assinatura em si muda com o passar dos anos). Assim, caso haja mudança na assinatura, é preciso que a pessoa compareça novamente ao cartório para renovar seu "cartão de autógrafo" ou "ficha de firma".
Autenticação significa confirmar que a cópia (xerox) de um determinado documento é fiel (igual) ao original conhecida como “cópia autenticada”. O serviço poderá ser solicitado em qualquer parte do país e por qualquer pessoa, desde que apresente o original do documento a ser copiado. É um serviço prestado e entregue na hora.

Os tipos de autenticação são:

Autenticação de cópia – o Tabelião (ou prepostos) tira a “xerox” e declara na própria cópia que é idêntica ao seu original, atribuindo a ela a mesma validade do documento verdadeiro.
Autenticação de cópia eletrônica – o Tabelião (ou prepostos), após análise da assinatura digital ou do código de validação/autenticação, declara que a cópia é idêntica ao documento eletrônico apresentado, atribuindo a ela a mesma validade do documento de origem.
A comunicação de venda é feita por meio do Certificado de Registro de Veículo (CRV). O CRV deve estar devidamente preenchido, incluindo as assinaturas do vendedor e comprador e a data de ambas, para o reconhecimento de firma.
Reconhecimento de Firma significa “reconhecimento de assinatura”.

É um serviço prestado pelo Cartório de Tabelionato de Notas ou Consulados Brasileiros em que o Tabelião (ou prepostos) ou Consul confirma que uma assinatura constante num documento é de determinada pessoa. Pode ser realizado em qualquer Cartório do país ou Consulados Brasileiros (outro país) em que a pessoa que assinou o documento tenha o registro e o arquivo da sua assinatura. Uma pessoa pode ter sua assinatura registrada e arquivada em vários Cartórios do país.

Os tipos de reconhecimento de firma são:

Autêntico ou Verdadeiro – A pessoa que assinou o documento deverá comparecer ao cartório com seu documento de identificação no ato do reconhecimento de firma.
Semelhança ou Semelhante – Não é necessária a presença do interessado e qualquer pessoa pode apresentar o documento e solicitar o reconhecimento da firma. Neste momento sua assinatura é comparada com aquela arquivada no cartório.
Reconhecimento de Sinal Público significa “reconhecimento de assinatura do Tabelião (ou prepostos/escreventes)” que assinou um determinado documento ou serviço emitido ou realizado por cartório.

Pode ser solicitado por qualquer pessoa e em qualquer Cartório de Tabelionato de Notas do país.
É um serviço prestado e entregue na hora.

2. DIVERSOS

A lei 14.382/2022, de 27 de junho de 2022, institui a possibilidade da regularização imobiliária via adjudicação compulsória extrajudicial.

O pedido pode ser feito pelo promitente comprador, seus sucessores ou algum cessionário, caso os direitos do compromisso de compra e venda tenham sido cedidos a terceiros.
Apostilamento é o ato de garantir que um documento brasileiro tenha validade no exterior.

São apostilados somente documentos emitidos no Brasil e traduzidos por tradutores juramentados (registrados nas Juntas Comerciais).
Qualquer pessoa poderá solicitar o apostilamento de documentos.
Não é necessário estar no local de residência da parte para solicitar o serviço, ou seja, poderá ser feito em qualquer Cartório de Registro Civil ou Tabelionato de Notas do Brasil.
É um serviço prestado e entregue na hora.
Documentos para outro país? Apostilamos e entregamos na hora!

Atenção: As documentações particulares, tais como diplomas, históricos, certidões negativas, etc, necessitam de prévio reconhecimento de firma das pessoas responsáveis pela emissão dos documentos. Exemplo: “Para o Diploma de graduação é necessário reconhecimento de firma do diretor da instituição que emitiu o diploma”.
A ata notarial de constatação é um instrumento dotado de fé pública e de força de prova pré-constituída, por meio do qual o tabelião, seu substituto ou escrevente, a pedido de pessoa interessada, constata fielmente os fatos, as coisas, pessoas ou situações para comprovar a sua existência ou o seu estado. A ata notarial é considerada espécie de prova em processos judiciais cíveis, criminais, trabalhistas, eleitorais e administrativos.

Por meio da ata notarial de constatação, podem ser constatadas quaisquer situações, tais como: realização de assembleias e reuniões, conflitos fundiários ou de demarcação de terras, violação de direitos humanos, crimes eleitorais, estado de bens, mercadorias, imóveis, embarcações, automóveis, bem como quaisquer situações que possam se vistas ou ouvidas pelo tabelião ou seu escrevente autorizado.
É documento público, exigido por lei, que atesta o tempo de posse do requerente e seus antecessores, conforme o caso e suas circunstâncias. Para que serve? É um dos requisitos obrigatórios para o reconhecimento da usucapião extrajudicial.
Trata-se do documento de um ato já praticado no tabelionato.
Ela é utilizada quando é necessário transmitir ordens ou informações a serem cumpridas por terceiros, sejam eles órgãos públicos, particulares, instituições financeiras ou qualquer outra entidade envolvida no processo.
Testamento é o ato pelo qual a pessoa declara ao tabelião sua vontade, para depois de sua morte. O testamento pode ser utilizado para disposições patrimoniais e não patrimoniais.

Que tem herdeiros necessários (filhos, netos, pais, avós, marido ou mulher) deve reservar a eles a legítima (metade dos bens) prevista em lei, mas poderá dispor, mediante testamento, da parte disponível de seus bens (a outra metade).

3. ESCRITURAS PÚBLICAS

A Escritura de Compra e Venda é o ato lavrado no cartório de notas por meio do qual uma das partes vende determinado bem (móvel ou imóvel) para outra.

A pessoa deve comparecer ao Tabelionato de Notas, para que seja coletada a documentação necessária à realização do negócio jurídico e para tirar eventuais dúvidas acerca do procedimento.

Lembre-se: Quando envolve bem imóvel, depois de lavrada, a escritura de compra e venda deve ser registrada no Cartório de Registro de Imóveis competente. O próprio cartório pode providenciar esse trâmite junto ao registro imobiliário.
A dação em pagamento é o processo em que você oferece um bem ou serviço em troca da quitação de uma dívida. Regulamentada pela legislação vigente, essa é uma possibilidade para quem precisa facilitar o pagamento do débito em aberto.
A escritura declaratória é o instrumento jurídico através do qual os signatários fazem declarações de fatos que desejam ou cuja existência conhecem. A escritura declaratória pode ser de diferentes tipos e ter finalidades diversas.
A Escritura Pública de Doação é o ato feito e assinado por meio do qual uma das partes doa determinado bem (móvel ou imóvel) para outra.

Atenção: geralmente a doação é gratuita, mas também pode ser onerosa, ou seja, pode ser estipulada uma contraprestação, como por exemplo, o compromisso de se construir uma escola no terreno doado.
Existe uma grande diferença entre separação e divórcio. Porém, os dois conceitos fazem parte de um mesmo processo. Ambos são necessários para o casal que quer abrir mão dos deveres do casamento. Continue a leitura e entenda melhor!

Divórcio é sempre um assunto polêmico, mas entendê-lo é uma necessidade para o casal que decide que não quer mais manter o casamento. Com mais frequência do que você imagina, as pessoas confundem “separação” com “divórcio”, embora sejam conceitos distintos.

Primeiro, é necessário entender que divórcio e separação são o que a lei chama de “causas terminativas da sociedade conjugal”. Complicado? Nem tanto! Em outras palavras, tanto divórcio quanto separação são escolhas que as pessoas fazem quando decidem dissolver o casamento.

Mas ao separar-se de um parceiro, você não está necessariamente divorciado (a). Continue a leitura e entenda mais.

Separação não é o mesmo que divórcio É preciso entender que separação é uma etapa anterior ao divórcio. A separação acontece quando o casal decide que não quer mais viver junto e “separam-se de cama e mesa”.

Quando essa decisão é tomada, o casal suspende os deveres matrimoniais como coabitação, fidelidade recíproca e regime de bens.

Contudo, a separação não acaba com o vínculo matrimonial, o que significa que os separados não podem contrair qualquer outro casamento enquanto não divorciarem-se!

Portanto, se você quer separar-se e pretende desfazer totalmente o vínculo matrimonial, o divórcio é a forma jurídica de extinguir totalmente o casamento.

Se o casal não possuir filhos menores de idade ou incapazes e a decisão de divórcio for consensual, o processo pode ser realizado no próprio cartório. Porém, mesmo para divorciar-se no cartório, a presença de um advogado é requisitada!
O inventário extrajudicial é um procedimento utilizado para apuração dos bens, direitos e dívidas do falecido. Isso permite que seja instrumentalizada a transferência da propriedade dos bens aos herdeiros.

A Lei 11.441/07 permitiu a realização desse ato em cartório, por meio de escritura pública, de forma rápida, simples e segura. Mesmo que a pessoa tenha falecido antes desta lei, também é possível fazer o inventário por escritura pública, desde que os requisitos da lei sejam preenchidos.
A permuta de imóveis funciona da seguinte forma: duas partes interessadas negociam e concordam em trocar as suas propriedades imobiliárias, tendo como base uma avaliação justa dos imóveis envolvidos na transação.
É o ato pelo qual os futuros cônjuges estipulam o regime de bens que irá vigorar concernente ao patrimônio durante a constância do casamento.

Quem deve comparecer?
Ambos os futuros cônjuges.

O pacto antenupcial somente é necessário caso os noivos optem por um regime de bens diferente do regime legal, que é o regime da comunhão parcial de bens ou, em alguns casos especiais, o regime da separação obrigatória de bens. Ou seja, somente quem deseja casar pelo regime da separação de bens, comunhão universal de bens, participação final nos aquestos ou por um regime de bens misto precisa fazer um pacto antenupcial.

O pacto antenupcial deve ser feito por escritura pública no cartório de notas e, posteriormente, deve ser levado ao cartório de registro civil onde será realizado o casamento, bem como, após a celebração do casamento, ao cartório de registro de Imóveis do primeiro domicílio do casal para produzir efeitos perante terceiros e averbado na matrícula dos bens imóveis do casal. O regime de bens começa a vigorar a partir da data do casamento e somente poderá ser alterado mediante autorização judicial.
O que é a união estável heteroafetiva?

É a união entre homem e mulher que se configure em convivência pública, contínua e duradoura com o objetivo de constituir família, na qual se aplicam os deveres de lealdade, assistência, respeito, guarda, sustento e educação dos filhos. Atualmente, não há distinção entre escritura de união estável homoafetiva e heteroafetiva, referindo-se a ambas como escritura de união estável.

O que é uma união estável homoafetiva?

Trata-se da união entre duas pessoas do mesmo sexo, cujo status de entidade familiar foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, em 05.05.2011, no bojo das ADPF n° 132 e ADI n° 4277, garantindo a esta união todos os direitos e garantias atribuídos às uniões heteroafetivas, previstos no § 3°, do art. 226, da Constituição Federal e art. 1723, do Código Civil Brasileiro.

Como se formaliza a união estável?

A união estável pode ser formalizada através de escritura pública declaratória lavrada em Cartório de Notas.

Pessoas casadas podem viver em união estável?

Sim, desde que a pessoa casada esteja separada de fato. A exceção à regra está prevista no § 1º, do art. 1723, do Código Civil de 2002, que permite a lavratura de escritura declaratória de união estável, quando um dos declarantes seja casado, mas, separado de fato, do outro cônjuge.

Quais são os requisitos para a lavratura de união estável?

A lei não exige prazo mínimo de duração da convivência, tampouco que o casal viva sob o mesmo teto, basta que a união seja pública, contínua, duradoura e com a intenção de constituir família, cabendo aos interessados comparecer em cartório munidos de identidade de CPF e declararem o regime de bens aplicável à união.

4. PROCURAÇÕES E SUBSTABELECIMENTOS

É o ato em que uma pessoa/interessado (física ou jurídica) nomeia alguém de sua confiança (procurador) para praticar atos em seu nome. A pessoa que outorga (passa) os poderes, pode estabelecer algumas condições no instrumento, conforme sua vontade.

Exigências:

Pessoa Jurídica
Último Contrato Social consolidado ou Estatuto Social
Última Ata de nomeação do representante
Certidão Simplificada (emissão máxima de 30 dias)
CNPJ
Documentos pessoais dos representantes

Pessoa Física
Interessado maior de 18 anos de idade:

Deverá comparecer
Documento de identificação – original
Número do CPF
Nacionalidade (declarada verbal)
Profissão (declarada verbal)
Endereço (declarada verbal)
Substabelecimento é o instrumento pelo qual o procurador transfere os poderes recebidos para outra pessoa, que irá substituí-lo na prática dos atos em nome do outorgante originário. O substabelecimento pode ser total ou parcial, com ou sem reserva de poderes.

Documentos Necessários

- Ata Notarial (lavrada no Tabelionato de situação do imóvel)
- Planta e memorial descritivo assinados por profissional legalmente habilitado e com prova da Anotação da Responsabilidade Técnica – ART
- Requerimento, assinado por advogado, com os requisitos do art. 3º do Prov. 65/2016 do CNJ
- Documentos que demonstrem a origem, a continuidade, a natureza e o tempo da posse.
- Demais requisitos do Provimento 65/2016 do CNJ.
- Prazo legal de análise: 10 dias úteis.
- EP de pacto antenupcial, original ou cópia autenticada pelo mesmo Tabelionato que foi lavrada.
- Certidão de casamento
- Requerimento, solicitando se quer o registro do pacto antenupcial somente no Livro 3-RA, ou também em alguma matrícula (indicar qual a matrícula)
- Prazo legal de análise: 10 dias úteis.
OBS: documentos serão devolvidos, com exceção do requerimento
- É necessário trazer a Escritura Pública que foi lavrada no Tabelionato para registrar.
- Prazo legal de análise: 10 dias úteis.
OBS: após o registro a Escritura Pública será devolvida
- Termo de cancelamento, assinado pelo representante do credor, com firma reconhecida por Tabelião de Notas.
- Prazo legal de análise: 05 dias úteis.
OBS: documentos ficarão arquivados.
- Se a partilha se deu por processo judicial, será necessário apresentar o formal de partilha.
- Se a partilha se deu extrajudicialmente, via Tabelionato, é necessário apresentar escritura pública e escrituras de cessão (se for o caso).
- Prazo legal de análise: 10 dias úteis.
OBS: documentos serão devolvidos
- Requerimento, com firma reconhecida por Tabelião de Notas
- Certidão de óbito (original ou cópia autenticada)
- Guia de avaliação ITCD (Tabelionato)
- Prazo legal de análise: 10 dias úteis.
OBS: documentos ficarão arquivados.
- Requerimento, com firma reconhecida por Tabelião de Notas
- Certidão da prefeitura da demolição
- Certidão negativa de débitos da Receita Federal relativo à demolição.
- Prazo legal de análise: 10 dias úteis.
OBS: documentos ficarão arquivados
- Requerimento, com firma reconhecida por Tabelião de Notas
- Certidão da prefeitura ou Carta de habitação (original ou cópia autenticada).
- Certidão negativa de débitos da Receita Federal relativo à edificação.
- No requerimento deve ser declarado o valor da construção. Se o imóvel é financiado, o valor declarado deve ser o mesmo que foi declarado no financiamento.
- Prazo legal de análise: 05 dias úteis.
OBS: documentos ficarão arquivados
- Requerimento, com firma reconhecida por Tabelião de Notas
- Certidão da prefeitura (se o imóvel for urbano)
- Planta
- Memorial descritivo
- ART ou RRT ou TRT
- Prazo legal de análise: 10 dias úteis.
OBS: documentos ficarão arquivados
- Requerimento, com firma reconhecida por Tabelião de Notas
- Certidão da prefeitura (se o imóvel for urbano)
- Planta
- Memorial descritivo
- Aprovação ambiental
- ART ou RRT ou TRT
- Prazo legal de análise: 10 dias úteis.
OBS: documentos ficarão arquivados.
- Contrato original
- Certidão de pagamento de ITBI
- Declaração quanto a redução de emolumentos (se for o caso)
- Prazo legal de análise: 15 dias corridos.
OBS: documentos ficarão arquivados.
De acordo com o §5º do art. 221 da Lei Federal 6.015/73: Os escritos particulares a que se refere o inciso II do caput deste artigo, quando relativos à atos praticados por instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário autorizadas a celebrar instrumentos particulares com caráter de escritura pública, dispensam as testemunhas e o reconhecimento de firma.
- Contrato social ou alteração contratual em que conste a integralização, devidamente registrada no órgão competente.
- Guia de ITBI relativo aos imóveis integralizados.
- Prazo legal de análise: 10 dias úteis.
OBS: documentos ficarão arquivados

Certidão Digital

O que é uma certidão digital?

Certidão digital é uma modalidade de certidão de matrícula do imóvel, pacto antenupcial ou de outro ato registral, expedida em formato eletrônico, ou seja, por meio de arquivo digital. Este arquivo está em conformidade com os requisitos da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira ICP e da arquitetura e-PING (Padrões de Interoperabilidade de Governo Eletrônico) e tem a mesma validade e eficácia jurídica de uma certidão física (impressa e assinada manualmente), por isso faz prova pré-constituída.

O fundamento constitucional do certificado digital é o princípio da segurança jurídica e o seu fundamento legal é a Medida Provisória 2200/2001 que instituiu a ICP-Brasil.

Art. 1o Fica instituída a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, para garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras.

Art. 10. Consideram-se documentos públicos ou particulares, para todos os fins legais, os documentos eletrônicos de que trata esta Medida Provisória.

§ 1o As declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários, na forma do art. 131 da Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916 - Código Civil. Código Civil atual – artigo 219 – As declarações constantes de documentos assinados presumem-se verdadeiras em relação aos signatários.

A ICP-Brasil fiscaliza e audita o processo de emissão de certificados digitais das autoridades certificadoras integrantes a fim de garantir total confiabilidade ao processo de certificação. Desta forma dá respaldo à presunção legal de integridade, autenticidade e não-repúdio dos arquivos assinados digitalmente.

A certidão digital é um certificado digital com assinatura digital. A assinatura digital é uma tecnologia que permite dar garantia de integridade e autenticidade a arquivos eletrônicos. É um conjunto de operações criptográficas aplicadas a um determinado arquivo, tendo como resultado o que se convencionou chamar de assinatura digital.

A assinatura digital permite comprovar: (i) que a mensagem ou arquivo não foi alterado; e, (ii) que foi assinado por quem possui a chave criptográfica (chave privada) utilizada na assinatura.

A visualização do conteúdo e a verificação de autenticidade deste documento digital – certidão – somente poderão ser feitas por meio do assinador ARISP disponível para download gratuito no site do Registro de Imóveis de Lajeado –www.regimo.com.br ou no site da Associação de Registradores de Imóveis de São Paulo-RS – www.arisp.com.br

Como posso solicitar uma certidão digital?
A solicitação pode ser feita no próprio site do Cartório.

É possível imprimir uma cópia da certidão digital?
Sim é possível, mas esta não vale como certidão ou documento.

Onde posso armazenar a certidão digital?
No próprio computador, pendrive ou outra mídia compatível.

É possível atualizar a certidão digital?
Sim é possível. Basta solicitar nova certidão, que será expedida em outro arquivo digital com data atualizada.

Doutrina

1. A doutrina e a prática brasileiras do Direito registral imobiliário já se habituaram com o freqüente recurso aos princípios hipotecários ou registrais, quer para arrumar conceitos e proposições para algum modo de saber científico do Registro de Imóveis, quer para decidir, juris-prudencialmente, os casos particulares dessa esfera segmentar do Direito.

Já no ano de 1991, aqui mesmo em Maceió, durante o XVIII Encontro de Oficiais de Registro de Imóveis do Brasil, promovido pelo IRIB, ministraram-se, por proposta de Maria Helena Leonel Gandolfo, diversas aulas que, tal o curso que ora se renova, se dividiam por vários dos princípios hipotecários. Mais de dez anos são agora passados, e ainda se pensa, entre nós, com bons motivos, que as meditações doutrinais e as decisões aplicativas do Direito registral imobiliário devam, de comum e quodammodo, referir-se àqueles princípios.

Nas duas últimas décadas, uma considerável parcela dos pensadores brasileiros do Registro de Imóveis esteve tendencialmente à volta de uma Principiologia que se poderia qualificar de dogmática, porque essencialmente ocupada da invenção do rol possível e do conteúdo dos princípios hipotecários enquanto vigentes na lei e tal como vigentes na legislação do Brasil. Essa limitação a umas condições locais, vale dizer, ao ordenamento jurídico positivo brasileiro, por importante que se revele — e isso não se está a negar — não poderia ser objeto suficiente para a formação de uma ciência. Verdade é que próprio de toda ciência é estudar as causas e os princípios das coisas: é o que se lê em Aristóteles, ao fim do Livro II da Metafísica (Kkk. 995 a 20). Mas é também de Aristóteles, agora no fecho do Livro III dessa obra, a afirmação de que a ciência é sempre universal, de maneira que se alguns singulares se tomam como princípios é necessário, se desejamos alcançar o nível da ciência, retroceder a outros princípios que possam predicar-se universalmente (Bkk. 1.003 a 15). Sem que aqui se esteja a recusar, pois, a relevância das investigações dogmáticas, o fato é que nossa dominante Principiologia registral-imobiliária terminou por se contentar, freqüentemente, em ser apenas um modo de abreviar a referência verbal aos dogmas normativos: um princípio, nesse quadro, será só a própria lei expressada com outras palavras.

Se a transposição para o plano consistente de uma Principiologia científica do Registro Imobiliário talvez, entre nós, possa ainda reclamar algum tempo adicional de desenvolvimento, contribuições doutrinárias mais recentes — a título ilustrativo, pensemos, sem com isso excluir outros estudos e pensadores, nas reflexões de Luiz Egon Richter, de Regnoberto Marques de Melo Júnior e de Sérgio Jacomino —, essas contribuições permitem antever com justificada esperança a desenvoltura científica de nossa comunidade registral.

As dificuldades, porém, não são pequenas. A elaboração de uma Principiologia científica para o Direito do Registro imobiliário deve começar pela amplitude do conceito mesmo de princípio e apreciar prontamente se seu objeto em ato, assim os alista possíveis o pensador argentino Félix Lamas, deverá ou não limitar-se a 1/ proposições inferidas de um ordenamento jurídico posto, ou se, diversamente, atingirá 2/ regras diretivas de interpretação, ou, ainda e além disso, 3/ princípios primários da razão prática e até mesmo 4/ a consideração do fim da ação e da instituição registrárias.

A resposta a essas primeiras indagações determinará a inclinação da doutrina brasileira do Direito registral-imobiliário dos próximos tempos, e propiciará a base indispensável para a complexíssima tarefa de ordenar a hierarquia relacional dos vários princípios hipotecários.

A só diversidade das funções suscetíveis de desempenho pelos vários princípios registrários permite avistar as dificuldades que aguardam nossos doutrinadores. Trata-se de, com os princípios, buscar a 1/ legitimação da instituição registrária, uma 2/ sistematização científica e critérios razoáveis para a 3/ interpretação (: função hermenêutica), a 4/ expressão (: assinalativa), a 5/ explicação (: didática), a 6/ comunicação da doutrina (: função dialógica), 7/ integração jurídica (: colmatação de lacunas do Direito posto) e a 8/ limitação do campo de atribuições dos registradores —recorte fundamental para assinar-lhe a esfera de independência jurídica. Por aí se compreende o vulto do empreendimento doutrinário que se projeta.

Estas pequenas notas de introdução ao estudo dos princípios hipotecários — princípios que, especificamente, serão aqui objeto das aulas de eméritos pensadores do nosso Direito registral —, estas notas limitar-se-ão a um breve apontamento sobre a eleição fundamental da Principiologia: equivale por dizer, se existem ou não princípios stricto sensu ao lado das normas e das conclusões gerais delas induzidas. Fácil é compreender que essa escolha servirá de base para o futuro não só de nossa doutrina registral, mas, em acréscimo, da própria instituição do Registro de Imóveis.

Para tanto, comecemos pelo começo, como quem diz: ao princípio pelo princípio.

2. Ainda que se possa apontar um núcleo duro para o conceito de “princípio” — i.e., origem, algo de que procede uma coisa dele distinta realmente —, sua forte carga analógica não permite uma simplificação cômoda da riqueza de seus muitos e vários significados.

O latim principium, principii designa “origem”, “começo”, mas também aponta para “superioridade” — e a reconstituição do idioma indo-europeu recolhe uma gênese comum (per) para os vocábulos latinos prior, primus e princeps, convergindo, em ordem à formação deste último termo, o verbo capere (: tomar, agarrar, compreender): daí entender princeps o que toma ou ocupa o primeiro posto, i.e., o princípio, a origem. Se considerarmos, porém, o nome plural principia (gen. principiorum), a língua latina oferece, entre outros significados, os de “fundamentos” e “regras morais”, que, de maneira símile, se apresenta no idioma grego: princípio é aí “origem” (: άρχέ), mas também significa fundamento (: βάσις), império (: χράτος) e norma (: γνώμε).

Aristóteles, como se lê no Livro V da Metafísica, relacionou seis acepções para a palavra άρχέ, e depois de referir a existência de outras tantas significações para esse termo verbal, concluiu que é comum a todos os princípios ser eles os primeiros desde os quais uma coisa é, faz-se ou se conhece (Bkk. 1.013 a).

Há, pois, na linha dessa divisão aristotélica, princípios entitativos (: princípios do ser), práticos (: princípios do agir e do fazer) e lógicos (: princípios do conhecimento). Os princípios entitativos correspondem à ordem especulativa das coisas: p.ex., os pais são o princípio de seus filhos. Os princípios lógicos integram-se ao âmbito a um só tempo especulativo e normativo com que não só espelham mas também dirigem as três operações lógicas da razão humana (: a de simples apreensão, judicação e discurso). Os princípios práticos compreendem a ordem tanto do agir humano — dirigida ao bem —, quanto do fazer do homem, i.e., o da construção de obras exteriores cujo fim é ser belas ou úteis.

Desses princípios, quais se devem considerar por objeto de uma ciência jurídica? Ora, a ciência do Direito é uma disciplina subalternada e recebe da Metafísica, da Antropologia, da Psicologia e da Ética, uma imensidão de dados que lhe provêm, pois, de ciências superiores. Ainda que os princípios entitativos não sejam objeto próprio de uma ciência normativa como é a ciência do Direito, esses princípios são imperados por superioridade ao juscientista: desse modo, não só as causas reais das coisas especuláveis, mas também suas condições (v.g., a luz para sacar-se uma fotografia) e ocasiões (influindo na possibilidade de agir), são princípios impostos ao Direito à conta de sua subalternação científica. Da mesma sorte, os princípios lógicos precedem a tarefa de toda ciência — incluída a própria Lógica —, e, portanto, submetem o saber jurídico.

Propriamente, contudo, o objeto da ciência do Direito é o operável, o agere do homem, a ação humana, enquanto dirigida ao bem devido e (a evitar) o mal nocivo a outrem. A direção desse agir é o constitutivo fundamental do saber jurídico. Se o facere humano, a construção de obras exteriores, interessa ao Direito, é só na medida em que corresponda à ação que se externa com a obra. Uma casa mal-construída, enquanto efeito, é objeto da Arte Edificatória. Mas já releva para o Direito a ação do arquiteto — que uma obra possa mostrar —, enquanto caiba coibir certas condutas no exercício profissional da Arquitetura, para que, desse modo, se dê a outros o que lhes é devido (vale por dizer, o suum cuique tribuere ou res justa que é o objeto da virtude da Justiça). Fácil é ver que o tema nuclear da Justiça é o da caracterização do suum: ou seja, que coisa é a coisa justa?

3. Aqui se chega ao ponto capital para a divisão das correntes principiológico-jurídicas.

Segundo uma já célebre distinção formulada por Robert Alexy, as correntes que admitem a existência diferenciada entre, de um lado, as normas jurídicas postas e, de outro, os princípios jurídicos, podem dividir-se em teorias débeis e teorias fortes. Aquelas, as teorias débeis, firmadas em critérios formais, freqüentemente esposadas por adeptos dos vários juspositivismos (p.ex., Bobbio, Carrió, Wroblewski), ora identificam os princípios do Direito com algumas normas fundamentais — comumente de porte constitucional —, ora só admitem como princípios jurídicos os induzidos das normas do ordenamento posto.

Os que, na divisão de Alexy, podem situar-se no plexo das teorias fortes (assim, os pensadores do jusnaturalismo tradicional contemporâneo, p.ex. e deixadas à margem algumas variações de posicionamento pessoal, Bernardino Montejano, Bigotte Chorão, Clóvis Lema Garcia, Danilo Castellano, Félix Lamas, Francesco Gentile, Miguel Ayuso, Paulo Ferreira da Cunha, Rodolfo Vigo, Soaje Ramos, Vallet de Goytisolo, ao lado de juristas com diversa filiação doutrinária: tal, brevitatis studio, é o caso de Ronald Dworkin), sustentam, em resumo, que a distinção entre os princípios jurídicos stricto sensu e as normas jurídicas positivas é de caráter substancial. Vale por dizer, os princípios jurídicos, no sentido estrito, são princípios válidos quoad substantiam e não em razão de uma dada normativa, de tal sorte que a res justa não é uma derivação exclusiva das normas.

Quando, opostamente, Jerónimo González publicou, nas páginas da Revista Crítica de Derecho Inmobiliario, seus artigos sobre os princípios hipotecários — artigos esses depois reunidos num livro editado em homenagem a sua elevação ao cargo de Presidente da Sala Civil do Tribunal Supremo de Justiça da Espanha —, fez ele a observação de que esses princípios derivavam da transposição de normas submetidas a interpretações. Em outras palavras, os princípios hipotecários procederiam de uma indução com caráter generalizante, ao modo como alguns atuais juspositivistas compreendem a idéia de princípios jurídicos. Estamos aí, em rigor, muito próximos da negativa, simpliciter, da existência de verdadeiros princípios jurídicos, — e, pois, nesse quadro, talvez se possa compreender a objeção de Giovanni Tarello, para quem a tarefa de induzir princípios a partir de enunciados do Direito positivo ou constitui simples analogia legis ou é mera extensão de conteúdos postos na lei, de modo que o recurso argumentativo a princípios jurídicos gerais seria um schema vuoto, a servir, de quando em quando, para encobrir “operações disparatadas”, na linha do que, entre nós, Humberto Ávila, designou como um caprichoso decisionismo. É que a adoção desse gênero de “princípios” — ou seja, de proposições mais gerais inferidas do ordenamento jurídico posto, e, quando muito, de regras hermenêuticas adicionais — consistiria apenas, de fato, em traduzir verbalmente a expressão e o significado da lei, e sua pouca ou nenhuma utilidade mal ocultaria o recurso à difusa etiqueta “princípios” para, no âmbito de argumentos performativos, “justificar o injustificável”, inibindo-se a aferição racional das argumentações (p.ex., e isso extraio de episódios de minha experiência judicial, a invocação de tópicos, à conta de “princípios”: desde singelas referências ao “respeito aos valores democráticos” e à “salvaguarda dos direitos humanos”, até chegar a alusões específicas aos princípios da ampla defesa, do devido processo legal, da contradição etc.; tudo sem indicação singular e analítica do ponto de confronto do caso ou da norma com símiles princípios; em acréscimo, como argumento standard da eqüidade sobressai a freqüente referência à “peculiaridade do caso”, sem demonstração de que o caso, justificadamente, excepcione a norma; está-se aí no plexo do irracionalismo jurídico).

Sed contra, é sentença de Arthur Kaufmann a de que “leis infames não são (mais) simples exemplos de cátedra, senão que se converteram em realidade”, o que acarreta a conclusão de que falhou o mero conceito formal de lei. Novamente põe-se o tema da existência de um critério de justiça para a direção das ações humanas na Sociedade política. E de uma justiça que, além de não se definir plenariamente como o resultado de uma lei, não seja, de uma parte, um positivismo judiciário ou, na já referida expressão de Humberto Ávila, um “caprichoso decisionismo”, nem, de outra parte, uma singela verificação factual de efetividade da ordem (: funcionalismo, positivismo sociológico, econômico etc.).

As teorias fortes da Principiologia jurídica admitem, ao lado de normas e de conclusões abstraídas do ordenamento posto (: leis e costumes), princípios stricto sensu, cuja observância — a nota é de Ronald Dworkin — se impõe como exigência, não de uma utilidade casuística, mas “da justiça, da eqüidade ou de outra dimensão da Moral”. Esses princípios stricto sensu, portanto, guardam correspondência com o que se tem designado, entre os autores de língua inglesa, por moral rights, distinguindo-se dos legal rights, o que muito se acerca da concepção jusnaturalista tradicional, a diferenciar, de uma parte, as 1/ conclusões, próximas ou remotas, dos primeiros princípios do Direito natural (com que se familiariza o conceito de moral rights), e, de outra parte, as normas, os costumes e as decisões humanas determinativas (todos acercados da idéia de legal rights).

Para os adeptos das teorias principiológicas fortes, apontar a caracterização substancial dos princípios stricto sensu equivale a afirmar a juridicidade de sua própria essência, tal que, em palavras de Rodolfo Vigo, “la validez de los principios (stricto sensu) es consecuencia necesaria de su contenido”. De que segue, por evidente, não só a desnecessidade de uma legiferação desses princípios (stricto sensu), senão que também a invalidade jurídica das normas que atentem contra eles. Esses princípios, pois, apresentam caráter supranormativo, ainda que, algumas vezes, se insiram nas leis — com que se fazem transnormativos, sem, com isso, por certo, se converterem em meros princípios endonormativos, i.e., instituídos por lei positiva e sempre a depender delas, inclusivamente quanto a sua própria existência.

4. É compreensível que, para uma teoria débil dos princípios jurídicos — quer derive de sua eleição advertida, quer de sua assunção implícita —, não se possa cogitar de princípios supranormativos, o que explica, talvez, no caso do Registro de Imóveis, a pouca referência de nossos doutrinadores, enquanto cifrados a uma Principiologia dogmática, ao tema da segurança jurídica, tomada esta última como diretriz superior de todos os possíveis princípios hipotecários. Pouco relevo se entreveria, de fato, em cogitar do princípio da “segurança jurídica”, enquanto valor endonormativo, se se julga esse princípio superável mais ou menos facilmente conforme a hierarquia constitucional ou infraconstitucional da norma que o preveja.

Em contrapartida, uma teoria forte dos princípios pode invocar a supranormatividade, e, em nosso caso, a da segurança jurídica nos Registros Públicos. Se isso aparenta configurar uma vantagem, é preciso observar, contudo, que as teorias fortes têm o ônus de exprimir a compreensão dos princípios stricto sensu, porque, diversamente do que se passa com as normas, esses princípios não se podem autorizar, humanamente, por meio de uma legitimidade originária, como se estivessem aprovados, em palavras de Dworkin, num teste de pedigree — teste esse próprio, sim, para as leis. Além disso, sem a expressão do objeto de conceito dos princípios stricto sensu, como já ficou dito, seu uso renderia ensejo ao exercício de um decisionismo sem possível aferição racional.

A compreensão do objeto jurídico dos princípios stricto sensu, é certo, até determinado ponto, está muito facilitada aos doutrinadores das teorias fortes porque esse objeto se apreende, em parte, pela intuição do que, mediante o hábito intelectual da sindérese, o entendimento possível de todos os homens —tão logo eles adquiram o uso da inteligência — está na posse dos primeiros princípios da razão prática (: resumível nesta sentença: fazer o bem, evitar o mal). Tal como se passa com o hábito do intellectus, que está na posse dos primeiros princípios da razão especulativa. Além disso, as conclusões mais próximas dos primeiros princípios sinderéticos, destes inferíveis sem maior dificuldade, têm a apoiá-las certas reiterações uníssonas do consenso jurídico universal acerca de “direitos justos” por si próprios, direitos esses só abdicados apenas excepcionalmente na história da Sociedade humana, presentes em (quase) todo o tempo e em (quase) toda parte da vida dos homens. É isso o que, propriamente, designa-se como “direito das gentes” (: jus gentium), direitos derivados do Direito natural, per modum conclusionis, de sorte que, em palavras de Santiago Ramírez, “tem algo de natural e algo de positivo”, por ser essencialmente intermediário entre o Direito simpliciter natural e o Direito meramente positivo.

Remanesce, entretanto, a infranqueável exigência de, em cada caso — rectius: em cada ação —, descobrir, assim a refere Dworkin, a resposta certa, que também passa, em linguagem de Castán Tobeñas, pela diagnose do fato. Essa solução única — the one answer right — que aponta para a res justa, põe à mostra, no campo das teorias principiológicas fortes, a potencialidade dos princípios stricto sensu e a insuficiência de premissas genéricas (incluídas as normas) para decidir sobre os irrepetíveis casos singulares, casos esses que sempre estão a demandar um discurso prudencial que aprecie pontualmente o objeto, o fim e, quando exigível, a intenção das várias ações. Daí que, ao afirmar a busca da segurança jurídica ou res certa no Direito registral, como princípio supranormativo, não se possa abdicar da consideração do fim humano, individual e social.

Desse modo, as teorias principiológicas fortes são, pois, essencialmente, teorias finalísticas. Por isso, as indagações que, acerca do fim registral, se propõem às correntes fortes podem ser, de maneira fundamental, reduzidas a saber que é a segurança jurídica, enquanto fim de uma instituição jurídico-formal, e como esse fim se harmoniza com a justiça e se relaciona com o Bem comum.

A resposta a essas questões não é evidente. Longe disso. Ela supõe a consideração anterior dos fins da Sociedade política, o que se concerta com o tema dos fins da própria natureza humana ou, para aqui acompanhar lições de John Finnis, com as exigências básicas da razão prática (: basics requirements of practical reasonableness). Entre elas, desde logo, impõe-se, segundo John Finnis, 1/ um plano de vida coerente (ou, na expressão mais apropriada de John Rawls, um plano de vida racional — rational plan of life), em cuja execução 2/ não haja preferência arbitrária seja entre valores, seja entre pessoas (: nenhum plano de vida, com efeito, será razoável se ele implicar desvalorização de qualquer forma básica dos bens humanos, ou se esses bens não puderem ser buscados por qualquer dos homens), e em 3/ que se exijam comportamentos eficazes, dentro do razoável, em ordem ao fim proposto, guardada 4/, em todos os atos, a consideração plausível de respeito pelos valores básicos, 5/ favorecendo-se e promovendo-se o Bem comum da Sociedade política, e, com ele, o bem dos corpos intermediários entre o indivíduo e o Estado, e os bens individuais.

Esses propósitos — que compendiam uma reta existência moral — reclamam, para as instituições formais, de que é exemplo fulgurante o Registro de Imóveis, a instrumentação primária da segurança jurídica por meio de uma ocupação legística, entregue, pois, à prudência do legislador. Cabe, com efeito, à atividade legislativa encontrar uma espécie de “res justa estatística”, à luz não só das exigências fundamentais da razão prática mas também, na expressão de Oliveira Vianna, da realidade histórica e circundante de cada Sociedade, de sorte que se constitua a res certa legal como res justa ut in pluribus porque não é possível segurança jurídica à margem da lei, como não é plausível a res justa sem segurança do Direito, res justa e res certa irmanadas no conceito de Bem comum.

É de todo manifesto que, uma vez afirmada a existência de um princípio cujo objeto é o próprio fim do Registro Público — i.e., a segurança jurídica —, seja esse princípio o que detenha a superioridade hierárquica sobre os demais princípios registrários, quer (outros) supranormativos, quer endonormativos, ordenados ad operatum, equivale a dizer: à consecução do fim último do Registro. É que, ausente a moção do fim, não se movimentariam os possíveis meios ordenadamente, de modo que, sem determinar-se pelo fim, esses meios, apartados da chamada de uma direção ex intentione, poderiam naufragar em qualquer termo.

5. Em resumo e para rematar estas nótulas, da Principiologia registral-imobiliária no Brasil, forte na análise dogmática, está a reclamar-se uma transposição para o plano científico. A tanto, nossos doutrinadores terão de, primeiramente, escolher entre uma teoria débil e uma teoria forte dos princípios jurídicos. O que aí se trata de eleger é entre a primazia da vida humana sobre a lei ou, diversamente, o primado da lei sobre o homem e sua vida. Só depois dessa escolha é que se poderão recrutar, plausivelmente, os objetos de conceito de cada princípio, cogitando-se de sua articulação no Bem comum e de sua hierarquia relacional.

Como quer que venha a ser essa eleição — se ao modo juspositivista, ou se à maneira do jusnaturalismo tradicional (ou de outra das teorias fortes) —, o fato é que, assim o disse Rodolfo Vigo, “o conhecimento dos princípios nos proporciona a compreensão explicativa e justificadora mais radical e última do Direito”. E isso, a meu juízo, já seria motivo bastante para estudá-los, embora guarde eu, a propósito, a esperança adicional de ver um dia os Estados de Direito ser não apenas Estados que observam as leis enquanto as queiram respeitar, mas, sim, Estados de Justiça — com leis e princípios fortes a que as leis devam moralíssima observância, e os Estados, um justíssimo submetimento.


Bibliografia básica

Alexy, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução castelhana de Ernesto Garzón Valdés. Ed. Centro de Estudios Constitucionales. Madrid. 1993.
Ávila, Humberto. Teoria dos Princípios. Ed. Malheiros. São Paulo. 2004.
Aristóteles. Metafísica. Ed. Gredos. Madrid. 1998.
Dworkin, Ronald. Los derechos en serio. Tradução castelhana de Marta Guastavino. Ed. Ariel. Barcelona. 1997.
Finnis, John. Natural Law and Natural Rights. Ed. Clarendon. Oxford, 1980.
González, Jerónimo. Principios hipotecarios. Ed. Associación de Registradores de la Propiedad. Madrid. 1931.
Kaufmann, Arthur. Filosofía del Derecho. Tradução ao castelhano por Luis Villar Borda e Ana María Montoya. Ed. Universidad Externado de Colombia. Bogotá. 1999.
Lamas, Félix. Los principios internacionales – Desde la perspectiva de lo justo concreto. Ed. Instituto de Estudios Filosóficos Santo Tomás de Aquino. Buenos Aires. 1989.
Tarello, Giovanni. L’Interpretazione della Legge. Ed. Dott. Giuffrè. Milão. 1980.
Vigo, Rodolfo (e Delgado Barrio, Javier). Sobre los principios jurídicos. Ed. Abeledo-Perrot. Buenos Aires. 1998.

*Ricardo Dip é juiz do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, Brasil; professor de Filosofia do Direito e de Direito Penal na Faculdade de Direito da Universidade Paulista, em Alphaville, e professor convidado da pós-graduação da Faculdade de Direito da Universidade Católica Argentina de Buenos Aires; membro da Real Academia de Jurisprudência e Legislação de Madrid, Espanha; do Instituto Jurídico Interdisciplinar da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Portugal; da Academia Paulista de Direito; do Centro de Estudos de Direito Natural José Pedro Galvão de Sousa; do conselho editorial de Maritornes – Cuadernos de la Hispanidad, Buenos Aires, Argentina.
Luiz Egon Richter[1]

Ao longo de sua trajetória, especialmente a partir da era Neolítica, também chamada Idade da Pedra, o homem começa a se preocupar e, por conseqüência, desenvolver mecanismos de segurança de sorte a garantir o excedente produzido, por mínimo que fosse, o que realça o entendimento de que a segurança não é um fator contemporâneo.

Em face deste mote far-se-ão considerações acerca do histórico do Registro de Imóveis, noção conceitual, principiológica e finalística, para que o leitor tenha uma noção básica do registro de imóveis no Brasil e sua importância jurídica, que tem como idéia nuclear a segurança jurídica, assim como sua importância econômica e social.

A preocupação com a publicidade imobiliária parece estar presente desde a transição da civilização pré-histórica.[2] Na Mesopotâmia há indícios de procedimentos voltados à publicidade registral bem antes do Código de Hamurábi (c. 1700 a.C.). O Código de Hamurabi, embora não houvesse conceituado o direito de propriedade, continha dispositivos de proteção da propriedade, tais como o direito de reivindicá-la[3], pagamento por perdas e danos[4], entre outros.

Uma forma bem sofisticada de publicidade registral existiu no antigo Egito. Os registros denominados katagrafe foram organizados na época ptolomaica, por volta do século III AC, que tinham à frente funcionários encarregados do registro de contratos e da cobrança dos impostos. Já nesta época, os notários (que redigiam os contratos) eram obrigados a exigir certidões dos teminai (responsáveis pelos registros) para que se pudesse dispor de imóveis.[5]

Na ilha de Rodes, definitivamente grega desde a criação da Grécia moderna em 1948, nenhuma transmissão imobiliária era válida sem antes estar inscrita nos registros da cidade. Alguns autores chegam a identificar nos funcionários responsáveis pelos registros gregos a função qualificadora. Ou seja, fazia-se exame prévio no contrato, antes de admiti-lo para registro, rejeitando-o em caso de inconformidade.

Na Alemanha, no século VII, já se tem notícia de mosteiros e igrejas que mantinham livros de registros de propriedades imobiliárias – os ascendentes de nossos registros paroquiais. Contudo, deve ser esclarecido que o registro do vigário no Brasil não é o antecedente jurídico do Registro de Imóveis. O registro do vigário tinha por finalidade anotar a posse sobre o imóvel, não atribuindo ao posseiro o "ius in re"

O registro de imóveis moderno, como instituição jurídico-protetiva da propriedade imobiliária, data de meados do século XIX, quando alguns foram instituídos outros revigorados ou modernizados em diversos países, inclusive o Brasil, Espanha e Portugal. Por outro lado, em alguns países, como a Rússia, somente no final do século XX veio o aperfeiçoamento de seu sistema registral, adotando como modelo, o sistema brasileiro.

No Brasil vigorou até a independência, em 1822, o regime das sesmarias. Desta data até 1850, quando passou a vigorar a Lei n.º 601 – Lei de Terras – e seu Regulamento n.º 1318, de 1854, não havia nenhum regramento acerca da propriedade imobiliária no Brasil. De acordo com o artigo 4.º seriam revalidadas as sesmarias e outras concessões e de acordo com o artigo 5.º seriam legitimadas as posses mansas e pacíficas, adquiridas por ocupação primária ou havidas do primeiro ocupante e que se achavam cultivadas ou com princípio de cultura.[6] A Lei de Terras discriminou os bens do domínio público do particular, impondo a legitimação da posse particular por meio do Registro do Vigário.

Em 1843, por força da Lei Orçamentária de n.º 317, impôs-se a publicização registral das hipotecas, com a finalidade de dar-lhes publicidade, afastando-as da clandestinidade. Pode parecer estranho a existência de um registro hipotecário sem a existência de um registro da propriedade imobiliária que garantisse o direito de propriedade imobiliária privada. Isto se justificava pelo fato de que a propriedade se adquiria pelo título e não pelo registro, como passou a acontecer a partir do Código Civil de 1916 que instaurou o sistema registral imobiliário constitutivo.

Antes, porém do Código Civil de 1916, foi criado o Registro Geral, por força da Lei nº 1.237 de 24 de setembro de 1864, quando passou a ser admitido o registro facultativo da transcrição dos títulos de transmissão dos títulos aquisitivos de propriedade imobiliária, assim como o registro de outros ônus reais que pudessem recair sobre o direito de propriedade. Ressalta-se, contudo, esse registro não fazia prova de propriedade, nem mesmo como presunção relativa, o que impunha ao autor prová-la por outras vias, como a reivindicatória.

A Lei 1237 foi substituída pelo Decreto 169-A e seu regulamento, Decreto n.º 370, sem alterar substancialmente o sistema registral. Alteração substancial ocorreu com o advento do Código Civil de 1916, que substituiu o Registro Geral, de natureza declarativa, por uma eficácia registral constitutiva juris tantum, de acordo com os artigos 856 e seguintes.

Por força da eficácia constitutiva do Código Civil, impôs-se a criação de um novo sistema de Registro de Imóveis, o que acabou ocorrendo com o Regulamento do Decreto Legislativo de nº 4.827, de 1924, consubstanciado no Decreto de n.º 18.542 de 24 de dezembro de 1928 que introduziu o princípio da continuidade, com a exigência da publicidade registral do título anterior, ou seja, para que um título pudesse se registrado, exigia-se a publicidade registral do anterior, salvo nos títulos em que a aquisição era originária.

Em 1939 o Decreto 4.857 derrogou o Decreto Legislativo 4827 e dispôs sobre a execução dos serviços, concernentes aos registros públicos estabelecidos pelo Código Civil, corrigindo a terminologia do ordenamento anterior e separando os atos sujeitos à transcrição (títulos aquisitivos) dos atos sujeitos à inscrição (direitos reais de garantia, fruição, etc...)

Quase quarenta anos após entra em vigor, no dia 1.º de janeiro de 1976, a Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973, introduzindo uma nova principiologia e sistemática do Registro de Imóveis, substituindo o fólio pessoal pelo fólio real. A partir deste momento cada imóvel objeto de matrícula passou a ter uma individualização e especialização geográfica, de sorte a tornar os imóveis inequívocos.

A sistemática introduzida pela Lei 6.015/73, em linhas gerais, permanece em vigor. O Código Civil de 2002 não trouxe alterações de fundo e ratificou a eficácia constitutiva juris tantum do Código Civil anterior, ao dispor no artigo 1227 que os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos.

Feitas as considerações acerca do histórico do Registro de Imóveis, parte-se agora para a análise do conceito e para tanto utilizar-se a seguinte noção: “A instituição jurídica[7], a cargo de um Oficial Público por força de delegação, que tem por atribuição legal a capacidade para publicizar fatos jurídicos que dizem respeito a bens imóveis, com efeitos constitutivos ou declaratórios do direito real de propriedade, ou direitos reais que recaem sobre o direito real de propriedade imobiliária e, ainda, direitos de natureza obrigacional, bem como atos ou fatos que dizem respeito aos sujeitos que figuram nos registros, sempre que a lei assim impuser ou autorizar, com a finalidade de dar autenticidade, segurança e eficácia jurídica.”[8]

O registro de Imóveis no Brasil é uma instituição jurídica, algo que foi instituído por força de lei, na qual se executam atividades jurídicas – atos registrais – que têm por finalidade dar segurança jurídica aos atos constituídos e atos e fatos declarados.[9] Trata-se do exercício de uma função pública[10] lato senso, por força da qual são executados atos administrativos strito sensu – atos de registro e de averbação, assim como atividades meio – visando a dar segurança jurídica aos titulares dos direitos inscritos e contribuindo com a paz social.

Os atos fins que, são os de registro e de averbação, são de natureza administrativa, embora não sejam de Administração Pública. Os atos administrativos praticados pela Administração Pública são em linhas gerais vinculados ou discricionários. Os atos registrais, de forma geral, passam a largo da atividade discricionária, ou seja, o Oficial, a rigor, não pratica atos registrais levando em consideração critérios de conveniência e oportunidade. Por outro lado, também não pratica somente atos vinculados.

Por ser um profissional do Direito[11], cabe ao registrador construir respostas, com base no Direito, às demandas que se apresentam quando a lei não prever de forma expressa o enquadramento. De há muito o registrador público de imóveis deixou de ser um mero executor de leis, para atuar como um profissional do Direito, a satisfazer juridicamente às demandas sob sua responsabilidade. Os atos praticados pelo registrador gozam de presunção de legalidade, legitimidade e veracidade, razão pela qual estão sujeitos ao controle de legalidade e legitimidade pelo Poder Judiciário.

Não se trata de uma repartição pública ou órgão público em sentido estrito, mas de uma função pública sob a responsabilidade de um particular por força de delegação do Poder Público, nos termos do artigo 236 da Constituição Federal e da Lei Federal n.º 8935/94. Embora o Oficial do Registro não seja um servidor público, porque não titulariza cargo, nem ocupa emprego público, é inegavelmente um agente público por força de investidura que recebe com a delegação, que lhe confere deveres e também direitos e prerrogativas necessárias e suficientes para o exercício eficaz e eficiente da função.

Os direitos e prerrogativas são necessários para que o Oficial possa publicizar com eficácia e eficiência os atos e fatos jurídicos de competência do Registro de Imóveis no âmbito de sua jurisdição. A jurisdição do registrador é a circunscrição imobiliária, ou seja, o espaço terrestre, estabelecido por força de lei estadual, no âmbito do qual o registrador pode exercer legitimamente a sua jurisdição imobiliária. É a circunscrição que define, em última análise, a competência territorial do registrador de imóveis para a prática dos atos registrais, com exceção dos atos de averbação na hipótese em que foi criado e instalado um novo Registro de Imóveis e o imóvel ainda não tiver sido transferido ou, ainda, quando se tratar de imóvel situado em circunscrições limítrofes, quando o registro deverá ser feito em todas elas.[12]

Os atos e fatos jurídicos sujeitos à publicização no Registro de Imóveis compreendem em linhas gerais, os relativos a bens imóveis e aos sujeitos que figuram nos atos registrais, direitos reais que recaem sobre o direito de propriedade ou, ainda, direitos obrigacionais. Antes de tudo impõe-se esclarecer que o registro imobiliário brasileiro é constitutivo/desconstitutivo/declarativo de direito e descritivo de fatos.

É constitutivo/desconstitutivo/declarativo de direitos porque a publicidade registral de boa parte dos títulos apresentados resulta na constituição e ao mesmo tempo de desconstituição de direitos[13] ou na declaração de direitos cuja existência precede ao registro. Exemplos típicos desta afirmação são: a) – o registro de escritura pública de compra e venda, por força do qual, ocorre a constituição do direito real de propriedade em favor do adquirente[14] e a desconstituição do direito em desfavor do transmitente; b) – o registro de título que contempla partilha de bens por falecimento do proprietário, por força do qual ocorre apenas a declaração do direito de propriedade que se consolidou em favor dos herdeiros com o fato morte do proprietário dos bens inventariados[15].

Os direitos constituídos ou declarados gozam de presunção júris tantum, ou seja, enquanto não se provar o contrário e ocorrer a desconstituição do ato registral, por meio de decisão judicial ou administrativa, o registro continuará produzindo efeitos como se válido fosse. A presunção de legalidade, veracidade e legitimidade é típica dos atos administrativos e os atos registrais são espécies de atos administrativos.

Por outro lado, os fatos constantes nas matrículas são meramente descritivos, portanto, não produzem efeitos jurídicos como ocorre com os atos registrais. Os fatos dizem respeito à localização geográfica e à qualidade geodésica do imóvel[16], assim como a existência ou não de edificações e os elementos de qualificação dos sujeitos. A descrição fática do imóvel na matrícula não opera presunção, é apenas a referência ao fato em si, que se não estiver de acordo com a realidade fática, pode ser retificado de ofício ou a pedido do interessado, por meio de procedimento administrativo.[17]

A especialização do imóvel por meio da descrição dos seus limites e configuração geodésica contribui para aumentar a segurança jurídica, mas não afeta o direito real inscrito. A inscrição de um registro constitutivo ou declaratório de direito em matrícula com descrição precária ou deficiente não afeta a validade do registro, salvo se a matrícula do imóvel foi aberta ilegalmente. É verdade que com a instauração do fólio real – matrícula – a descrição precisa do imóvel passou a ser um requisito para abertura de matrícula, como já foi visto. Contudo, este requisito tem como finalidade precípua dar maior segurança, na medida em que, entre a constituição de um direito sobre um bem especializado e inequívoco e a constituição de um direito sobre um bem desconhecido, vai uma boa distância em termos de segurança.

Ou seja, para segurança jurídica finalística, atribuição do Registro de Imóveis, não basta a constituição do direito de propriedade ou qualquer outro direito sobre bem imóvel: é necessário que este bem imóvel seja conhecido, individuado, que a inscrição recaia sobre um objeto precisamente individuado.[18] Por esta razão cabe ao registrado exigir a perfeita especialização do imóvel para efeitos de matriculação antes de praticar o ato registral, salvo se a matrícula já estiver aberta e apresentar apenas deficiências que não afetam a sua validade. Neste caso, o ato registral deve ser praticado para constituir o direito, com pedido endereçado ao titular do direito ou interessado legítimo para providenciar no saneamento das deficiências, por meio de processo próprio, previsto no artigo 213 da Lei dos Registros Públicos.

O princípio do fólio real preconiza: a cada imóvel uma matrícula e a cada matrícula somente um imóvel[19]. Imóvel, para efeitos de matriculação, é um corpo terrestre contínuo, ou seja, uma gleba de terra ou um terreno urbano contínuo, sem solução de continuidade, salvo quando se tratar de condomínio edilício, quando então a matrícula contemplará quota-parte ideal do terreno e da edificação. A matrícula é a base de sustentação física e jurídica do lançamento dos atos registrais.

Os atos registrais são de duas espécies: registro e averbação. O primeiro é considerado o ato principal, porque goza de autonomia, ou seja, a rigor, não é dependente de ato anterior, enquanto que a averbação é ato acessório, porque tem por finalidade agregar algo a ato já existente. Os atos de registro ordinariamente são utilizados para a escrituração que produzirá efeitos constitutivos ou declaratórios, enquanto que os atos de averbação são utilizados para noticiar fatos ou atos jurídicos relacionados ao imóvel, direitos ou sujeitos e a desconstituição de direitos reais ou obrigacionais.

A Lei dos Registros Públicos apresenta em seu artigo 167, inciso I um rol de atos de registro e no inciso II outro rol de atos de averbação. Para alguns, o rol dos atos de registro é taxativo, ou seja, somente a lei em sentido formal pode alterar as hipóteses; enquanto que para outros, o rol é meramente exemplificativo. O Registro de Imóveis precisa ter mecanismos de filtragem de sorte a não dar publicidade a atos e fatos irrelevantes para efeitos de segurança jurídica social. Por outro lado, a dinâmica social exige um Registro de Imóveis voltado às demandas que exigem publicidade para efeitos de segurança jurídica, ainda que a lei não preveja expressamente tal hipótese.

No pós-positivismo o Direito vai muito além da lei, o que exige uma releitura do megaprincípio da legalidade. O princípio da legalidade preconiza hoje a substituição da lei pelo Direito, ou seja, onde se lê na Constituição Federal que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, deve ser entendido que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude do Direito.

A legitimidade do ato registral está estreitamente vinculada ao Direito e à segurança jurídica, esta, por sua vez, é efeito de uma das vocações do Direito, considerando que a outra é a de fazer imperar a justiça.[20] No Estado Democrático de Direito, o homem é o protagonista político e jurídico e cabe ao Direito promover sua segurança jurídica e, por consequência, ao registrador público de imóveis, como profissional do Direito, executá-la de tal sorte que alcance sua finalidade teleológica no âmbito de sua jurisdição. Ademais, não se pode esquecer que o Registro de Imóveis, assim como as atividades notariais são instituições que atuam na prevenção de conflitos.

Ainda que determinada publicização não esteja prevista em lei, mas se encontra amparo no Direito e tem relevância para efeitos de concretização da segurança jurídica, o ato registral é perfeitamente válido e legítimo. Desta forma o registrador de imóveis estará contribuindo para que a segurança jurídica se efetive e o Direito Registral Imobiliário alcance sua finalidade teleológica, que é, em última análise, a segurança jurídica imediata do titular do direito inscrito e a segurança jurídica mediata da sociedade.

Ademais, o registrador de imóveis é profissional do Direito, dotado de fé pública, ou seja, cabe a ele dizer o direito registral imobiliário nos limites de sua jurisdição. Os atos praticados pelo registrador são atos jurídicos de natureza administrativa, espécies de ato administrativo, que gozam de presunção de validade, ou seja, enquanto não decretada a nulidade do ato, produzirá efeitos como se válido fosse.

Os atos registrais podem ter por objeto direito de propriedade imobiliária, direitos reais sobre coisas alheias, direito imobiliário fiduciário, direitos obrigacionais, fatos relacionados à configuração do imóvel e atos e fatos relacionados aos sujeitos que figuram nas transcrições e matrículas. Portanto, o Registro de Imóveis, no Brasil, não é um registro público voltado somente aos direitos relacionados aos bens imóveis, a despeito de sua designação.

A função registral desenvolvida pelo registrador e seus prepostos, para a prática dos atos registrais, é orientada pelo ordenamento jurídico positivo e, também, por um conjunto de princípios, também de caráter normativo, que informam e conformam a atividade registral imobiliária, que dão “o formato e as condições de operacionalização de todo o sistema, através de exigências e de restrições, para que o direito de propriedade seja garantido em sua melhor expressão e preservado quando ameaçado”[21]. Destacam-se os princípios da legalidade, da fé-pública, da legitimidade registral, da publicidade, da territorialidade, da prioridade, da disponibilidade, da especialidade e da continuidade, entre outros.

"O princípio possui uma função especificadora dentro do ordenamento jurídico: ele é de grande valia para a exegese e perfeita aplicação, assim dos simples atos normativos que dos próprios mandamentos constitucionais. O menoscabo por um princípio importa na quebra de todo o sistema jurídico. É que o direito forma um sistema, é um axioma que nem sequer precisa ser demonstrado, já porque axioma (de universal acatamento, diga – se de passagem), já pela proibição lógica do regressum ad infinitum (da infinita reciclagem das premissas eleitas)."[22]

Do princípio da legalidade – como já foi visto, a atividade registral imobiliária é atividade jurídica que tem por finalidade a autenticidade, segurança e eficácia de atos e fatos jurídicos [23], portanto, sujeita ao Direito. Ou seja, por um lado deve ser observada a legalidade da instituição e do registrador e, de outro, a legalidade dos atos jurídicos, negócios jurídicos e seus respectivos títulos, para efeitos de validade dos atos registrais. A legalidade é condição de validade dos atos praticados no âmbito do Registro de Imóveis.

No plano institucional e funcional, o Registro de Imóveis deve ter sido legalmente criado por lei e devidamente instalado, com circunscrição imobiliária definida, também, por lei. O registrador deve estar devidamente investido na delegação e em pleno exercício. Na hipótese de estar com o exercício da função suspenso – férias, tratamento de saúde, suspensão, etc... –, não deverá praticar atos, porque inválidos.

No plano formal/documental, os títulos devem estar amparados no Direito, assim como o ato registral também deve ser produzido em consonância com as determinações legais e o Direito. O Oficial, no exercício de sua função, tem o dever/poder de qualificar o título para efeitos de publicização, ou seja, cabe a ele verificar se o título possui qualidade jurídica suficiente para ingressar no registro de imóveis e merecer a publicização.[24] Para tanto, o Oficial verifica se o título, assim como o negócio jurídico, quando for o caso, possui existência, validade e eficácia jurídicas.

Títulos nulos de pleno Direito, não podem ser recepcionados pelo Oficial do Registro, porque deles não se originam direitos. Por outro lado, os títulos que apresentam meras anulabilidades, podem ser recepcionados e publicizados, porque deles se originam direitos, ainda que possam ser questionados e desconstituídos em Juízo. Em última análise, a validade do registro depende da validade do negócio jurídico e do respectivo título causal.

“O exame de legalidade do título recai, portanto, sobre o aspecto da sua aptidão para mudar o direito real, inclusive o seu relacionamento com o registro, quer sobre o aspecto da idoneidade da sua forma extrínseca. Como a legalidade é aferida em vista tão-somente do que o título mostra em sua face, a passagem pelo exame não impede que às vezes ele se revele mais tarde um sepulcro caiado devido à presença de vícios internos, invisíveis ou imperceptíveis à simples inspeção ou leitura do documento.”[25]

Do princípio da fé pública – a rigor o sistema registral imobiliário brasileiro, no que se refere aos direitos inscritos, não adotou o princípio da fé-pública em sentido estrito, aquele por meio do qual o ato registral opera o saneamento de eventuais vícios contidos no negócio jurídico. O princípio da fé-pública opera a presunção jure et jure, ou seja, presunção absoluta que não admite prova em contrário. No Brasil, a presunção que o ato registral opera é a juris tantum, ou seja, até prova em contrário e enquanto não cancelado o ato registral, será considerado válido.

O registrador certifica e dá fé-pública[26] que praticou determinado ato com base no título que lhe serviu de causa, mas não tem condições de reconhecer fé-pública ao conteúdo do negócio jurídico causal. Da mesma forma o registrador certifica e dá fé de que o conteúdo de determinada certidão é o mesmo que consta no livro, mas não tem condições de atribuir fé-pública ao conteúdo do registro no livro. Portanto, a fé-pública que o registrado reconhece é apenas formal e não substancial, de sorte que provado o contrário no mundo dos fatos, o ato registral pode ser retificado, rerratificado ou mesmo cancelado.

Do princípio da legitimação registral – é o princípio adotado pelo sistema registral imobiliário brasileiro, que preconiza a legitimidade do direito inscrito até prova em contrário. Enquanto não se comprovar o contrário fática e/ou juridicamente e a respectiva desconstituição do ato registral por meio de averbação de cancelamento, o ato registral continuará sendo considerado legítimo.[27]

Do princípio da publicidade – por ser uma instituição pública, o registro de imóveis é um local onde o público tem acesso à publicização de atos e fatos jurídicos relativos à imóveis, direitos reais e obrigações e, também, local onde os interessados podem obter informações relacionadas aos direitos e fatos registrados e averbados nos livros competentes. Sob esta ótica, tem-se a publicidade institucional e funcional. De outro lado, tem-se a publicidade formal, que compreende a escrituração – registro e averbação - dos atos e fatos inscritíveis e a descrição dos fatos relacionados ao imóvel e aos sujeitos. A publicidade inscritiva de direitos, por meio do ato de registro, pode ser constitutiva, constitutiva/desconstitutiva, declaratória. E, por fim, a publicidade informacional que se dá por meio da certificação – expedição de certidões.

É por meio da publicidade registral que ficam asseguradas as seguranças jurídicas estática e dinâmica. A primeira diz respeito ao direito inscrito[28], constituído ou declarado e a segunda protege o terceiro de boa-fé, que pratica atos com base no direito inscrito, sempre que o Direito ampara. A proteção em face de terceiro de boa-fé não é absoluta, no sistema registral imobiliário brasileiro, porque depende das hipóteses previstas em lei.[29] O mercado imobiliário depende em boa parte da efetividade destas faces da segurança jurídica.

De acordo com Melo Filho[30], “o Direito Brasileiro, desde a Lei Imperial de 1864, outorga à publicidade registral, o duplo efeito de constituir o direito real e de anunciá-lo a terceiros. Antes da publicidade, o ato cria obrigações entre as partes, mas, uma vez efetuada, perfaz a mutação jurídico-real, investindo a propriedade ou o direito real na pessoa do adquirente e, ao mesmo tempo, tornando o direito oponível a terceiros.”

Do princípio da territorialidade – cada Registro de Imóveis tem uma circunscrição própria, que compreende determinado território especializado, coincidente ou não com a Comarca, determinante para o exercício da jurisdição do Oficial de Registro de Imóveis. A competência do registrador fica restrita à circunscrição sobre a qual possui jurisdição, salvo para os atos de averbação em face dos imóveis que ainda não foram transferidos para o serviço registral novo ou quando o imóvel está situado em duas ou mais circunscrições, quando os atos de registro e averbação devem ser feitos em todas as circunscrições.[31]



Do princípio de prioridade – “significa que, num concurso de direitos reais sobre um imóvel, estes não ocupam todos o mesmo posto, mas se graduam ou classificam por uma relação de precedência fundada na ordem cronológica do seu aparecimento: prior tempore potior jure. Conforme o tempo em que surgirem, os direitos tomam posição no registro, prevalecendo os anteriormente estabelecidos sobre os que vierem depois”.[32]

A prenotação, que é a inscrição do título no Livro n.º 1[33] – Protocolo, em obediência a sequência rigorosa de sua apresentação[34], determina a prioridade entre os títulos que concorrem em face de um mesmo imóvel[35], salvo se o título for apresentado tão somente para conferência e cálculo de emolumentos.[36] Se dois títulos têm direito real pré-constituído – acordo de constituição do direito no plano obrigacional – em face do mesmo imóvel, o que for prenotado primeiro alçará vantagem em face do segundo, salvo se o primeiro não obtiver êxito registral, quando então o segundo passará a ocupar o lugar do primeiro.[37]

Esclarece-se, contudo, que a ordem de precedência tem maior importância na publicização dos títulos que têm por objeto direitos contraditórios, sejam eles constituídos por força do registro ou apenas declarados. É nos direitos contraditórios que a prenotação do primeiro exclui os subsequentes e, em se tratando de ato registral constitutivo de direito, este se considera constituído na data da prenotação, ainda que a escrituração do ato tenha sido feita em data posterior a do protocolo. Em se tratando de publicidade meramente informacional, por meio de averbação, a prenotação apenas orienta a ordem interna do serviço registral, porque não excludências. Por outro lado, quando os direitos não são contraditórios entre si, a prenotação, ao invés de excluir, estabelece uma graduação entre eles.[38]

A despeito da regra geral que o princípio de prioridade impõe à sistemática do Registro de Imóveis, existem exceções previstas na Lei dos Registros Públicos[39] e no Código Civil
Luiz Egon Richter

Introdução. 1. Do conceito de matrícula; 2. Dos princípios informativos; 3. Da natureza jurídica da matrícula; 4.Dos requisitos da matrícula; 5. Do momento da abertura da matrícula; 6. Da fusão ou unificação da matrícula; 7.Do desdobramento da matrícula; 8. Do cancelamento da matrícula; Considerações finais. Referências bibliográficas.

Introdução

O estudo a respeito do direito registral, seja no plano positivo ou no doutrinário passa inexoravelmente pela investigação a respeito da base matricial que é a matrícula. A partir da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, com vigência a partir de 1º de janeiro de 1976, o sistema registral imobiliário brasileiro adotou o fólio real em substituição ao fólio pessoal.

A partir da instauração do novo sistema registral imobiliário, a cada imóvel deve corresponder uma matrícula, que em regra será aberta no momento da efetivação do primeiro registro na vigência da Lei acima mencionada. Ocorreu uma profunda mudança procedimental onde a folha pessoal que podia ter por objeto vários imóveis dá lugar a folha real, onde cada imóvel tem a sua de forma individualizada.

Esta mudança na sistemática registral imobiliária tem provocado ao longo do tempo muitas dúvidas, o que fez com que o estudo a respeito venha progredindo, procurando compreender e construir uma base doutrinária e jurisprudencial sólida, capaz de diminuir as dúvidas e contribuir para o aperfeiçoamento do sistema.

E é neste sentido que abordei alguns aspectos que denomino de fragmentos teóricos a respeito da base matricial do imóvel no Registro de Imóveis, com a finalidade de contribuir para a discussão e o aprofundamento do tema.

Procurei pautar a abordagem utilizando parte da doutrina que estava ao meu dispor, o que não representa o menosprezo a estudos não referenciados neste trabalho.

Neste contexto, considerando a importância da matrícula no sistema registral imobiliário e, ao mesmo tempo, na garantia da certeza jurídica quanto aos direitos reais e à própria configuração do bem em seu aspecto geodésico, e, ainda diante das dificuldades enfrentadas, o objetivo deste artigo é contribuir para uma doutrina sólida e crítica, capaz de dar guarida à complexa gama de relações jurídicas, interesses e direitos que têm o seu lugar no Registro de Imóveis.

Tentei estabelecer uma certa logicidade no trato do tema onde, num primeiro momento, trabalho com a conceitualização da matrícula, a partir do direito positivo e da doutrina e, em seguida, abordo alguns dos principais princípios que informam a matrícula no registro de Imóveis. Posteriormente procurei enfrentar os requisitos da matrícula, previstos no da própria Lei dos Registros Públicos, sintonizados com a noção de ato administrativo, especialmente, no que diz respeito aos pressupostos de existência e validade. Em seguida, o trabalho é relacionado com o momento da abertura da matrícula, sua fusão ou unificação. E, por fim cuidou-se do desdobramento e do cancelamento da matrícula.

Do conceito de matrícula

A matrícula no Registro de Imóveis serve de suporte físico e jurídico para todos os lançamentos registrais que devem ser feitos no Livro nº 2. É a base física porque confeccionada em ficha de papel, com os requisitos estabelecidos na Lei dos Registros Públicos (artigos 3º, § 1º e 2º) e a Consolidação Normativa Notarial e Registral da CGJ-RS (artigos 308, 311 a 314) e jurídica, pelo fato de que a matrícula tem como suporte o domínio, ou seja, o direito real de propriedade sobre bem imóvel conforme os artigos 176,§ 1º, I, 227 e 236 da LRP.

De acordo com Carvalho, o atributo dominial é inerente à transcrição e continua inerente à matrícula e conclui dizendo que,

Na verdade, se se negasse o caráter dominial e, portanto, jurídico da matrícula, daí se seguiria que o ato de inscrição subseqüente, impropriamente denominado “registro” pela lei, deixaria de ter objeto. O ato transmissivo ou onerativo subseqüente seria nulo por carência de objeto, já que a existência deste depende da conjunção físico-dominial de caracteres. Ora, para que a transmissão, ou a oneração, seja válida é preciso que nela se integrem os elementos de todo ato jurídico, a saber, agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não-defesa em lei (Cód. Civ., art.82)

Caso a matrícula não tivesse o seu suporte no domínio, todo e qualquer ato praticado ficaria suspenso. Neste sentido, é possível desenvolver o raciocínio no sentido de que o espaço terrestre é o suporte físico do domínio, enquanto que o domínio é o suporte jurídico da matrícula e esta, por sua vez, o suporte físico e jurídico dos atos a serem nela lançados.

Daí porque, quando a realidade jurídica estiver em desacordo com a realidade física, é necessária a retificação nos termos dos artigos 212 e 213, da Lei dos Registros Públicos.

O direito de propriedade recai sobre um determinado bem imóvel, que deve estar perfeita e inequivocamente identificado na matrícula. Portanto, deve haver uma perfeita sintonia entre a realidade física e jurídica, sob pena de irregularidade.

Daí a importância da individualização, unitarização e especialização de cada imóvel matriculado, com observância dos requisitos dispostos na Lei dos Registros Públicos (artigos 176, §1º,II nº 3, e 225) e na Consolidação Normativa Notarial e Registral da CGJ-RS (artigo 322, nº 3).

A atual Lei dos Registros Públicos alterou a lógica do sistema registral imobiliário ao adotar a matrícula, privilegiando o fólio real em detrimento do fólio pessoal (transcrição). Neste sentido a matrícula passou a ser o núcleo do Registro de Imóveis – sem afetar, entretanto, a essência do ato registral –, pois é a partir desta que agora ocorre a constituição, desconstituição e declaração dos direitos.

Ensina Carvalho que, na passagem de um sistema para o outro ocorreu apenas uma mudança exterior do ato, sem atingir o cerne, que é o domínio, dizendo que

Ali o ato se apresentava numa folha coletiva, destinada a uma pluralidade de imóveis, sendo os seus dados destacados em colunas, ao passo que aqui se exibe numa folha individual.

Para Jacomino, “...a matrícula, como sinônimo de fólio real, é um importante divisor sistemático, contrastando os modelos de organização da publicidade imobiliária pela ênfase que deposita no ordenamento real.”

O sistema fundado no fólio real, se por um lado prima pela individualização, com a devida especialização geodésica e unitarização do imóvel, por outro, não afirma que o sistema anterior, fundado no fólio pessoa, apresentava uma indeterminação objetiva a respeito dos requisitos identificadores do imóvel. Neste sentido Jacomino se manifesta dizendo que,

...não é a matrícula que daria origem à individualidade do imóvel – a sugerir que o antecedente da matriz seria o caos de indeterminação objetiva – mas enfatizando a organização do sistema nessas bases, define-se a relação que vai imperar na ordenação criadora dos assentos – um imóvel uma matrícula.

Toda mudança enseja dificuldades e desafios, Com a introdução da matrícula no registro de Imóveis não é diferente, razão pela qual foi motivo e continua a ensejar estudos, onde surgem variados entendimentos, de acordo com a visão de cada um que se propõe a pensar e enfrentar o tema.

Para Balbino Filho, a matrícula apresenta uma forte acepção cadastral, pois segundo ele, ...é a especialização, a individualização definitiva que se pretende assegurar ao imóvel. Isto teoricamente, porque se o imóvel for suscetível de desmembramento,a matrícula perderá o caráter de definitiva.

Também neste sentido Azevedo, leciona que a matrícula tem por objetivo cadastrar e individualizar o imóvel e não a pessoa interessada, embora da matrícula deva constar o nome desta, com os qualificativos acima indicados.

Ainda nesta linha Oliveira diz que: “A matrícula é um ato cadastral, é a forma pela qual se caracteriza e se individualiza um imóvel e se lhe confere um número de ordem pelo qual será prontamente identificado”.

Como se verifica pelos conceitos emitidos o elemento cadastral aparece de forma contundente, “provavelmente afetados pelas frustradas tentativas de aproximar o nosso sistema de direito registral ao alemão, acabou considerando o advento da Lei 6015/73, e especialmente da instituição da matrícula, como o marco legal da instituição entre nós de um verdadeiro cadastro”. Estudiosa do tema já de longa data, Gandolfo leciona que a matrícula “é um ato de registro, no sentido lato, que dá origem à individualidade do imóvel na sistemática registral brasileira, possuindo um atributo dominial derivado da transcrição da qual se originou.”

Para Silva, “A matrícula não é ato de registro, no sentido de que ela, pura e simplesmente, não cria, não modifica, não extingue direitos. Ela é ato de registro no sentido lato, porque só existe dentro do sistema registrário.”

No dizer de Jacomino, a matrícula no sentido lato de registro, é a primeira inscrição no fólio real, subentendendo-se:

(a) que se trata de um registro jurídico – para afastar a idéia de que a matrícula seria tão-só um ato cadastral; (b) que estamos diante de um ato jurídico cuja conseqüência imediata é fixar o atributo o atributo de dominialidade, enunciando a situação jurídica do imóvel e (c) que a matrícula, entendida como ato jurídico de inscrição, pode apresentar nítida distinção em relação ao fólio real, que é o suporte da inscrição.

Diante dos conceitos e análise apresentados, podemos trabalhar com a idéia de que a matrícula é um ato jurídico lato senso, que necessariamente não cria, modifica ou extingue direitos, mas, por outro lado, fixa o atributo de dominialidade, à medida que o domínio é o seu suporte e serve de base para o lançamentos de atos e fatos que dizem respeito, tanto ao bem imóvel, como aos direitos inscritos e os sujeitos titulares ou não de direitos que nela figuram, estabelecendo uma nítida distinção entre a inscrição e o fólio real que é o suporte da inscrição.

A matrícula apresenta uma complexidade de elementos extrínsecos ou formais e intrínsecos e substanciais. Os primeiros dizem respeito aos requisitos de formalização, enquanto que os últimos dizem respeito à substância da matrícula.

Nos requisitos substanciais aparece com destaque a especialização geodésica, que tem por fim individualizar e especializar o imóvel, tornando-o distinto dos demais. Se por um lado a lei exige dados identificadores e individualizadores do imóvel na matrícula, de outro, não transformou o sistema registral imobiliário num sistema cadastral, como adverte Dipp, ao dizer que,

Diz-se muita vez que a adoção do sistema de matrículas tende à formação do cadastro, o que deve entender-se com discrição. Não é possível esperar que, por meio de simples representações autônomas dos imóveis, venha a organizar-se o cadastro imobiliário, aglutinando-se os levantamentos individuais, até por isso que dessa justaposição derivarão hiatos e sobreposições geodésicas, alguns destes até mesmo propositadamente perseguidos (Afrânio de Carvalho, p. 446). Certamente, a instituição do fólio real, mediante a Lei 6.015/73, se inclina à futura organização do cadastro imobiliário, não, porém, no sentido de que, à míngua da elaboração cadastral esperada, exercite a matrícula função de cadastramento parcelar: a unitariedade - e ainda assim per accidens - é que terá alguma importância para o cadastro, e não a enunciação descritiva constante da matrícula que atualmente apenas visa a aumentar a desejada segurança jurídica e dinâmica, do registro

Elemento dominial, decorrente do direito de propriedade é que dá o devido suporte à própria matrícula e subseqüentemente, aos demais direitos reais que podem recair sobre o direito de propriedade, bem como de atos ou fatos que dizem respeito aos direitos inscritos, ao próprio imóvel e os sujeitos que figuram nos atos registrais.

Tanto o cadastro como o domínio, inobstante as funções distintas de cada um, na questão matricial dos imóveis no Registro de Imóveis, são imprescindíveis por estarem pari passu. Nalini ao enfrentar o tema, cita Jerônimo Gonzáles dizendo que o mesmo assinala:

O cadastro em sua essência – diz – deve ser unicamente a representação gráfica dos imóveis, e seu objeto único e básico, o individualizar e dar existência física aos mesmos. O Registro da Propriedade é a representação jurídica dos bens imóveis e direitos reais impostos sobre os mesmos, e tem por objeto o assento dos atos e contratos relativos ao domínio e demais direitos reais impostos sobre esses bens.

O aperfeiçoamento do sistema poderá nos levar a adoção do cadastro geral dos imóveis, nos moldes do Sistema Publicista Alemão, que por ora não temos. A representação gráfica dos imóveis de acordo com o sistema atual, fundada no princípio de especialidade positivado nos artigos 176, II, nº 3 combinado com o 225 é relativa, não afirma certeza, razão pela qual admite a retificação, conforme o artigo 213.

Ainda no rol dos requisitos substanciais, devemos ressaltar a importância da qualificação dos sujeitos, que figuram como titulares ou não de direitos inscritos ou declarados conforme os artigos 176, § 1º, II nº 4, letras “a” e “b”, III nº 2, letras “a” e “b” e artigo 220, todos da LRP.

Dos princípios informativos

Os princípios podem ser considerados do ponto de vista gnoseológico, “proposições abstratas de segundo grau, por serem abstrações inferidas das leis, que, por sua vez, são proposições abstratas de primeiro grau, porque se desumem diretamente, dos fatos para evidenciar alguma invariança que os caracterize.”

Esta dedução da própria lei, informa por um lado, os valores formais e, por outro, o conteúdo a ser atribuído a lei, no momento de sua aplicação diante do caso concreto, ou seja, diante da realidade é que o operador jurídico irá lançar mão dos princípios mais adequados, seja no plano formal, seja no substantivo, com a finalidade de atender os interesses protegidos pela ordem jurídica.

Esta ponderação pode ser apropriada ao registrador público de imóveis, na medida em que é considerado um operador jurídico pelo próprio estatuto do registrador. E neste sentido, forçosamente terá que hierarquizar os princípios, procurando atender a finalidade imposta pelo ordenamento jurídico, que é a segurança e eficácia dos atos jurídicos.

A matrícula é informada por vários princípios, onde podemos destacar o princípio da continuidade que é de natureza instrumental, na medida em que se destina a garantir o encadeamento dominial, por isso, considerado um dos suportes contributivos para a certeza e segurança, cuja idéia nuclear é a de que deve ser observado rigorosamente o encadeamento dominial, compreendendo o direito e os sujeitos titulares do mesmo considerando o disposto nos artigos 195, 236 e 237 da LRP.

Outro princípio informativo é o da unicidade ou unitariedade de matrícula, também de natureza instrumental, que preconiza a idéia de que, a cada imóvel considerado como um corpo certo e contínuo deve ser atribuído uma matrícula e a cada matrícula deve corresponder apenas um imóvel, consoante os artigos 176,§1º,I e 227 e parágrafo único do artigo 235, todos da LRP. Neste sentido houve uma radicalização, pois a atual LRP não admite a concomitância do fólio pessoal.

A despeito do respeitável entendimento de estudiosos, no sentido de que a atual Lei dos Registros Públicos não radicalizou na adoção do princípio da unitariedade matricial, Dipp diz expressamente que:

A Lei 6.015/73 perfilhou o sistema do fólio real, e o fez de modo absoluto (art. 176, par. Único, inc.I), excluindo a concomitância exceptiva do fólio pessoal, admitida pelo direito alemão(...).

A unitariedadee exige que a matriz abranja a integralidade do imóvel, e que a cada imóvel corresponda única matrícula. A agregação de prédios contíguos (fusão e unificação, arts.234 e 235, LRP) supõe a unidade social ou econômica do todo, formado com a anexação dos imóveis antes autônomos, de sorte que não se vislumbra exceção à rígida concepção de unitariedade perfilhada pelo direito brasileiro.

É um dos princípios que informa o núcleo do sistema registral imobiliário adotado no Brasil, onde cada imóvel assim considerado, individualizado e distinto dos demais, deverá ter sua matriz que servirá de suporte fático e jurídico para os atos e fatos que vierem a ser inscritos.

Além desses, outro princípio fundamental é o da especialidade, de natureza substancial, cuja idéia nuclear é no sentido de que a descrição do imóvel na matrícula deve ser de forma precisa e inequívoca, de sorte que não haja superposição de imóveis, o que implica na constância das medidas perimetrais, ângulos, nome dos atuais confrontantes se os imóveis lindeiros não tiverem uma denominação própria, distância da esquina ou da edificação mais próxima, se urbano, bem como a denominação cadastral, se houver, conforme dispõem os artigos 176,II e 225 da Lei dos Registros Públicos.

O princípio da especialidade, segundo Carvalho, significa que:

“toda inscrição deve recair sobre um objeto precisamente individuado. Esse princípio, consubstancial ao registro, desdobra o seu significado para abranger a individualização obrigatória de: a) todo imóvel que seja objeto de direito real, a começar pelo de propriedade, pois a inscrição não pode versar sobre todo o patrimônio ou sobre um número indefinido de imóveis; b) (...)

Imóvel para efeitos de matriculação e registro, de acordo com Carvalho, é aquele, ..., considerado independentemente de toda menção no registro, a um espaço de limites determinados na superfície da terra.(...) Esse imóvel por natureza, correspondente a uma porção individualizada da superfície terrestre, é que constitui basicamente o objeto do registro, conquanto se lhe tenha acrescido a unidade isolada do edifício de apartamentos.

A inteligência do artigo 225 no aperfeiçoamento do sistema registrário imobiliário brasileiro é singular, pois impõe aos tabeliães, escrivães e juízes a obrigação de que ao lavrarem atos que dizem respeito a bens imóveis o façam com precisão, deles constando todos os requisitos expressos no próprio artigo. O mesmo deve ocorrer com os instrumentos particulares.
Luiz Egon Richter

“É evidente que ao tratarmos das medidas cautelares e seus reflexos no Registro Imobiliário se torna indispensável colocar, de início, algumas questões que versem exclusivamente o direito processual civil, onde estão agasalhadas as medidas cautelares.

E tais referências são necessárias não só para os registradores, que precisam se conscientizar que não há ramo do direito desvinculado, eremita, sendo indispensável que incursione por outras matérias que não aquela específica do seu dia-a-dia...” Gilberto Valente da Silva.

Introdução; 1. Conceito de Registro de Imóveis; 2. Da importância do Registro de Imóveis; 3. Do direito registral imobiliário; 4. Do registrador público de imóveis; 5. Da responsabilidade civil do registrador público de imóveis; 5; 6. Do saber registral; 7. Da qualificação no registro de imóveis; 8. Dos atos e dos livros; 9. Da natureza jurídica da atividade registral imobiliária. Considerações finais e bibliografia.

Professor do Curso de Direito e da Pós-Graduação lato sensu da Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC e registrador público substituto do Registro de Imóveis de Lajeado-RS.

Introdução

Saber fazer é importante. Porém, é necessário saber porquê se faz. Com base nessa premissa, uma das preocupações daquele que exerce o seu labor no âmbito do Registro de Imóveis, é compreendê-lo, não apenas no seu aspecto funcional, mas, sobretudo, o próprio ser. Conhecer o ser implica ter noção e, acima de tudo, compreender suas causas: final, formal, material e eficiente.[1] Não é o objetivo deste trabalho enfrentar cada uma dessas causas analiticamente. Ao longo do mesmo vão acabar transparecendo nas abordagens que serão feitas.

É sabido que o fim do Registro de Imóveis é dar segurança jurídica. A quem interessa a segurança jurídica ? Ao homem enquanto indivíduo e cidadão e à própria sociedade. “O homem é, por natureza, um animal político” disse Aristóteles. É a premissa que justifica a vida em sociedade. Sociedade que necessita de um mínimo de segurança para que possa reproduzir a vida dignamente.

A temática central do trabalho é conceituar o Registro de Imóveis, diante da importância sócio-econômica que possui, à medida que tem por fim a segurança jurídica do direito real de propriedade imobiliária e outros direitos reais, assim como outros atos de natureza obrigacional.

Na civilização greco-romana, a constituição social, a própria organização institucional da cidade, tinha como fundamento: a propriedade privada, a família e a religião. Instituições, em princípio, imutáveis, pelo menos, não por deliberação dos próprios integrantes da cidade ou por decisão dos governantes.

O ponto de partida de Aristóteles a respeito da constituição ideal da polis, de acordo com Comparato, “estava fundamentado na classificação dos regimes de propriedade: a comunhão total, a ausência absoluta de comunhão e a comunhão ou condomínio de certas coisas, juntamente com a propriedade individual de outras”.[2]

A proteção da propriedade privada no mundo greco-romano estava a cargo do deus-doméstico. Como afirma Coulanges:[3] “A idéia de propriedade privada fazia parte da própria religião. Cada família tinha o seu lar e os seus antepassados. Esses deuses podiam ser adorados apenas pela família, só à família protegiam; eram sua propriedade exclusiva.”

Mais adiante, o mesmo autor, enuncia que: “Os gregos diziam que o lar tinha ensinado o homem a construir casas. Efetivamente, o homem, fixado pela religião em um lugar que não pensava jamais abandonar, bem cedo devia pensar em levantar nesse local uma construção sólida.[4] (...) Nessa casa a família é senhora e proprietária: a divindade doméstica será sempre quem lhe assegura esse direito. A casa é consagrada pela presença perpétua dos deuses; a casa é o templo que os guarda”.

A despeito da segurança divina, havia em alguns casos a exteriorização de atos de vontade que davam publicidade. Como exemplo Dip[5] diz que: "Na Babilônia, além dos cadastros e arquivos que, instituídos com finalidade administrativa, se prestavam a consultas para dirimir conflitos referentes a situações prediais, outra forma de notoriedade dominial de imóveis se manifestava com as "pedras de limites" (koudourrous), que remontariam à ascensão dos cassitas (aproximadamente por volta de 1750 a.C.). Tais pedras, que se colocavam sobre os terrenos, ademais da finalidade religiosa de atrair a proteção dos deuses, eram - no dizer de Pugliatti - "mezzo di prova durevole", realizando "una generica funzione pubblicitaria"

A propriedade moderna, ícone da civilização ocidental, desvinculou-se totalmente da dimensão religiosa própria da civilização greco-romana. Passou a ter um sentido econômico. John Locke, um dos contratualistas e também inspirador do constitucionalismo liberal, associou a liberdade à propriedade privada, ambas anteriores à constituição da sociedade civil. Para ele e outros contratualistas a propriedade é instrumento de subsistência individual e, além disso, garantia fundamental da liberdade do cidadão.

No Estado Liberal, a separação entre o Estado e a sociedade civil implicou, também, na separação entre o homem privado, enquanto indivíduo e o cidadão, enquanto sujeito da sociedade política. Ao primeiro, o Estado deveria assegurar os “direitos individuais” destacado-se a liberdade e a propriedade. Neste sentido surgiram as declarações dos direitos do homem, destacando aqui a Declaração de Virgínia em 1776 e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão em 1789.

Este movimento no século XVIII é resultado de uma retomada na crença de um Direito Natural, que nasce com o homem e é, ao mesmo tempo, inseparável de sua natureza. A existência desses direitos era inerente à condição humana, portanto imprescritíveis e, acima de tudo, não dependiam de qualquer justificativa metafísica.

No século XIII, Tomás de Aquino, ao enfrentar a questão da propriedade privada, faz uma distinção sob a forma de questionamento, segundo Zea.[6] 1) ¿Existe para el hombre el derecho de usar de las cosas exteriores para satisfacer sus necesidades? 2) ¿Es posible que dicho uso se convierte en potestad privativa de unos hombres frente a otros? – “En cuanto a la primera cuestión dice claramente SANTO TOMÁS que la posesión de las cosas exteriores es natural al hombre. Pero aquí se trata del hombre, como prototipo del género humano, no este o el otro hombre en particular. Todo hombre tiene derecho a usar las cosas y a servirse de ellas, (...). En cuanto a la segunda cuestión, (...) El derecho de la propiedad privada es derecho de creación humana, es decir, de derecho positivo. En SANTO TOMÁS es fundamental la distinción entre derecho natural y derecho positivo”.

A despeito da importante contribuição dos contratualistas e o seu ideário liberal, o direito de propriedade é um direito criado pelo homem. É instituído pelo Direito Positivo e é este que oferece o instrumental necessário para regular o uso, gozo, disposição e, sobretudo, a sua proteção. É a preocupação com a segurança do direito de propriedade e do crédito hipotecário que dá início à criação de sistemas jurídicos protetivos do direito de propriedade.

De uma maneira geral, admite-se a configuração de três sistemas principais de publicidade, que se revezam, com as variantes, nos países da comunidade mundial, diz Carvalho.[7]

“O primeiro atribui à publicidade o efeito de aviso a terceiros de atos que se perfazem pelo só acordo de vontades e que, portanto, não dependem dela para ganhar existência. O título é decisivo entre as partes nesse sistema, chamado, por isso, de consensual ou privatista. (...) O segundo confere à publicidade o efeito de constituir o direito que, antes dela, não se perfaz entre as partes, ainda que, em torno dele, haja acordo de vontades. O modo de adquirir, absorvendo o título, é decisivo nesse sistema, que, por exigir uma solenidade de investidura ou legitimação da autoridade pública, é chamado de publicista. Tendo a sua característica na constitutividade, pois a publicidade é elemento essencial do próprio ato de mutação jurídico-real, o sistema, por causa da sua proveniência, é designado como alemão. O terceiro, eclético, combinando o título com o modo de adquirir, de acordo com a doutrina romana, substitui a tradição pela publicidade registral, á qual concede o duplo efeito de constituir o direito real e de anuncia-lo a terceiros”.

1. Dilemas conceituais do Registro de Imóveis

Após as considerações introdutórias ao tema e verificados alguns pressupostos, é chegado o momento de trabalhar a idéia de conceitualização do Registro de imóveis. A dificuldade para tanto, é visível e perceptível, considerando que nem sempre a doutrina disponível oferece elementos a contento. Além disso, a Constituição Federal, em seu artigo 236, apresenta apenas duas características: sendo a primeira relativamente à especialização de funções, quando se refere a serviços notariais e de registro e a outra, relativamente à natureza do vínculo jurídico entre o notário e o registrador e o Estado, que se dá em caráter privado, por delegação do Poder Público. Estas características, entretanto, dizem respeito ao exercício da função e não propriamente a “características orgânicas e marcas institucionais para as notas e os registros públicos”[8]

Conceito é a representação de determinado objeto pelo pensamento, por meio de suas características gerais, como a qualidade, abstração, idéia e significação.[9] Para tanto é necessário também definir os critérios utilizados para a construção do conceito.

Os conceitos podem ser considerados como construções lógicas, estabelecidas de acordo com um sistema de referência e formando parte dele, de acordo com Trujilo.[10] Nesta linha de pensamento, conclui o citado autor: “A função da conceituação é refletir, através de conceitos precisos, aquilo que ocorre no mundo dos fenômenos existenciais; a conceituação consiste em ajustar o termo mais adequado, capaz de exprimir, através do seu significado, o que realmente se oferece na realidade, e não que a realidade existencial tenha que se ajustar ao conceito”.

Ao procurar conceituar o Registro de Imóveis, na verdade se faz um constructo, ou seja, uma construção de forma consciente e deliberada, com o propósito de dar contornos científicos, mesmo sabendo das dificuldades e limitações que se impõem, formado através de conceitos de nível inferior de abstração. Para a escolha destes conceitos de nível inferior de abstração, procuramos trabalhar com alguns critérios, com a finalidade de comparar, apreciar, procurando discernir de modo prudente a respeito do objeto a ser conceituado.

É importante trabalhar com a noção pluridimensional de critérios, para análise e materialização conceitual do Registro de Imóveis e não apenas a unidimensional ou bidimensional, pois estas limitam demasiadamente o campo de prospecção. Assim, o trabalho leva em consideração os critérios subjetivo, formal ou orgânico; objetivo, material ou funcional e o critério finalístico ou teleológico.

Sob o critério subjetivo, formal ou orgânico é possível conceituar o Registro de Imóveis como uma instituição organizada nos termos do ordenamento jurídico, tendo como titular um oficial público que, sob a forma de delegatário de serviço público,[11] dirige e executa atividades de intervenção do Poder público em campos que prevalece imediatamente o interesse privado e mediatamente o interesse público.

Enquanto que pelo critério objetivo, material ou funcional, podemos conceituá-lo como um serviço público que tem por objeto a inscrição pública de fatos jurídicos que de algum modo influem sobre direitos inscritos e também em relação aos sujeitos que neles figuram.

E sob o critério finalístico ou teleológico é possível afirmar que o fim da atividade desenvolvida no âmbito da instituição Registro de Imóveis é dar segurança jurídica a todos os direitos constituídos e/ou simplesmente publicizados por força da atividade registral desenvolvida pelo Oficial e seus auxiliares.

A utilização dos critérios material e objetivo, não classifica o serviço de registro como um serviço público de ordem material, como deixa claro Bandeira de Mello,[12] ao definir a atividade notarial e registral, sob o argumento de que: a atividade notarial e de registro, embora não considerada um serviço público de ordem material (atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível diretamente pelos administrados, prestada pelo Estado ou por quem lhe faça às vezes, sob um regime de direito público), o é de ordem puramente jurídica.

De acordo com Cunha e Dip[13], “O termo ‘instituição’ tem como núcleo conceitual o agrupamento estruturado e estável de indivíduos, grupos sociais e/ou conjuntos normativos e valorativos, com o escopo de realizar determinados fins. Assim, a instituição a) implica fundamentalmente uma idéia inicial (...), b) voltada a um objetivo concreto, c) em função do qual objetivo se estabelecem os meios ou atividades para alcançá-lo e d) a estrutura organizativa que corresponda”.

Um tríplice critério cliva o conceito e a realidade de toda instituição: o de unidade, o de estabilidade e o de ordenação para um fim, ensina Dip.[14] A seguir complementa dizendo que: “É em função dos fins que se estabelecem os meios ou atividades da instituição”. E cita Chico y Ortiz, que depois de observar que o aspecto institucional do Registro de Imóveis induz o juízo de que o cartório e os livros registrais são meios a serviço da instituição, rematou, acertadamente, que “a instituição do Registro da Propriedade não pode definir-se mediante seu objeto, a não ser destacando-se o que é sua finalidade”.

Existem instituições variadas de acordo com o fim de cada uma delas, como por exemplo as comunitárias, políticas, jurídicas, sociais, reais ou instituições coisa.[15] O Registro de Imóveis é uma instituição coisa,[16] que tem por fim organizar juridicamente a propriedade imobiliária. Há imbricação entre a instituição jurídica propriedade e a instituição coisa – Registro de Imóveis.

Uma das facetas dessa imbricação é a seguinte: “O que subpõe à segurança jurídica do Registro imobiliário é, sobretudo, a propriedade privada dos imóveis. A mesma expressão Registro de Imóveis indica o bem jurídico objeto da proteção última desse Registro. É o imóvel, na sua consideração jurídica, observada a reduplicativa: enquanto objeto de domínio particular. Disso se extra que a segurança jurídica registral imobiliária reconduz-se a um valor jurídico antecedente, a propriedade particular dos imóveis, a cuja organização se dirige com primazia”.[17]

À medida que o homem desenvolve o seu processo de civilização, procura estabelecer instrumentos de garantia para seus direitos. É sabido que, ao longo do tempo, a preocupação com a segurança relativa ao direito de propriedade imobiliário foi uma constante,[18] diante da necessidade social de racionalizar as relações sociais, para garantir a paz. Por essa razão foram criados institutos que davam publicidade, como forma de garantia.

Razão pela qual, se diz que as instituições notariais e de registro são anteriores ao próprio Estado[19], portanto, pré-jurídicas, considerando que foi com o Absolutismo que surgiu o Estado Moderno, caracterizado pelas Monarquias européias dos séculos XVI e XVII, enquanto que o Estado de Direito, surgiu no século XVIII, caracterizado pelo Estado Liberal.

Na acepção sociológica,[20] instituição quer dizer “Estrutura decorrente de necessidades sociais básicas, pelo caráter de relativa permanência, e identificável pelo valor de seus códigos de conduta, alguns deles expressos em leis; instituto.”

Este é o sentido empregado pela Constituição Federal de 1988, ao dispor dos serviços notariais e de registros públicos, fora do rol de competências dos Poderes clássicos no artigo 236: “Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do poder Público”.

Neste sentido Dip[21] adverte: “Por mais que, politicamente, fosse mera ficção afirmar, no Brasil, em 1988, que o Poder Público estivesse a delegar funções que esse Poder efetivamente não exercia, o fato é que – muitos de nós já teremos advertido de quanto cariz imaginário se revestem as Constituições Políticas – os serviços notariais e de registro afirmaram-se, pelo texto constitucional, como funções da soberania política, ou como ali se diz: como serviços públicos”.

Os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário não abarcam todas as funções públicas estatais, razão pela qual, algumas estão albergadas por instituições públicas, como espécies de corpos intermediários entre os poderes públicos clássicos. Enquanto estes últimos integram a estrutura do poder estatal, tendo sob sua responsabilidade a execução das três funções básicas, fazer, executar e aplicar a lei, as instituições estão voltadas a atender diretamente interesses sociais.

Há uma tríplice concepção de Registro de Imóveis, de acordo com Chico y Ortiz,[22] recordando Roca Satre, que se apresenta como: instituição, oficina e como conjunto de livros. Para Chico y Ortiz a “única y verdadera concepción del registro de la propiedad es la que lo contempla como institución”, descartando as concepções de oficina e conjunto de livros.

O mesmo autor esboçando as concepções substantiva e adjetiva da “instituição-registro”, menciona a primeira definição de Roca Sastre, para quem o Registro de Imóveis é: “Institución jurídica que, destinada a robustecer la seguridad jurídica inmobiliaria, tiene por objeto la registración de la constitución, transmisión, modificación y extinción de los derechos reales sobre bienes inmuebles”.

Para Coni e Frontini[23] o registro imobiliário “...es um médio técnico destinado a cubrir necesidades del tráfico que interesan a la sociedad, constituído como organismo de la Administración pública para atender intereses particulares, pero que cumple también una función de interés público”.

O Registro de Imóveis, assim como os demais registros públicos regulados pela Lei federal nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 e a atividade notarial, não são considerados como órgãos públicos stricto sensu, que integram os Poderes Públicos constituídos, como o Executivo, Legislativo e o Judiciário. São instituições que, ao lado de outras, como por exemplo o Ministério Público, integram a organização política e jurídica do Estado.

A atividade registral desenvolvida apresenta elementos distintos, que, de um lado, compreendem o objeto da publicidade e, de outro, o objeto da inscrição. O objeto da publicidade registral diz respeito às situações jurídicas decorrentes da publicidade registral dos fatos jurídicos; enquanto o objeto da inscrição registral, diz respeito aos fatos definidos em lei, como sujeitas à publicidade registral, seja com a finalidade de constituição de direitos, seja no sentido da mera declaração de direitos pré-existentes ou ainda averbações.

O primeiro compreende toda a gama de efeitos produzidos a partir do ato de registro ou averbação desenvolvido no exercício da atividade registral; enquanto que o segundo, compreende a publicização dos fatos jurídicos que a lei impõe ou faculta para a constituição, desconstituição e declaração de direitos ou ainda, de fatos jurídicos que dizem respeito aos titulares dos direitos inscritos.

Estes fatos são recepcionados no registro de imóveis através de títulos.[24] Os títulos devem apresentar a forma escrita e podem ter a natureza pública, como os atos notariais e do Poder Público, como os oriundos do Poder Executivo e do Judiciário ou ainda particular, desde que de acordo com o que permite ou determina a ordem jurídica, conforme dispõe o artigo 221, da Lei dos Registros Públicos, enquanto que o artigo 167, incisos I e II, apresenta um rol de fatos jurídicos registráveis e averbáveis no Registro de Imóveis, sem que, no entanto, seja possível considerá-la uma relação numerus clausus,[25] diante da permissão ampliativa para os fatos averbáveis, pelo artigo 246, da mesma Lei.

Considerando os critérios acima mencionados, o Registro de Imóveis pode ser conceituado como: A instituição-coisa, a cargo de um Oficial Público por força de delegação, que tem por atribuição legal a capacidade para publicizar fatos jurídicos que dizem respeito a bens imóveis, com efeitos constitutivos ou declaratórios do direito real de propriedade, ou direitos reais que recaem sobre o direito real de propriedade imobiliária e, ainda, direitos de natureza obrigacional, bem como atos ou fatos que dizem respeito aos sujeitos que figuram nos registros, sempre que a lei assim impuser ou autorizar, com a finalidade de dar autenticidade, segurança e eficácia jurídica.

Analisando objeto do registro, verifica-se que são na realidade fatos jurídicos que de algum modo influem sobre os direitos inscritos. Estes direitos em si considerados são realidades cuja existência, decorrem muitas vezes do próprio ato registral, consoante o artigo 676 do CC, ou de fatos típicos referidos na lei, como por exemplo o disposto no artigo 530, do Código Civil[26] e no artigo 22, da Lei federal nº 6.766/79. É necessário frisar que o conceito de registro de imóveis, compreende de um lado a instituição prestadora de serviço público, enquanto aparato oficial da publicidade registral, repartição ou organismo, matéria que “melhor quadra ao direito administrativo organizatório dos registros [enquanto repartições, organismos ou conservadorias;][27] e de outro, o objeto de inscritibilidade que são os fatos jurídicos, que tenham por fim constituir, declarar, transferir, modificar ou extinguir direitos atinentes a bens imóveis, móveis e os respectivos sujeitos e, o objeto da publicidade registral, os efeitos decorrentes dos atos registrais e as respectivas informações.

2. A importância do Registro de Imóveis

A instituição Registro de Imóveis desenvolve um papel importante e complexo no cenário econômico, jurídico e social, por força da sua atribuição finalística que é a segurança jurídica estática e dinâmica do direito de propriedade imobiliária e outros direitos reais ou obrigacionais afetos a sua competência. A segurança jurídica estática diz respeito a publicidade dos direitos reais inscritos e a dinâmica, ao tráfico seguro das relações jurídicas de alienação e/ou oneração.

A rapidez das transformações e a complexidade decorrente contribuem para um sentimento generalizado de insegurança. Isso faz com que as pessoas busquem cada vez mais resguardar os seus direitos. O registro imobiliário é uma instituição que tem por fim dar certeza jurídica, aqui no Brasil é bem verdade júris tantum, mas inegavelmente necessária para viabilizar e estabelecer a credibilidade e a confiança.

O aproveitamento econômico e social dos bens requer proteção jurídica. Proteção essa, imprescindível para viabilizar a vida em sociedade. Diante dos interesses ilimitados e da finitude dos bens o Direito deve responder por meio de instrumental eficaz e eficiente pela segurança e, conseqüentemente, a prevenção de conflitos.

É da essência do Registro de Imóveis proteger os direitos reais e outros que por força de lei lhe são afetos. Neste sentido é possível afirmar que o mesmo tem uma função econômica. O Banco Mundial, já em 1996, referia taxativamente que “um registro de propriedade é fundamental e essencial para o desenvolvimento de uma economia de mercado que funcione. Melhora a segurança, diminui os custos das transferências dos bens e proporciona um mecanismo de baixo custo para resolver as eventuais disputas sobre os bens”.

No campo do Direito Econômico fala-se da Nova Economia Institucional que, a despeito da falta de consenso sobre as definições[28], bem como quanto à terminologia adotada, apresenta os seguintes pontos em comum: 1) a estrutura dos direitos de propriedade da tradição neoclássica é tomada como ponto de partida; 2) o pressuposto de plenitude de informação, adotado nos modelos neoclássicos, é relativizado, passando a ser examinadas as conseqüências dos custos de transação; 3) procura-se uma superação do simplismo que marca os modelos neoclássicos tradicionais, fundados basicamente na análise das variáveis “quantidade” e “preço”.
Luiz Egon Richter

Introdução

O exercício da função qualificadora do registrador público de imóveis impõe-se como imprescindível à segurança jurídica, à medida que está diretamente sintonizada com a idéia de verificação da validade formal e substancial do ato ou fato jurídico objeto da publicidade registral, porque tem por fim avaliar a qualidade do negócio jurídico no plano da legalidade lato sensu para efeitos de publicização constitutiva, desconstitutiva e/ou declaratória.

Fazer uma abordagem a respeito da função qualificadora e o seu correlato fim, implica, necessariamente, delimitar previamente o tema, e para tanto, devem ser apresentados alguns pressupostos capazes de nortear e dar sentido à temática a ser enfrentada.

Dizer simplesmente o que é a função qualificadora e a sua utilidade/necessidade para os efeitos finalísticos parece-me insuficiente para a compreensão do tema. É necessário estabelecer, portanto, uma base que dê suporte à teorização sobre o assunto.

Partindo da premissa de que a atividade registral é considerada uma função pública, executada por um particular delegatário, que tem por objeto imediato a tutela de interesses privados e mediatamente o interesse público, é importante conceituar o registro de imóveis, que é a instituição prestadora do serviço, considerar a respeito de sua função instrumental e sua responsabilidade social, diante da noção de Estado Democrático de Direito, procurando mostrar algumas diferenças desse modelo de Estado com o do Estado Liberal.

Outro pressuposto é a independência funcional do registrador público de imóveis, sem a qual, não há o que se falar em qualificação. O registrador no exercício de suas funções está submetido ao Direito, enquanto conjunto de regras e princípios, com a qual deverá trabalhar utilizando o saber prudencial, elaborado de acordo com as contingências.

A contingencialidade é própria do objeto da atividade registral, razão pela qual, não trabalha com um saber científico que apresenta regras de valor universal. Opera com base num saber prudencial, que tem por fim viabilizar e materializar a certeza jurídica aos atos que praticar em razão de sua competência.

Supõe-se necessário, também, considerar a respeito do direito registral, como instrumental de atuação, o qual, no plano normativo, pode ser no sentido material e formal, cabendo, em linhas gerais, ao primeiro disciplinar os negócios jurídicos e seus efeitos e, ao segundo o procedimento formalístico.

Não adotamos no Brasil, nem o sistema publicista puro, nem o privatista, mas sim um sistema eclético que contempla o título e o registro. A forma pública e privada para os títulos causais e o conteúdo publicista constitutivo, como essencial à existência dos direitos reais por convenção entre vivos, sem, contudo, assumir o princípio jure et jure.

Daí poder-se afirmar que no Brasil há dupla qualificação. A exercida pelo tabelião, no momento da elaboração da escritura pública e, a do registrador de imóveis, para efeitos de publicização registral. O primeiro qualifica as partes e o negócio jurídico, enquanto que o segundo qualifica o título.

Qualificar é algo mais profundo do que simplesmente examinar ou verificar um objeto, pois o exame e a verificação ficam no campo da contemplação. A verificação é o início do caminho que deve levar à análise do mérito jurídico do título, com a finalidade de deferir ou não a lavratura da escritura pública ou o registro do título.

Exercer a função qualificadora a partir de regras positivadas, sem lhes atribuir um valor consentâneo com o momento da sociedade, pode prejudicar a tomada de decisão do registrador na viabilização da segurança jurídica pretendida. Por isso crescem de importância os princípios que informam e conformam a atuação do registrador, especialmente neste momento de crise por que passa o Direito, quando flagrantemente a positivação do mesmo, como um sistema fechado, perdeu os seus atributos de sistematicidade, generalidade e estabilidade.

Impõe-se, no mínimo por essa razão, ao registrador publico de imóveis, uma responsabilidade maior, que transcende a mera execução literal da lei positivada. É necessário que seja capaz de compreender o sistema jurídico, econômico e social e a partir daí formar o juízo de valor, capaz de assegurar a segurança jurídica.

A qualificação do título transcende a mera contemplação, passando para o campo da substancialidade do objeto, no caso, o título apresentado para fins de registro. A verificação é o início do caminho que deve levar à análise do mérito jurídico do título, com a finalidade de deferir ou não o registro.

O registro de imóveis e a sua função instrumental

Elaborar um conceito a respeito de determinado objeto não é tarefa das mais fáceis, especialmente diante da complexidade que o tema apresenta e a importância que merece. Trabalhando com a idéia de meio e fim, elaborou-se um conceito, partindo da premissa de que o Registro Imobiliário, enquanto ser, é uma instituição que tem por fim constituir, desconstituir e declarar direitos e ao mesmo tempo, dar-lhes a devida segurança jurídica.

Assim, conceituamos o Registro de Imóveis como: A instituição-coisa, a cargo de um Oficial Público por força de delegação, que tem por atribuição legal a capacidade para publicizar fatos jurídicos que dizem respeito a bens imóveis, com efeitos constitutivos ou declaratórios do direito real de propriedade, ou direitos reais que recaem sobre o direito real de propriedade imobiliária e, ainda, direitos de natureza obrigacional, bem como atos ou fatos que dizem respeito aos sujeitos que figuram nos registros, sempre que a lei assim impuser ou autorizar, com a finalidade de dar autenticidade, segurança e eficácia jurídica.

Para a publicização dos fatos e atos jurídicos, com vistas à produção dos efeitos atribuídos pelo ordenamento jurídico e/ou apenas desejados pelos interessados, impõe-se que os títulos que vão dar causa ao registro, sejam previamente qualificados nos planos da existência, da validade e da eficácia. Em resumo, qualificação à luz do Direito! Essa qualificação compreende a materialização de parte da função registral, pois a mesma ultrapassa a mera análise do título, alcançando outras searas, no seu agir instrumental, como por exemplo o controle urbanístico, ambiental e fiscal.

Função e fim, a despeito de muitas vezes serem consideradas como sinônimos, na verdade são dois termos com significados próprios. O primeiro apresenta a idéia nuclear de operação, como atividade executada por um operador jurídico[2] – análise do título nos planos da existência, validade e eficácia –, enquanto que o segundo expõe a idéia de causa final, que é a segurança jurídica. As idéias de função e fim estão compreendidas na idéia geral de instrumento, ensina Amadei escrevendo:“Ter instrumento e ser instrumento induzem, no espírito, idéias diversas: da primeira expressão é refletida a idéia de poder; da segunda, a idéia de fim e de servir”. Instrumento é meio para se atingir um fim.

Nesse sentido o Registro de Imóveis é, ao mesmo tempo, um instrumento de poder que constitui, desconstitui e/ou declara direitos reais e pessoais que lhe são afetos, de acordo com a sistemática registral vigente e que exerce funcionalidades registrais, como a qualificação, inscrição e a publicidade, tendo por fim a segurança jurídica. Ao trabalhar a idéia de instrumento aplicada ao registro imobiliário, Amadei[4] aduz que se deve reconhecer nesta instituição: “(a) o poder que atribui a quem o tem (instrumento/poder) e investigar (b.1) a função que exerce na ordem jurídica da sociedade e (b.2) o fim a que se destina (instrumento/meio).”

No que diz respeito ao registro como instrumento/poder, é forçoso verificar, diz ele, “em cada sistema jurídico, quais os efeitos decorrentes do registro imobiliário, pois é na proporção da classificação e extensão desses efeitos que a inscrição representará o grau de poder conferido ao titular do direito real”. Já com relação à investigação da função e do fim, acrescenta o mesmo autor, deve ser examinada: “(a) qual é a ação própria ou a atuação específica da instituição registral imobiliária na ordem jurídica da sociedade) a função e a funcionalidade registraria), bem como (b) para qual causa final e escopo o registro imobiliário está dirigido (o fim e a finalidade registraria)”.

A seguir o autor classifica como funcionalidades registrárias: a qualificação, a inscrição e a publicidade; como finalidades registrarias, a segurança jurídica estática e a dinâmica. E arremata escrevendo:

Qualificação registraria, inscrição e publicidade são decorrências diretas e específicas da atuação da instituição registral imobiliária, de sua dinâmica procedimental, ao passo que a segurança jurídica (estática e dinâmica) é a razão dessa instituição, que se obtém pelos efeitos da qualificação, da inscrição e da publicidade.

O eixo do Registro de Imóveis é a propriedade imobiliária privada, não obstante a matriculação e o ingresso diário de bens públicos, em torno da qual gravitam a função e o fim. De um lado a procedimentalidade, de outro a segurança. Para Serpa Lopes[5] “O formalismo do Registro impõe-se por que representa a segurança, o elemento gerador da boa-fé, da tranqüilidade na consumação do ato jurídico”. A seguir, o mesmo autor, ensina: “O fundamento da publicidade imobiliária é a idéia de segurança”.

É, portanto, com a finalidade de dar segurança jurídica que o registrador público de imóveis desenvolve suas atividades, exercendo as prerrogativas outorgadas pelo ordenamento jurídico, cumprindo a função social que é inerente à função registral.

A atividade registral no Estado Democrático de Direito

Por ser uma atividade de natureza pública, a despeito de ser executada sob regime privado, é importante que se estabeleçam algumas diferenças, que estão presentes nas formulações dos modelos de Estado Liberal e Estado Democrático de Direito, e que repercutem na esfera de prestação dos serviços registrais.

Procurando definir as atividades notariais e registrais, Mello[6], diz que a atividade notarial e de registro, embora não considerada um serviço público de ordem material (atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível diretamente pelos administrados, prestada pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de direito público), o é de ordem puramente jurídica.

O Estado Liberal se caracteriza pelo ideário liberal, individual. Não era um mero Estado Legal, mas a expressão política, jurídica e econômica do Liberalismo. Ao trabalhar com o conceito do Estado Liberal, Morais[7] aponta algumas características deste modelo estatal.

A. Separação entre estado e Sociedade Civil mediada pelo Direito, este visto como ideal de justiça; B. A garantia das liberdades individuais; os direitos do homem aparecendo como mediadores das relações entre os indivíduos e o Estado; C. A democracia surge vinculada ao ideário da soberania da nação produzida pela Revolução Francesa, implicando a aceitação da origem consensual do estado, o que aponta para a idéia de representação , posteriormente matizada por mecanismos de democracia semidireta – referendum e plebiscito, etc. – bem como, para a imposição de um controle hierárquico da produção legislativa através do controle de constitucionalidade; D. O Estado tem um papel reduzido, apresentando-se como Estado Mínimo, assegurando, assim, a liberdade de atuação dos indivíduos.

Dois elementos se sobressaem: o individualismo e a legalidade. O sistema jurídico e seus institutos estavam voltados para enfrentar as questões que envolvessem os interesses e os direitos individuais. Nesse sentido, a atividade registral imobiliária também demonstrava cuidado com os direitos e interesses do indivíduo e de terceiros no plano singular. Não havia maior preocupação com os direitos e interesses sociais, muito menos, com os difusos.

Serpa Lopes[8], ao trabalhar a publicidade registral imobiliária sintonizada com aquela época, demonstra a evolução que ocorreu em relação à Antigüidade, escrevendo que a mesma: “Deixou de ser, como antigamente, a salvaguarda do clan ou do grupo social, para ter por objeto precípuo a preservação dos interesses privados, quer das partes, quer dos terceiros, notadamente”.

Com essa assertiva fica claro o ideário liberal-individualista presente no sistema registral imobiliário naquela época. O fim do Registro de Imóveis era a propriedade particular, sem se ocupar com questões que pudessem ultrapassar os limites dessa individualidade, como por exemplo as de natureza urbanística, ambiental, agrária entre outras.

A legalidade contemplava a legitimidade na forma legal, ficando o conteúdo num segundo plano. Em outras palavras, bastava que o ato ou o negócio jurídico fossem feitos de acordo com a lei, no plano formal, pouco importando se eram éticos em termos de conteúdo, como por exemplo a função social do contrato, a boa-fé objetiva e a moralidade. A ética predominante era a forma! Este ideário repercutiu e orientou as atividades notariais e registrais durante muito tempo.

Com o esgotamento do modelo de Estado Liberal clássico, surge o Estado Social de Direito, quando o individualismo dá lugar ao social, o absenteísmo estatal dá lugar a prestações positivas, e a lei deixa de ser um instrumento de ordem geral e abstrata com finalidade não impeditiva para se transformar num instrumento de ação concreta do Estado.

Nesse modelo de Estado Social foi incorporado, e de certa forma radicalizado, o elemento democrático, dando origem ao Estado Democrático de Direito, cuja idéia adotamos na Constituição da República Federativa do Brasil, conforme dispõe o seu artigo primeiro.

Este modelo de Estado tem por fim transformar o status quo, por meio do Direito. O conteúdo das relações econômicas e sociais passa a ser objeto do Direito. Este deixa de lado a primazia da forma e atribui importância ao conteúdo. Ocorre, conseqüentemente, o desdobramento da legalidade e da legitimidade. Para Morais[9] o Estado:

“(...) assume a forma de busca efetiva da concretização da igualdade, não pela generalidade do comando normativo, mas pela realização, através dele, de intervenções que impliquem diretamente uma alteração na situação da comunidade.”

A legalidade deixa de ser sinônimo de Direito, pelo fato de que esse não está mais contido totalmente na lei. A legitimidade não está mais contida, necessariamente, na forma, razão pela qual, a legalidade e a legitimidade passaram a ser trabalhadas autonomamente.

O individualismo é superado pela noção do social. Os bens e os direitos passaram a ter uma relação mais próxima com o interesse público. A propriedade passou a ter um conteúdo sócio-ambiental, nos termos dos artigos 5º, XXIII e 225, entre outros, da Constituição Federal, assim como o contrato deixou de lado a noção individual, para desempenhar uma função social.

Neste sentido Dip[10] ao palestrar sobre a constituinte e o Registro de Imóveis, disse:

“Consiste o registro imobiliário, sob o aspecto institucional, em um sistema de publicidade provocada e estável de situações jurídicas prediais, que opera mediante inscrição de fatos jurídicos (lato sensu), e cuja finalidade é a de assegurar, formalmente, determinados interesses da comunidade”.

A propriedade privada é assegurada constitucionalmente[11], porém, passou a estar submetida à função social,[12] o que publicizou o seu conteúdo, alterando, conseqüentemente, a função e o fim do Registro de Imóveis. Enquanto instrumento/meio passou a intervir nas ordens urbanística, ambiental e agrária, sem falar na atuação de controlador fiscal, e como atividade fim a segurança visada é dos interesses da comunidade. A segurança jurídica individual está mediatizada pela segurança jurídica coletiva.

São alterações que repercutiram e repercutem no âmbito dos serviços registrais, em especial no exercício da qualificação do negócio jurídico e do título. Para que o exercício da atividade dos registradores esteja sintonizado com o tempo em que é exercida, a despeito de não haver correspondência necessária com o tempo cronológico da regra jurídica, necessitam, entre outras qualidades e prerrogativas, de independência funcional.

A independência do registrador O registrador público de imóveis é pessoa natural que por meio de um ato de delegação[13] do Poder Público recebe investidura estatal[14], para exercer em caráter privado, os serviços concernentes à instituição registral imobiliária.

Ao receber a investidura, pratica os atos que lhe compete, não na qualidade de pessoa natural, em interesse próprio, mas sim, como um agente público. Esses atos, a despeito de serem públicos, são imputados ao registrador. O Oficial não presenta, mas sim representa o Estado. O Estado age, neste caso, por interposta pessoa, descentralizando em favor de particulares a função registral. Ao descentralizar a execução destas atividades o Estado não cria outra entidade, apenas transfere, por delegação, o seu exercício.

O representante do Estado age por sua conta e risco, nos exatos termos definidos pelo ordenamento jurídico, mesmo que estes atos apresentam natureza pública. É com base nesta premissa que se forjou um modelo de independência funcional. Este é o entendimento de Dip[15] ao enseinar que:

“O modelo da independência jurídica do registrador e do notário, como foi antecipado, ajusta-se, entre nós, ao direito posto: notário e oficial de registro são "profissionais do direito", "dotados de fé pública" (art. 3.º, Lei 8.935, de 18.11.1994), gozando "de independência no exercício de suas atribuições" (art. 28, Lei cit.). Daí que, submetidos à legalidade, têm o dever de observar "as normas técnicas estabelecidas" pelo Poder que o fiscaliza (inc. XIV, art. 30, Lei cit.).”

Em prosseguindo aduz que:

“Esse modelo, fundado em uma sólida teoria dos saberes jurídicos, corroborado pela tradição e compaginado, pois, com o direito posto – incluso o constitucional –, não se compatibiliza, é verdade, com o fato da poietização da profissão jurídica dos notários e registradores, nem com o fato da administrativização do objeto jurídico primeiro de sua tarefa: a autonomia de vontades contratantes, no caso dos notários, e a propriedade privada, no dos registradores. Tampouco o paradigma da independência jurídica de oficiais de registro e tabeliães é acomodável ao fato de comumente entender-se que a mais rigorosa das punições administrativas a eles cominadas, a de perda de delegação, esteja ligada a um simplíssimo elemento normativo de tipo – a falta grave –, sem menção da conduta que o carregue.”

Para que o exercício da função qualificadora possa ser executado de forma eficaz e eficiente, é imprescindível que o registrador tenha liberdade decisória, sem nenhum tipo de condicionamento, seja de ordem política, econômica, burocrática e corporativa. O condicionamento ao qual os registradores estão sujeitos é o da ordem jurídica.

Por isso é certa e elogiável a adoção do princípio da delegação para o exercício da função notarial e registral. Isto permite que notários e registradores possam exercer de forma autônoma, nos limites que a ordem jurídica lhes outorga, este munus público. Autonomia em sentido lato, compreendendo a funcional, organizacional e financeira.

O registrador possui uma função social e econômica importante, à medida que atua prevenindo conflitos, procurando viabilizar ou constituir direitos de maneira eficaz e segura. Para isso precisa estar sintonizado com o momento atual, utilizando-se de uma racionalidade compatível contemporaneamente.

A própria fiscalização que essas atividades estão sujeitas, deve ser exercida nos limites estabelecidos pela Constituição Federal e a legislação infraconstitucional, o que dá segurança, na medida em que preserva a liberdade decisória. Esta independência funcional também deve estar alicerçada num saber próprio e inerente ao exercício das funções.

Dos saber registral

A qualificação registral se caracteriza como operação intelectiva, fundada num juízo prudencial e não um juízo meramente especulativo, como nos ensina Dip[16], ao abordar a qualificação no Registro de Imóveis, dizendo que:

“Com efeito, a qualificação registrária diz respeito ao quale (a qualidade no seu suporte substancial singular), não à qualitas abstraída do indivíduo, e assim não como simples especulação do sujeito, mas, passando do conselho e do julgamento dos meios para a operação: não apenas meramente se examina ou se verifica a eventual inscritibilidade de um título (rectius: sua potencialidade inscritiva), mas se julga e impera um registro, hic et nunc. A verificação fica a meio caminho da imperação do operável; a qualificação abrange o ato de verificar (componente especulativo da prudência, enquanto se considera sujeito) e aplica os conselhos e juízos encontrados à operação(...)”

Em continuação aduz:

“O juízo qualificador (enquanto conclusão do procedimento prudencial) pode ser positivo (em ordem a seu fim, que é o registro) ou negativo (desqualificação, juízo desqualificador), de toda sorte consistindo sua mais destacada relevância a imperação de que se registre ou de que não se registre um título. E, exatamente porque a aplicação ao operável é o fim do intelecto prático, o ato de império, na qualificação registral, é o mais relevante dessa complexidade.”

Há tipos diferenciados de saberes, como por exemplo: o teórico ou especulativo, que resulta da reflexão da realidade; e o saber prático ou operativo, em que a razão prática não se limita a repercutir ou refletir os objetos, mas trata de realizá-los. Portanto, esse último não espelha o objeto analisado, mas trabalha com instrumentos para ação, como por exemplo a norma e a medida da ação a praticar ou da coisa a fazer.

A razão prática, por essa razão, não se destina a contemplar uma realidade já realizada, mas se dirige a uma realidade a realizar-se. Estamos diante, portanto, de uma operação. Operável é tanto o fazer, quanto o agir[17]. O operável na sua concretude, individuado, dirigido à atuação de um bem singular, constitui objeto da prática prudencial, que por sua vez se funda no saber prudencial.

O saber e o agir prudencial do registrador de imóveis é dirigido à solução de casos concretos. Para Dip[18],

“(...) o saber operável do direito não é, própria e primeiramente, um saber artístico ou técnico, em que se exerça uma atividade poiética, de fazer alguma coisa sobre matéria no mundo exterior. Antes, o saber jurídico propriamente operável é um saber prudencial, porque se volta à consecução do bem, não do apenas útil, não do somente eficaz”

Em outra passagem adverte Dip[19] que:

“(...) a subordinação do registrador à legalidade estrita deriva da teologia da instituição registrária, que se encontra na outorga de segurança jurídica. Mais que de teleologia, pode-se aí falar, com mais força, que a segurança é a enteléquia do registro imobiliário. Mas o direito humano não é um direito constituído como simples sanção do direito natural preexistente; antes, a finalidade imanente da lei humana é a de criar a segurança jurídica, que doutro modo não pode ser instituída. Assim, o saber prudencial do registrador é um saber subposto à ordem normativa, mediante uma busca tendencial de clarificação da ordem jurídica, por meios externos.
Romeu Felipe Bacellar Filho*

O debate que questiona a Iegitimidade dos cartórios (expressão utilizada em homenagem à tradição) causa preocupação a todos que prezam a ordem jurídica. Sem dúvida, as funções atribuídas aos notários e registradores correspondem às conveniências básicas da sociedade, garantindo publicidade, autenticidade, segurança e eficácia aos atos e negócios jurídicos.

Além disso, muitos dos atos praticados pelos cartórios constituem condição sine qua non para o exercício de direitos fundamentais. São exemplos disso o registro de nascimento, casamento e óbito, a constituição de pessoas jurídicas, o registro de imóveis, o registro de protesto de documentos de dívida, as escrituras públicas e os a testamentos.

Assim exposto, fica claro que tais serviços são essenciais para os objetivos fundamentais do Estado, caracterizando-se como serviço público. Por isso mesmo a Constituição atribui sua titularidade ao Poder Público. Mas, ao mesmo tempo, a carta estabelece no artigo 236 que tal atividade seja exercida em caráter privado, mediante delegação, reconhecendo, desde logo, que a administração pública brasileira não reúne condições estruturais para a devida prestação destes serviços.

Neste momento em que o Estado brasileiro está sendo redesenhado e seu papel social redefinido, a meta é oferecer aos cidadãos um modelo de administração pautado na qualidade e eficiência dos serviços públicos. Essa atuação, orientada para o cidadão usuário, passa por diversas políticas, entre elas a diminuição do aparelho estatal mediante parceria com os particulares. Nessas atividades que permitem outorga ou delegação, o Estado passa a ter funções eminentemente regulatórias e fiscalizadoras.

Assim, pode-se dizer que o artigo 236 permitiu a dinamização e qualificação dos serviços dos cartórios, bem como a modernização é o melhor aparelhamento dos mesmos. Pode-se citar, só como exem­plo, o "Projeto 2005”, que inclui a criação de banco de dados de abran­gência nacional, a certificação digital, a criação de novos cursos de reciclagem e atualização, entre outras metas. Tudo visando a melho­ra dos serviços e um atendimento mais eficiente ao cidadão.

Da mesma forma tratou-se o acesso às funções de notários e re­gistradores. O concurso público não só é democrático, garantindo moralidade e impessoalidade na atividade administrativa, mas também é a maneira mais eficaz de seleção de pessoal técnico e especializado para o desempenho de funções públicas.

Outro ponto de freqüente debate é a discussão em torno da re­muneração de tais serviços. Como são operados por particulares, é natural que para os serviços dos cartórios sejam cobradas taxas de quem deles precisa. Mas vale lembrar que não são os notários e registradores que determinam os valores dessas taxas, ao con­trário, o valor cobrado obedece normas fixadas por lei federal. Ou seja, apesar do serviço dos cartórios ter caráter privado, não aten­de a uma regra básica da economia privada: a livre fixação de preços.

Ademais, o regime cartorial adotado pelo Brasil enquadra-se no sistema de tipo Iatino, existente nos países do Mercosul, em todas os países da União Européia e nos países do Leste Europeu. Num contexto de economia globalizada, em que a inserção no comér­cio internacional e a conquista de mercados consumidores es­trangeiros é condição fundamental para o crescimento da econo­mia, não parece prudente modificar uma estrutura de serviços compatível com os padrões internacionais. Isso sem falar em toda a legislação infraconstitucional brasileira.

Neste contexto, pode-se depreender que uma alteração na forma de prestação dos serviços notariais e de registro, passando al­guma de suas funções para o Estado, acarretaria um verdadeiro retrocesso em relação à Constituição de 1988, afetando não só a qualidade e eficiência na prestação de serviços, mas também re­presentando um ônus extra para o aparelho estatal.

É crucial observar que o regime privado para a prestação dos serviços atribuídos aos tabeliães de notas e oficiais de registro per­mite desonerar o Estado das custas com a prestação de tais serviços, tornando com isso possível o redirecionamento de recursos para as políticas públicas de cunho social, tão prementes no País, principalmente nos setores de prestação de serviços básicos, como saúde, educação e moradia. De igual modo, a responsabilidade civil por danos verificados no exercício dessa atividade é direta e pessoal do agente delegado deso­brigando o Estado de qualquer atuação neste sentido. A sistemática hoje adotada no Brasil é a que melhor atende os inte­resses da coletividade. (Tribuna do Direito, SP, setembro/2003, p.16)

* Romeu Felipe Bacellar Filho é doutor em Direito do Estado e professor da Faculdade de Direito da universidade federal do Paraná e da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

Fonte: http://www.anoreg.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=15839:artigo-notarios-e-registradores-respeito-dignidade-e-honra-por-marcio-machado-teixeira-&catid=32:artigos&Itemid=12
1 Luiz Egon Richter

2 No âmbito do estudo do direito registral imobiliário, merece especial atenção a trajetória do título, que se inicia com a sua apresentação no Registro de Imóveis e se encerra com a devolução ao apresentante. É durante este espaço temporal que o título apresentado sofre a ação do Oficial do Registro de Imóveis.

Buscando enfrentar o tema, apresento este ensaio, onde procuro trabalhar algumas questões conceituais e principiológicas relacionadas com a prática do dia-a-dia nos serviços de Registro de Imóveis.

Antes de fazer uma abordagem a respeito do trâmite do título propriamente dito, convém uma breve análise conceitual do próprio Registro de Imóveis, que é o espaço onde o título será analisado.

O Registro de Imóveis pode ser conceituado como: a instituição que tem por atribuição legal a capacidade para publicizar fatos jurídicos que dizem respeito aos bens imóveis, o direito real de propriedade imobiliária, os direitos reais que podem recair sobre o direito real de propriedade imobiliária e demais direitos inscritos, bem como atos ou fatos que dizem respeito aos sujeitos que figuram nos registros, sempre que a lei assim impuser ou autorizar, com a finalidade de dar autenticidade, segurança e eficácia jurídica.

É instituição cuja origem antedata o próprio Estado, pois a busca pela segurança vem de tempos memoriáveis. Em época mais recente na história, o Estado acabou por assumir a responsabilidade pela segurança jurídica, e para tanto, criou órgãos e instituições para tal finalidade. Ao criá-los distribuiu e atribuiu, por força de lei, as competências e respectivas finalidades, destacando-se aqui a publicidade, a segurança e a eficácia jurídica.

O Registro de Imóveis brasileiro transcende no âmbito de suas competências, a mera publicidade onstitutiva, desconstitutiva ou declaratória de direitos reais sobre bens imóveis, na medida em que, são publicizados fatos jurídicos que dizem respeito aos imóveis, assim como atos e fatos que dizem respeito aos titulares de direitos ou demais sujeitos que figuram nos atos registrais. Temos, portanto, um sistema registral imobiliário que não fica adstrito à constituição ou declaração de direitos reais sobre bens imóveis. Atrevo-me a dizer, que é um sistema flexível e não rígido!

2 Registrador Substituto do Registro de Imóveis de Lajeado; Professor da disciplina de Registro de Imóveis da Faculdade de Direito de Santa Maria - FADISMA e do Colégio Registrado do Rio Grande do Sul; Professor de Registros Públicos e Direito Administrativo da Universidade de Santa Cruz do Sul-UNISC. 2 Os efeitos dos atos registrais podem ser constitutivos, quando a publicidade é elemento da própria constituição do direito ou, em outras palavras, a publicidade é pressuposto de existência do direito real. Podem ser também desconstitutivos, quando em razão do cancelamento de um registro se desconstitui o direito real ou, ainda, em razão da transmissão do direito real, este se desconstitui em favor do outorgante. Quando o direito já existe anteriormente, mas necessita da publicidade apenas para produzir efeitos em relação a terceiros, estamos diante dos efeitos declaratórios. Além destes, temos ainda os que são praticados apenas para dar notícia, tornar público, atos ou fatos que dizem respeito ao bem imóvel, aos direitos inscritos ou sujeitos que figuram nos atos registrais.

A publicidade registral imobiliária se dá, via de regra, a partir do título apresentado. Este título é que vai dar causa ao registro, razão pela qual, o mesmo é denominado de título causal. Mas o que vem a ser título para efeitos de registro? É todo e qualquer documento que contempla no seu bojo, direito a ser constituído, desconstituído ou declarado ou, ainda, meros atos e fatos que possam de uma forma ou outra repercutir no registro, independentemente da produção de efeitos.

Nem todos os títulos têm ingresso no Registro de Imóveis. De acordo com o artigo 221 da Lei dos Registros Públicos, somente serão admitidos a registro: escrituras públicas, escritos particulares com ou sem força de escritura pública, atos autênticos de países estrangeiros e títulos judiciais. Podemos acrescentar a estes, os títulos de natureza administrativa, expedidos pelos órgãos estatais competentes, como por exemplo um título de constituição de direito real de uso, uma investidura, etc...

O sistema registral imobiliário brasileiro é informado por vários princípios que nos servem de guia e, sobretudo, facilitam a compreensão e aplicação da matéria registral imobiliária, entre os quais destacamos alguns deles, a iniciar pelo da legalidade, cuja idéia nuclear é a de que a validade do registro mantém uma relação lógica com a validade do título, o que não quer dizer, por outro lado, que a validade do título necessariamente impõe validade ao registro.

A par da legalidade destaca-se o princípio da inscrição, cuja idéia central é a de que a constituição, transmissão e desconstituição dos direitos reais sobre imóveis por atos inter vivos só se operam com a publicidade no registro imobiliário. É a publicidade que opera a mutação jurídico-real. Para que o direito, fato ou ato possa ser objeto de publicidade, é necessário que o título esteja prenotado. Estamos falando do princípio da prioridade, cuja idéia é a de assegurar a preferência para o título apresentado em primeiro lugar. Num concurso de títulos que tenham por objeto direitos reais que disputam o mesmo imóvel, o protocolo é decisivo.

No Brasil não adotamos o princípio da fé pública inscritiva, como o Sistema Alemão, apenas a presunção dela. Isto quer dizer, por um lado que, até prova em contrário, o direito real inscrito pertence àquele cujo nome figura no registro como titular do mesmo e, por outro, a despeito da insaneabilidade do registro, o terceiro de boa-fé pode ter o seu direito garantido.

Outro princípio importante é o da especialidade que informa a necessidade da especialização tanto do em, como dos direitos inscritos. Em outras palavras, o direito, para ser inscrito, precisa ser inequívoco e distinto dos demais, assim como o bem imóvel sobre o 3 qual o direito vai recair também precisa estar devidamente individuado, de sorte que não haja dúvidas a respeito de sua localização e perímetro.

O princípio da continuidade é, ao lado da especialidade, outro sustentáculo da segurança jurídica, na medida em que, em relação a cada imóvel individuado, deve existir um encadeamento de titularidades dos direitos reais. Este encadeamento contribui para a segurança jurídica, pois assegura, apenas ao titular do direito, a possibilidade de outorgá-lo. Na função qualificadora o oficial é que faz o controle da disponibilidade subjetiva e objetiva.

A territorialidade é outro princípio importante. Este princípio informa que a legitimidade do titular do Registro de Imóveis e, conseqüentemente do ato registral, vai depender da circunscrição competente estabelecida por força de lei.

Dependerá da provocação da parte interessada a atuação do oficial de registro, é o que preconiza o princípio de instância ou reserva de iniciativa, salvo nas hipóteses em que, por força de lei, pode agir ex officio.

Os conceitos e os princípios juntamente com as regras jurídicas positivas compreendem o instrumental do qual o oficial do Registro de Imóveis se utiliza para levar a bom termo o seu mister. A ação inicial do oficial de registro ocorre quando a parte interessada apresenta o título perante o serviço de Registro de Imóveis.

Esta apresentação pode visar apenas o exame e o cálculo de emolumentos, assim como pode ser apresentado para efeitos de publicidade sem exame prévio. Na primeira hipótese o interesse da parte é tão-somente no sentido de que o título seja examinado para saber se nas condições em que ele se apresenta está apto ou não para ser registrado ou averbado ou, se necessita de providências complementares, e o cálculo de emolumentos. Esta possibilidade está amparada no artigo 12, parágrafo único da Lei dos Registros Públicos. A despeito de não constar na lei, é de boa orientação que a parte interessada faça este pedido por escrito, evitando assim, futuras controvérsias, como por exemplo a alegação do apresentante de que deixou o título para registro e não para simples exame.

Diferentemente, quando o interesse da parte é a imediata publicidade, o título deve ser prenotado nos termos do artigo 182 da Lei dos Registros Públicos. A protocolização do título será o primeiro ato registral feito pelo oficial do Registro de Imóveis e assegurará ao interessado a prioridade do título e, conseqüentemente, a preferência dos direitos reais de acordo com o artigo 186 da mesma Lei.

Após a prenotação do título e a observância da ordem estabelecida, o mesmo passará pelo procedimento de qualificação. É neste momento que o oficial verifica os pressupostos de existência, validade e eficácia do negócio jurídico e os requisitos do título, assim como a necessidade ou não da abertura de matrícula. A qualificação compreende o momento supremo da atuação do registrador público de imóveis quando examina, estuda, aprecia e decide pela registrabilidade ou não do título. A função qualificadora ultrapassa a fronteira de um mero exame a respeito dos elementos extrínsecos e intrínsecos do título. Ao decidir o oficial emite um juízo de valor, que pode ser de admissibilidade ou não do título. A finalidade principal da função qualificadora é a de atribuir certeza, eficácia e segurança jurídica. E para tanto, esta atuação deve ser absolutamente autônoma, independente, sem a menor possibilidade de sofrer interferências externas.4 A função qualificadora decorre de uma análise contingencial do negócio jurídico, razão pela qual trabalha com a razão prática e não a necessária. Busca a certeza contida no título e não a certeza universal ou necessária. A razão prática é precária, passível de questionamento por força de sua contingencialidade, enquanto que a necessária é inquestionável, por se tratar de uma verdade absoluta.

Essa é razão pela qual a função qualificadora é prudencial. Resulta de uma atuação fundada na razão prática, contingencial, momentânea, temporária, que visa à certeza e não ao justo, pois esta última é visada pelo juiz ao julgar o caso concreto. Neste sentido, a função qualificadora se aproxima da função jurisidicional, sem no entanto se confundir com ela. Enquanto que o registrador de imóveis visa à certeza, o juiz visa ao justo.

A natureza da atividade registral imobiliária, a despeito de ser administrativa, não se confunde com a atividade da Administração Pública, predominantemente executória, vinculada ou discricionária, voltada para o interesse público,enquanto que a primeira tem por fim assegurar segurança e eficácia jurídica ao particular de forma imediata, mediatizado pelo interesse público.

Também não se confunde com a atividade jurisdicional, a despeito da ação concreta e contingencial do Juiz, mas que tem por fim o justo. A segurança jurídica está contida no justo, mas nem por isso, se confundem!

O registro não é um mero arquivo de títulos e documentos e a inscrição registral não é um simples ato administrativo. Trata-se de um registro público que tem por atribuição publicizar negócios jurídicos decorrentes de relações jurídicas privadas, de bens do domínio privado e, mesmo quando um dos intervenientes é o Estado, não deve prevalecer seu ius imperii , mas antes figurar em pé de igualdade com os demais cidadãos, nos limites do ordenamento jurídico.

Isto não quer dizer, por outro lado, que os atos praticados pelo Oficial do Registro de Imóveis no exercício da função qualificadora, estejam afastados de qualquer controle. O Brasil adotou o princípio da unicidade de jurisdição consoante dispõe o artigo 5º, XXXV da Constituição Federal, cabendo ao Poder Judiciário apreciar qualquer ameaça ou lesão a Direito.

O juízo emitido pelo oficial pode ser pelo indeferimento ou pelo deferimento do registro ou da averbação. Ocorrendo o primeiro, o registrador deverá informar por escrito as razões pelas quais decidiu pela impossibilidade da publicidade, conforme o artigo 198 da Lei dos Registros Públicos. O apresentante poderá conformar-se ou não com as exigências feitas. Aceitando, a parte interessada deverá providenciar a satisfação das mesmas e reapresentar o título, com a documentação devidamente complementada. Não ocorrendo a aceitação, o caminho poderá ser o da suscitação de dúvida.

A dúvida é um procedimento de natureza administrativa, sem lide, razão pela qual não comporta assistência ou intervenção de terceiros, conforme o artigo 204 da Lei dos Registros Públicos, cuja finalidade é permitir a manifestação do Juiz de Direito a respeito da divergência de entendimentos entre o registrador e o apresentante. 5 Nos termos do artigo 198 da Lei dos Registros Públicos, na hipótese do apresentante do título solicitar a suscitação de dúvida, o que deverá ser feito mediante requerimento ao Oficial do Registro de Imóveis, este deverá anotar à margem da prenotação a ocorrência da dúvida, certificar no título a prenotação e a suscitação de dúvida e, ainda, rubricar todas as folhas.

O Oficial deve elaborar de forma clara e objetiva as razões da dúvida e em seguida dar ciência ao apresentante, fornecendo-lhe cópia e ao mesmo tempo notificá-lo para que a impugne perante o juízo competente, no prazo de quinze dias. O juízo competente é a Direção do Foro no interior e a Vara dos Registros Públicos na capital de acordo com a organização judiciária no Estado do Rio Grande do Sul.

Após a entrega e respectiva notificação do apresentante, o oficial deverá remeter ao juízo competente, mediante carga, as razões da dúvida, acompanhadas do título.

Se o interessado não impugnar a dúvida no prazo legal, mesmo assim, será dirimida pelo juiz. Havendo impugnação, esta deverá ser juntada aos autos e remetida ao Ministério Público para ser ouvido no prazo de dez dias. Se não forem requeridas diligências, o juiz proferirá a decisão no prazo de quinze dias, com base nos elementos constantes dos autos.

Desta decisão, o interessado, o Ministério Público e o terceiro prejudicado poderão interpor Recurso de Apelação, com os efeitos devolutivo e suspensivo o qual será processado e julgado nos termos do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

Transitada em julgado a decisão, o procedimento será o seguinte: se for julgada procedente, a decisão confirma o entendimento do Oficial do Registro de Imóveis. Os documentos serão restituídos à parte, independentemente de traslado e ciência ao Oficial para que consigne no Protocolo, cancelando a prenotação. Caso contrário, julgada improcedente, confirmando o entendimento do interessado, este reapresentará a documentação, com o respectivo mandado, ou certidão da sentença, que ficarão arquivadas, para que, desde logo, seja procedido o registro, com declaração do fato na coluna de anotações do Protocolo.

Feitas estas considerações, a respeito do que pode acontecer na hipótese de indeferimento do registro, passamos agora a trabalhar com a hipótese de deferimento. A qualificação positiva, de deferimento da registrabilidade do título, vai resultar em atos de registro ou de averbação, conforme o caso. De acordo com o artigo 172 da Lei dos Registros Públicos, no Registro de Imóveis serão feitos, nos termos da Lei, o registro e a averbação dos títulos ou atos constitutivos, declaratórios, translativos e extintivos de direitos reais sobre imóveis reconhecidos em lei, inter vivos ou mortis causa quer para sua constituição, transferência e extinção, quer para sua validade em relação a terceiros, quer para sua disponibilidade. 6 O sistema registral imobiliário brasileiro é de certa forma flexível, a despeito de entendimentos em contrário. O artigo 167, em seus incisos I e II arrola exemplificativamente e não taxativamente, atos de registro e de averbação, sem contudo, esgotar as hipóteses, muito menos, proibir atos que não estejam ali previstos.

A despeito de não constar norma expressa dessa flexibilidade para os atos de registro, a interpretação sistemática e o artigo 246 da Lei dos Registros Públicos nos permitem fazer esta leitura. Se o direito material dispõe sobre direitos e/ou interesses que necessitam de publicidade registral no Registro de Imóveis para que se constituam ou produzam efeitos erga omnes, é necessário que o sistema dê guarida, independentemente de norma expressa.

Os atos de registro implicam prévia existência de matrícula do imóvel, nos termos do artigo 227, enquanto que os atos de averbação podem ser feitos na margem das transcrições, pelo que se depreende do artigo 169, inciso I da Lei dos Registros Públicos.

A matrícula no Registro de Imóveis serve de suporte físico e jurídico para todos os lançamentos registrais que devem ser feitos no Livro nº 2. É a base física porque confeccionada em ficha de papel, com os requisitos estabelecidos na Lei dos Registros Públicos (artigos 3º, § 1º e 2º) e a Consolidação Normativa Notarial e Registral da CGJ-RS (artigos 308, 311 a 314) e jurídica, pelo fato de que a matrícula tem como suporte o domínio, ou seja, o direito real de propriedade sobre bem imóvel conforme os artigos 176,§ 1º, I, 227 e 236 da Lei dos Registros Públicos.

A atual Lei dos Registros Públicos alterou a lógica do sistema registral imobiliário ao adotar a matrícula, privilegiando o fólio real em detrimento do fólio pessoal (transcrição). Neste sentido a matrícula passou a ser o núcleo do Registro de Imóveis – sem afetar, entretanto, a essência do ato registral –, pois é a partir desta que agora ocorre a constituição, desconstituição e declaração dos direitos.

O sistema fundado no fólio real, se por um lado prima pela individualização, com a devida especialização geodésica e unitarização do imóvel, por outro, não afirma que o sistema anterior, fundado no fólio pessoal, apresentava uma indeterminação objetiva a respeito dos requisitos identificadores do imóvel.

A matrícula apresenta uma complexidade de elementos extrínsecos ou formais e intrínsecos e substanciais. Os primeiros dizem respeito aos requisitos de formalização, enquanto que os últimos, a respeito da substância matricial. Nos substanciais, aparece com destaque a especialização geodésica, que tem por fim individualizar e especializar o imóvel, tornando-o distinto dos demais. Se por um lado a lei exige dados identificadores e individualizadores do imóvel na matrícula, de outro, não transformou o sistema registral imobiliário num sistema cadastral.

Nesta passagem do sistema de fólio pessoal para o real, a especialização do imóvel é fundamental para a certeza e, conseqüentemente a segurança jurídica visada, de forma imediata pelas partes e mediatamente pela sociedade, a Lei dos Registros7 Públicos dispõe no seu artigo 228, que a matrícula será efetuada por ocasião do primeiro registro a ser lançado na vigência desta Lei, mediante os elementos constantes do título apresentado e do registro anterior nele mencionado.

Conforme já vimos anteriormente, o artigo 225 exige, para a formalização do título a ser registrado, que as partes indiquem com precisão, os elementos identificadores do bem imóvel, que nada mais são do que a especialização do mesmo. Portanto, o oficial do Registro de Imóveis, a rigor, somente poderá abrir a matrícula, desde que devidamente especializado.

Na hipótese de haver divergência entre os elementos identificadores do imóvel que constam no título – por indicação das partes conforme preceitua o artigo 225 – e os elementos que constam no registro anterior, o título é considerado irregular para efeitos de abertura de matrícula, conforme se depreende do § 2º do artigo 225 da Lei dos Registros Públicos.

Para a solução deste impasse, a própria Lei oferece a solução no seu artigo 213, ao dispor sobre os procedimentos para fins de retificação do registro imobiliário, no sentido de adequá-lo à realidade fática e jurídica.

Se por um lado a lei impõe a especialização do imóvel de outro não permite o ingresso no Registro Imobiliário de título cujo teor a respeito da identificação do imóvel não esteja perfeitamente sintonizado com os dados identificadores do imóvel no registro.

Assim não há alternativa diversa da prevista no §2º do artigo 213 da Lei dos Registros Públicos, para efeitos de retificação e implementação de dados que especializem o imóvel no registro, para fins de matriculação, salvo nas hipóteses de mera implementação de dados que não colocam em risco direitos de terceiros, como por exemplo a inclusão de quarteirão de imóvel urbano, o que poderá ser feito mediante requerimento assinado, com firma reconhecida e instruído com certidão do cadastro imobiliário da Prefeitura Municipal.

Para se chegar a esta conclusão deve ser construída uma exegese sistêmica e hierarquizada, fundada na principiologia que informa e conforma o Direito e não a partir de artigos de leis isolados, desconexos.

Ao adotar o fólio real em oposição ao fólio pessoal, a finalidade da atual Lei dos Registros Públicos é a de valorizar ao extremo a especialização do bem sobre o qual vão recair os direitos reais, para efeitos de autenticidade, segurança e eficácia jurídica. Por essa razão é necessário trabalhar com a idéia de que toda a principiologia que informa o sistema registral imobiliário brasileiro deve ser interpretada de forma sistematizada e hierarquizada, em função de sua finalidade.

Se por um lado a matrícula, contemplada no Livro nº 2, é considerada a base jurídica para o lançamento dos atos de registro e averbação, não é exclusiva. Além dela, existe o Livro nº 3 – Registro Auxiliar, que serve para o lançamento de atos de registro, que sendo atribuídos ao Registro de Imóveis por disposição legal, não digam respeito diretamente ao imóvel matriculado, consoante os artigos 177 e 178 da Lei dos Registros Públicos. Além dos atos de registro, podem ser feitos atos de averbação que tenham relação com o ato de registro. 8 Além do Livro nº 2 – Registro Geral e o Livro nº 3- Registro Auxiliar, a Lei dos Registros Públicos dispõe no seu artigo 173 a relação dos demais livros competentes.

A inauguração da publicidade registral ocorre com o lançamento do título no Livro nº 1 de Protocolo. A prenotação assegura o direito de preferência na hipótese de haver concorrência de dois ou mais títulos em relação ao mesmo direito real. Além disso, é pressuposto de validade para os atos a serem praticados pelo registrador.

O livro nº 4, denominado de Indicador Real, destina-se ao repositório de todos os imóveis que figurarem nos demais livros, devendo conter a identificação individualizada de cada imóvel, em cuja folha serão anotados os números de ordem dos outros livros e outras que eventualmente se fizerem necessárias. Este livro permite a busca dos registros pela localização do imóvel.

Já o livro nº 5, denominado de Indicador Pessoal, destina-se ao repositório dos nomes de todas as pessoas que, individual ou coletivamente, ativa ou passivamente, direta ou indiretamente, figurarem nos demais livros, em cuja folha deve ser anotada a referência aos números de ordem daqueles. Permite a busca dos registros pelo nome da pessoa.

Além dos contemplados pela Lei dos Registros Públicos, no Registro de Imóveis deve existir livro de cadastro de estrangeiros nos termos do artigo 10 da Lei federal nº 5.709/71 e, ainda o livro de receita e despesas exigido pela Secretaria da Receita Federal.

A responsabilidade pela escrituração dos atos registrais nos livros e a conservação destes é do Oficial do Registro de Imóveis, sendo vedada a saída dos mesmos do local onde funciona o serviço de registro de imóveis, salvo mediante autorização judicial de acordo com o artigo 22 da Lei dos Registros Públicos.

O Registro de Imóveis enquanto instituição, que tem por fim assegurar a publicidade, segurança e eficácia jurídica de uma parcela dos direitos reais e pessoais; assim como a atividade registral enquanto meio, para atingir tal fim, passam por um momento crítico. Essa crise, entretanto, pode ser o combustível para o aperfeiçoamento com vistas à construção de um Registro de Imóveis credível, onde a especialização do imóvel na matrícula seja, efetivamente, o reflexo da realidade fática os direitos constituídos e declarados vão além da presunção e o serviço seja prestado de forma eficiente, célere e seguro.

Esta credibilidade precisa ser construída a partir do sistema que já temos, a partir do aperfeiçoamento da legislação, da construção hermenêutica que passa, não apenas pelo oficial do Registro de Imóveis, mas por todos as instituições como o Notariado, Magistratura, Ministério Público e os operadores jurídicos de um modo geral, cujos atos têm ingresso no Registro de Imóveis.
Luiz Egon Richter1

Introdução 1. A complexidade atual e seus desafios 2. Da retificação no Registro de Imóveis 3. Do procedimento retificatório administrativo 4. Dos requisitos do procedimento de retificação administrativa. 5. Das fases do procedimento administrativo retificatório 6. Dos princípios informadores do procedimento de retificação administrativa 7. Da autonomia funcional do registrador público de imóveis 8. Da decisão 9. Conclusões 10. Referência bibliográficas

Introdução

Vive-se numa época em que a vida é reproduzida por meio de um emaranhado de relações cada vez mais complexas, o que requer cada vez mais segurança. O Estado, por meio de seus órgãos e agentes, a cada dia que passa, enfrenta mais dificuldades para dar segurança jurídica e compor os conflitos. A sociedade democrática, aberta, por excelência, de um lado produz relações conflituosas e, de outro, procura construir soluções para a resolução de seus conflitos. O Estado deixou de tutelar a sociedade, para se transformar em instrumento dela. Os direitos e interesses privados devem ser respeitados, afastando o paradigma de que o interesse público é sinônimo de interesse do Estado, com pressuposição da sobreposição do público em relação ao privado. O Direito deixou de ter como fonte única, o Estado. Este forma parcerias, concede, permite e autoriza a execução de serviços públicos em favor de empresas privadas, utiliza instituições como os registros públicos e os serviços notariais para prevenir conflitos e estabilizar expectativas.

Neste contexto procurar-se-á fazer uma abordagem hermenêuticadescritiva a respeito da temática que contempla o procedimento de retificação administrativa de registro de imóveis, executado no âmbito do próprio registro de imóveis, não como ato registral, mas como processo que pode ou não reconhecer a versão apresentada como representativa do fato. O que até bem pouco tempo era de competência exclusiva do Poder Judiciário, a partir da Lei federal n.º 10.931/04 que alterou, entre outros, o artigo 213 da Lei dos Registros Públicos, passou a ser compartilhada com o Registro de Imóveis.

Esta nova atribuição do registrador público de imóveis, norteada pelos princípios que informam o sistema registral imobiliário brasileiro, requer a construção de uma nova procedimentalização para as retificações no Registro de Imóveis. Não se trata, pura e simplesmente, de um compartilhamento de 1 Registrador Público Substituto do Registro de Imóveis de Lajeado e professor de Direito Administrativo e Registros Públicos da Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC. competência entre o Poder Judiciário e o Registro de Imóveis. Trata-se de um novo instrumento para o aperfeiçoamento do sistema registral imobiliário. Propõe-se, para tanto, algumas reflexões prévias a respeito do momento em que vivemos, as conseqüências do alto grau de complexidade e contingencialidade que a vida em sociedade apresenta. Por complexidade entende-se a defasagem existente entre a multiplicidade de possibilidades oferecidas e a possibilidade de serem realizadas, enquanto que a contingência compreende o perigo do desapontamento, da frustração. A seguir abordar-se-á a retificação como um instrumento de aperfeiçoamento do sistema registral imobiliário brasileiro, seus sujeitos, objeto e finalidades e logo a após, tratar-se-á do procedimento de retificação administrativa no âmbito do registro de Imóveis.

Tem-se como importante, também, considerações e reflexões a respeito dos requisitos, das fases e dos princípios informativos do procedimento retificatório. Todo procedimento deve satisfazer um mínimo de requisitos para ser considerado válido. Além disso, devem ser observadas as fases a que o procedimento está sujeito, assim como a principiologia que o informa e o orienta. Far-se-á, também, algumas considerações acerca da autonomia funcional do registrador público de imóveis, no exercício da jurisdição voluntária. Assim como a autonomia é imprescindível para o exercício da atividade registral, é imperiosa para conduzir o procedimento de retificação. E, por fim, serão arroladas as principais conclusões, resultantes do trabalho desenvolvido, deixando muito claro que são transitórias, logo, não definitivas, em razão da novidade do assunto e da necessidade de um maior aprofundamento.

1. A complexidade atual e seus desafios

Foi-se a época da visão linear e hierárquica, das racionalizações simplistas, fórmulas simplificadoras e regramentos rígidos e fechados. Vivemos num mundo multidimensional. Esta é a nova configuração do mundo, a complexidade, que de um lado aceita a multiplicidade, a aleatoriedade, a contingencialidade e a incerteza e, de outro, busca compreender estes fenômenos e construir soluções, com fundamento no pensamento complexo.

O pensar complexo é um pensar sistêmico aberto, flexível e abrangente. É a superação do modelo mental cartesiano. Do ponto de vista linear, a terra é plana. De uma perspectiva sistêmica, ela é redonda e, do ângulo do pensamento complexo, ela é ao mesmo tempo plana e redonda. Mas o que a complexidade tem a ver com a retificação administrativa? Antes de mais nada, é importante não esquecer que os registros públicos, assim como as atividades notariais, são instituições pré-jurídicas. Nasceram no âmbito da sociedade com a finalidade de dar segurança. Portanto, são instituições voltadas à sociedade.

Por estarem voltadas à sociedade, dialogam com ela. Todo diálogo pressupõe uma linguagem. Os registros públicos, assim como a atividade notarial, possuem uma linguagem toda especial com a sociedade. Cumprem uma função social, que é a de prevenir conflitos. São instrumentos de viabilização da cidadania!

Quanto maior o grau de complexidade que uma sociedade apresenta, maior é a necessidade de estabilização de suas expectativas. A multiplicidade de possibilidades aumenta o potencial de riscos, por força da contingencialidade das decisões. Cada decisão poderia ter sido tomada de forma diferente. Isto faz com que ser criem expectativas sobre expectativas.

Transportando esta idéia de complexidade para o Registro de Imóveis, pode-se afirmar o seguinte: do ponto de vista linear, o Registro de Imóveis é uma instituição onde são publicizados atos jurídicos relativos a direitos que recaem sobre bens móveis e os sujeitos a eles relacionados; do ponto de vista sistêmico, o Registro de Imóveis é uma instituição que integra o arcabouço organizacional do Estado, que tem por fim atribuir certeza jurídica aos direitos inscritos e, do ângulo do pensamento complexo, o Registro de Imóveis é uma instituição de publicização de direitos, que integra o arcabouço organizacional do Estado, certificadora de segurança jurídica.

Embora entenda-se que o pensamento complexo é uma das ferramentas que o registrador público de imóveis deve utilizar para a compreensão dos fenômenos jurídico-sociais e, conseqüentemente, desempenhar com maior eficiência o seu mister, não é objeto deste trabalho enfrentar a questão, razão pela qual, procurarse-á desenvolver a temática proposta. Tangenciando o tema da complexidade com a retificação, dois princípios importantes do pensamento complexo podem informar a retificação de registro imobiliário: um deles preconiza que uma parte só pode ser definida como tal em relação ao todo e, o outro, que nunca se pode fazer uma coisa isolada.

É sabido que um imóvel, para efeitos de direito, compreende a área superficial e os seus contornos, em última análise, a sua configuração geodésica. Entretanto, ele está ligado fisicamente a outros imóveis. Logo, à retificação dos contornos de um imóvel, feita isoladamente, poderá, em tese, levar a sobreposição de imóveis, o que é vedado no plano jurídico dos direitos, considerando que um direito de propriedade exclui o outro, assim como no plano fático não existe a menor possibilidade de um imóvel estar sobreposto a outro. É consabido, também, “que soluções imediatistas podem provocar problemas ainda maiores do que aqueles que estamos tentando resolver”, logo, provocar frustrações em vez de certeza. “Que o imediatismo e a inflexibilidade são os primeiros passos para o subdesenvolvimento, seja ele pessoal, grupal ou cultural”.

2. A sociedade contemporânea é marcada fortemente pela complexidade, por conta do grande número de possibilidades e expectativas que produz. As expectativas decorrem das tomadas de decisões que são sempre contingências diante das indeterminações que se apresentam.

A sociedade moderna é caracterizada pela sua grande capacidade de controlar as indeterminações. A, assim, de produzi-las. Este paradoxo acrescente a necessidade de proteção e de segurança. É a necessidade de agir para que as indeterminações não adquiriram valor de estrutura: a necessidade de evitar que o desvio se estabilize. Digamos que é a necessidade de evitar aquela normalidade de grau inferior, que flui por debaixo da normalidade que conhecemos quando a razão está em sintonia com o tempo. Esta normalidade de grau inferior produz insegurança.

3. Busca-se, com a retificação, segurança jurídica! Esta é a finalidade maior. Necessita-se de um instrumental jurídico capaz de estabilizar as expectativas que podem decorrer de indeterminações. Não é saudável para o sistema protetivo da propriedade imobiliária, que as expectativas se instabilizem, razão pela qual, busca-se segurança. Mas o que vem a ser segurança jurídica?

Segurança – ato ou efeito de segurar, estado, qualidade ou condição de seguro, condição daquele ou daquilo que se pode confiar (Aurélio).

Jurídico – relativo ou pertencente ao direito, conforme aos princípios do direito; lícito, legal. (Aurélio)

Segurança jurídica: é o efeito decorrente de lei ou ação em favor de ato ou fato jurídico.

No plano formal – a segurança jurídica é assegurada pelos princípios da(do): irretroatividade da lei, coisa julgada, respeito aos direitos adquiridos, respeito ao ato jurídico perfeito, outorga de ampla defesa e contraditório aos acusados em geral, ficção do conhecimento obrigatório da lei, prévia e geral para a configuração de crimes e transgressões e cominação de penas, declarações de direitos e garantias individuais, devido processo legal, independência do Poder Judiciário e

2 MARIOTTI, Humberto. As paixões do ego: complexidade, política e solidariedade. São Paulo: Editora Palas Athena, 2000, passim.

3 DI GIORGI, Rafaele. O risco na sociedade contemporânea. Revista Seqüência Ano 15, n.º 28, jun/94, p.49 do Ministério Público, vedação de tribunais de exceção, vedação de julgamentos parciais, etc...

No plano material – a segurança jurídica é assegurada pela ação desenvolvida pelo próprio Estado, por meio dos órgãos competentes e por entidades e instituições como por exemplo: Conselhos Tutelares, Procons, Câmaras de Arbitragem e Mediação, Juntas Comerciais, Registros Públicos, etc...

O Direito, enquanto sistema social da sociedade moderna, tem a função precípua de regrar as condutas humanas por meio de uma estabilização das expectativas que um indivíduo possa ter em relação ao comportamento dos outros, visando dar segurança.

Expectativas cognitivas – frustrações e desapontamentos acarretam a modificação de expectativas. É o caso das experiências científicas.

Espécies básicas de expectativas: Expectativas normativas – frustrações e desapontamentos não acarretam a modificação de expectativas, mas a reprovação social em relação ao indivíduo que desapontou as expectativas dos outros quanto ao seu comportamento. Ou seja, o fato delituoso não modifica a expectativa em relação ao Direito.

O papel principal do Direito é evitar frustrações decorrentes de expectativas comportamentais e do Registro de Imóveis, em particular, evitar frustrações relacionadas aos direitos e fatos publicizados. A retificação é um instrumento para o aperfeiçoamento do sistema registral, com a finalidade de suprir omissões, corrigir imprecisões e restabelecer a verdade, logo, estabilizar expectativas em relação à segurança estática e dinâmica. Por segurança estática, entende-se a certeza representada pela especialização do objeto, ou seja, os elementos representantativos que figuram na transcrição ou na matrícula mantêm relação de verdade com a situação fática; enquanto que por segurança dinâmica, entende-se a certeza do direito inscrito, que permite o tráfico seguro dos bens.

2. Da retificação no Registro de Imóveis Todo o sujeito que possui legitimidade em relação a direito ou fato inscrito, que apresenta omissão, imprecisão ou inverdade, pode pedir a retificação, desde que utilize os meios adequados. Este princípio está em consonância com o sistema registral imobiliário pátrio, fundada no princípio da presunção juris tantum.

Retificar é, em certo sentido, ordenar, que é o mesmo que tornar reto4; mas tornar reto, no sentido de um objetivo: suprir omissão, corrigir imprecisão, ou ainda, enunciar a verdade inscricional ou fática. O Registro de Imóveis trabalha, basicamente, em dois planos: o da formalização (direitos) – verdade extra e endorregistral – e o da representação (fatos) – verdade extra-registral.

Na hipótese de omissão, imprecisão ou inverdade no plano da formalização, a retificação atinge o direito inscrito. Já se for em relação à representação, a retificação se restringirá a fatos. A primeira, forçosamente, dar-se-á em juízo ou por meio de retificação do título, enquanto que a segunda, poderá ser feita em juízo ou administrativamente, perante o Registro de Imóveis.

O fim da retificação é a certeza dos bens jurídicos, para o qual está preordenado o Registro de Imóveis. Este fim se materializa por meio de um processo, que genericamente é denominado de retificação de Registro de Imóveis.

O que interessa, entretanto, é a retificação administrativa representativa fática, encaminhada ao oficial do Registro de Imóveis, nos termos do artigo 213 da Lei dos Registros públicos, com a redação dada pela Lei federal n.º 10.931/2004.

3. Do procedimento retificatório administrativo Com o advento da Lei federal n.º 10.931/2004, o artigo 213 da Lei dos Registros Públicos passa a facultar aos interessados o pedido de retificação de elementos extra-registrais, representativo de fatos, perante o próprio oficial do Registro de Imóveis, ao invés de propor ação retificativa perante o Poder Judiciário.

É uma inovação importante na seara registral imobiliária brasileira, adicionando ao rol de atividades do registrador público de imóveis, uma atividade até então estranha, pois competia, exclusivamente, ao Juiz de Direito, ressalvadas as retificações por erro evidente.

Age o oficial do registro, não na condição estrita de registrador, mas dentro de uma jurisdição ampliada, ainda que prudente, porém não no exercício da prática de atos de direito registral, mas de jurisdição voluntária, ainda que administrativa.

4 Dip. Ricardo. Registro de Imóveis (vários estudos), Porto Alegre: IRIB: Sérgio Antonio Fabris ed. 2005, p.280 Assim, como o juiz de direito não pratica tão-somente atos de natureza jurisdicional, também o oficial do Registro de Imóveis não se restringe à prática apenas atos de publicidade registral.

Com isto passa a atuar, também, na seara processual. Ele conduz o processo! É o diretor do processo. É dele a responsabilidade pela condução eficaz e eficiente. Trata-se de um processo que se instaura a pedido do interessado, instruído com a documentação pertinente, de acordo com a necessidade existente de suprimento de omissão, correção de imprecisão ou o restabelecimento da verdade. Trata-se de processo ou procedimento? O artigo 212 da Lei dos Registros Públicos, com a redação dada pela Lei federal n.º 10.931/2004, refere expressamente que a requerimento do interessado, por meio do procedimento administrativo previsto no artigo 213, facultado ao interessado requerer a retificação por meio de procedimento judicial. Adotou, portanto, o legislador a denominação procedimento. Tanto a legislação, como a doutrina pátria, não chegaram a um consenso a respeito da terminologia adequada. Utiliza-se, indistintamente, processo ou procedimento para definir “uma sucessão itinerária e encadeada de atos administrativos que tendem, todos, a um resultado final e conclusivo”5 De acordo com Mello6, apud Perez, são os seguintes os requisitos:a) cada ato possua autonomia relativa, que significa uma finalidade específica como a defesa no caso de um depoimento; b) todos os atos possuam conexão entre si, tendo em vista os fins do processo e c) haja relação de causalidade entre os atos, pelo que sua seqüência não pode ser alterada, pois constituí expressão da lógica finalística do processo.

Propõe-se aqui a denominação procedimento administrativo retificatório, em homenagem à lei instituidora, que de forma expressa distinguiu o procedimento administrativo do jurisdicional. Além disso, o nomem júris processo é reservado para os casos contenciosos, em que há um julgamento administrativo.7 O procedimento administrativo pode servir de instrumento de viabilização da cidadania.

Embora seja um procedimento administrativo, não se confunde com os processos administrativos ordinários, como por exemplo: o disciplinar e o tributário, em que o Estado, por meio da Administração Pública é, ao mesmo tempo, parte e juiz. Não se trata de hipótese de juiz administrador, embora juízo de natureza administrativa.

5 Mello, Op. Cit. pp.453/454

6 Op. Cit. P.459

7 Mello, Op. Cit. p./454 Trata-se de um procedimento de jurisdição voluntária, ainda que executado por autoridade estranha ao Poder Judiciário, considerando a condição atual dos registradores públicos e notários, estabelecida pelo artigo 236 da CF e a Lei federal n.º 8.935/94. Por meio da jurisdição voluntária, o interessado busca a legitimação de um interesse seu, que necessita, por disposição legal, da interveniência de autoridade com poderes jurisdicionais. Não há litígio, há apenas interesses privados que necessitam da intervenção estatal, para efeitos de assistência protetiva.

No caso das retificações administrativas de elementos representativos da verdade extra-registral, o interessado busca a proteção do seu direito, via de regra, o de propriedade. A verdade representativa do objeto, sobre o qual recai o direito de propriedade, fortalece o direito de propriedade do interessado, no que diz respeito aos aspectos qualitativo e quantitativo.

O fortalecimento do direito de propriedade se dá pela certeza, pela determinação do objeto sobre o qual recai o direito. Um direito que recai sobre um objeto indeterminado, equivocado é um direito defasado de segurança, o que pode causar frustrações.

Embora o Código Civil atribua, nos parágrafos 1º e 2º , do artigo 1245, a presunção juris tantum do direito de propriedade ao titular do direito inscrito, inegavelmente a identidade do objeto sobre o qual recai o direito não pode ser desprezada.

A introdução do fólio real, ou seja, a matrícula, na sistemática registral imobiliária brasileira valorizou a identificação do imóvel. Tanto é, que o artigo 225 da Lei dos Registros Públicos expressamente impõe aos tabeliães, escrivães e juízes a obrigação de exigirem das partes que estas indiquem, com precisão, os característicos, as confrontações e as localizações dos imóveis, para efeitos de formalização dos títulos. Providência imprescindível para a formalização dos títulos causais apresentados para registro na vigência da atual Lei dos registros Públicos. Na passagem do sistema da transcrição para a matrícula, valorizou-se a configuração geodésica e a amarração geográfica do imóvel, de sorte a torná-lo inequívoco em relação aos demais.

O parágrafo primeiro do inciso II, do artigo 213 da Lei dos Registros Públicos, com a redação atual, refere que somente após atendidos os requisitos do artigo 225, é que o oficial do Registro de Imóveis poderá averbar a retificação. Isto quer dizer que o procedimento retificatório deverá contemplar a idéia de precisão na caracterização do imóvel.

Existem normas de ordem técnica que orientam o levantamento e a descrição dos imóveis. É o caso da NBR 13.133 que dispõe a respeito da execução do levantamento topográfico e os dados e requisitos que o profissional responsável precisa saber.

Um imóvel, para efeitos jurídicos, em especial para matriculação no Registro de Imóveis, caracteriza-se como uma porção do espaço terrestre, contínuo, devidamente especializado, com área superficial, configuração geodésica e amarração geográfica.

Assim, o requisito registral da especialização do imóvel, vertido no fraseado clássico do direito, significa a sua descrição como corpo certo, a sua representação escrita como individualidade autônoma, com o seu modo de ser físico, que o torna inconfundível e, portanto, heterogênio em relação a qualquer outro. O corpo certo imobiliário ocupa um lugar determinado no espaço, que é o abrangido por seu contorno, dentro do qual se pode encontrar maior ou menor área, contanto que não sejam ultrapassadas as reais definidoras da entidade territorial.

8 Além da retificação que tenha por objeto inserção ou alteração de medidas perimetrais, com ou sem aumento de área superficial, há previsão no inciso I, do artigo 213, que determinadas retificações, que não trazem prejuízo a terceiros, poderão ser feitas a requerimento ou de ofício pelo oficial, por tratarem de: omissão ou erro cometido na transposição de qualquer elemento do título; indicação ou atualização de confrontação; alteração de denominação de logradouro público, comprovada por documento oficial; retificação que vise a indicação de rumos, ângulos de deflexão ou inserção de coordenadas georeferenciadas, em que não haja alteração das medidas perimetrais; alteração ou inserção que resulte de mero cálculo matemático feito a partir das medidas perimetrais constantes do registro; reprodução de descrição de linha divisória de imóvel confrontante que já tenha sido objeto de retificação e inserção ou modificação dos dados de qualificação pessoal das partes, comprovada por documentos oficiais, ou mediante despacho judicial quando houver necessidade de produção de outras provas.

4. Dos requisitos do procedimento de retificação administrativa.

A Lei dos Registros Públicos, em especial o artigo 213, dispõe a respeito de alguns requisitos de natureza processual, mas não esgota o assunto, o que leva a um diálogo com o Código de Processo Civil. Embora o processo de retificação seja voluntário, pode, em tese, ferir direitos de terceiros, o que aumenta a responsabilidade do Oficial do Registro de Imóveis na condução do procedimento.

8 CARVALHO, Afrânio de. Registro de Imóveis, 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p.206 Justamente para evitar efeitos danosos aos direitos de terceiros é que se impõe uma processualística capaz de dar garantias tanto ao interessado que pede jurisdição, como ao terceiro que pode sofrer conseqüências. Daí a razão para que haja a manifestação dos proprietários ou ocupantes lindeiros.

Se a legislação referida não apresenta um instrumental suficiente, busca-se, supletivamente, no Código de Processo Civil, elementos capazes de permitir um processo eficaz e eficiente. É sabido que os processos administrativos, em geral, podem se socorrer da legislação processual de forma subsidiária. Com maior razão, a retificação, por tratar-se de jurisdição voluntária.

Não há a intenção de transformar o procedimento de retificação administrativa em processo judicial, mas não se pode perder de vista a segurança jurídica, que é a grande norteadora de todo pedido de retificação. Assim a legitimidade de pedir não pode se afastar do disposto no artigo 3º do CPC, como a capacidade processual também não pode afastar o disposto no artigo 7º do CPC. A representação ativa e passiva deve observar o disposto no artigo 12 do CPC.

A possibilidade jurídica do pedido é relevante e cabe ao oficial do Registro de Imóveis fazer o juízo de admissibilidade do pedido. Para ser aceito é necessário que o pedido esteja rigorosamente de acordo com as possibilidades previstas no artigo 212 da Lei dos Registros Públicos, ou seja, nas hipóteses em que o registro ou a averbação for omissa, imprecisa ou não exprimir a verdade, no que diz respeito a aspectos fáticos.

Embora o pedido de retificação administrativa não seja uma ação fundada em direito real, inegavelmente traz reflexos ao direito de propriedade, inclusive com possibilidade de alteração qualitativa ou quantitativa do objeto sobre o qual recai o direito de propriedade, razão pela qual, entende-se necessário o consentimento do cônjuge, de acordo com artigo 10 CPC.

Enquanto que no procedimento retificatório de jurisdição voluntária judicial o Ministério Público participa como fiscal da lei – artigo 1105 CPC –, no procedimento retificatório administrativo não há previsão legal neste sentido, o que eleva a responsabilidade do oficial. Ressalve-se, entretanto, a hipótese de retificação em que estiver em jogo interesse de incapaz, nos termos do artigo 82, I do CPC e se houver impugnação fundamentada nos termos do § 6º do artigo 213, II da Lei dos Registros Públicos.

O inciso II do artigo 213 da Lei dos Registros Públicos dispõe a respeito do objeto a ser retificado, ou seja, inserção ou alteração de medida perimetral de que resulte, ou não, alteração de área. Sempre que o pedido for no sentido de inserir ou alterar medida perimetral, independentemente de alterar ou não a área superficial do imóvel, o rito processual é o da retificação administrativa.

O pedido deverá estar instruído com provas, capazes de permitir um juízo de convicção do registrador público de imóveis. Não basta a simples alegação do interessado, é necessária a comprovação das alegações, o que poderá ser feito mediante cópia de mapas, memoriais descritivos, fotografias.

A convicção formada pelo registrador público, a partir das provas apresentadas, deve afastar o máximo possível equívocos que possam prejudicar a representação do imóvel na matrícula ou transcrição. O interessado busca, por meio de elementos comprobatórios objetivos, levar para dentro do Registro de Imóveis, uma versão representativa da situação fática do imóvel.

É a chamada verdade extra-registral. É uma verdade representada, logo, o oficial do registro não pode aceitar uma simples versão do fato. Embora o profissional responsável pelo levantamento topográfico que instrui o pedido tenha responsabilidade, ela não afasta a responsabilidade do Oficial que recebe, autua, dirige e decide a respeito.

Pelo nosso sistema registrário imobiliário, o controle da disponibilidade quantitativa e qualitativa é feito pelo oficial do Registro de Imóveis. Este controle não se dá apenas nas hipóteses de alienações ou publicidade de gravames, mas também nas retificações.

Não pode o Oficial permitir retificação que assinala sobreposição de imóveis. Isso traria insegurança e não a segurança desejada. Embora não sendo parte interessada no processo, razão pela qual não poderia impugnar, deve denegar pedido que possa colocar em risco direito de terceiro, mesmo que indiretamente, considerando que a retificação administrativa trata apenas de fatos.

O parágrafo 6º, inciso II, do artigo 213 prevê a possibilidade de transação para se chegar a um acordo entre os lindeiros, com ou sem mediação do Oficial, justamente para evitar a sobreposição. Na hipótese de acordo, expresso em documento, entre o interessado e o proprietário do imóvel lindeiro, com alteração da linha divisória representativa do imóvel pertencente ao último, o Oficial poderá, de ofício, fazer a retificação no registro, com fundamento no inciso I, letra”f” do mesmo artigo.

A inserção da distância da esquina mais próxima também poderá implicar sobreposição de imóveis, razão pela qual, deverá haver a concordância expressa ou a notificação nos termos dos parágrafos 2º, 3º e 4º do inciso II, do artigo 213 da Lei dos Registros Públicos.

Na hipótese de registro de imóvel lindeiro ou que está situado entre o imóvel retificando e a rua que forma esquina não contemplar as medidas perimetrais, a concordância com o pedido ou o silêncio após a notificação fazem presumir a anuência com o pedido, autorizando o Oficial a proceder a retificação, tanto no registro do imóvel retificando, como naquele que não contemplava as medidas.

A jurisdição do registrador público de imóveis é limitada. Embora tenha a mesma competência para processar e julgar o pedido de retificação, escapa-lhe a competência para legitimar pedido de usucapião. Por meio da retificação, corrigese algo que não está correto, enquanto que por meio da ação de usucapião busca-se o reconhecimento do domínio.

O Oficial não pode deferir pedido de retificação quando os elementos objetivos de prova sinalizam para hipótese de usucapião. Nem toda alteração de medida perimetral é hipótese de retificação. Veja-se a seguinte hipótese: terreno urbano mede 12,00 x 30,00 metros, com ângulos retos, totalizando 360,00 metros. Na transcrição ou matrícula constam estas medidas e a área superficial. É apresentado um pedido, em que o requerente alega que o terreno mede 12,00 x 33,00 metros, totalizando 396,00 metros. Trata-se de usucapião de uma faixa de 12,00 x 3,00 metros e não hipótese de retificação.

A letra “d” do inciso I do artigo 213 dispõe que a retificação com indicação de rumos, ângulos de deflexão ou inserção de coordenadas georeferenciadas, em que não haja alteração das medidas perimetrais, pode ser feita de ofício ou a requerimento do interessado, sem a necessidade do processo previsto no inciso II.

Entretanto, a indicação de rumos, ângulos de deflexão ou mesmo coordenadas, poderá provocar sobreposição de imóveis. Neste caso, deve-se exigir a concordância dos lindeiros.

Estes exemplos demonstram que o registrador não pode simplesmente se ater à literalidade da lei. Precisa fazer uma interpretação sistêmica da Lei dos Registros Públicos em sintonia com o ordenamento jurídico e a principiologia que o informa. A seguir abordar-se-ão alguns princípios informadores.

5. Das fases do procedimento administrativo retificatório

O procedimento apresenta basicamente três fases. A primeira é a propulsória, também denominada de iniciativa. É a primeira, que se dá por iniciativa do interessado. É por meio de petição que deve atender no mínimo os seguintes requisitos: indicar o serviço de registro de imóveis ao qual o pedido retificatório é dirigido; o(s) nome(s) e qualificação do(s) requerente(s); o pedido e suas especificações; a documentação comprobatória (mapa, memorial descritivo, anotação de responsabilidade técnica-ART, fotografias, etc...); o requerimento para citação de proprietários ou ocupantes lindeiros que não assinaram o mapa ou declaração. O Poder Público, quando necessário, deve ser notificado de ofício.

A segunda fase compreende a qualificação do pedido e da documentação apresentada. É o momento em que o oficial analisará o pedido e a documentação apresentada. Além de analisar a coerência formal da documentação, deverá também confrontar com os elementos identificadores dos imóveis lindeiros, visando a afastar qualquer possibilidade de sobreposição. É possível que, após a qualificação inicial, o oficial requeira a apresentação de outros documentos que se façam necessários ou até mesmo esclarecimentos por parte do interessado ou do profissional responsável pelo levantamento. E, se for o caso, novos documentos poderão ser juntados aos que se encontram no processo.

Não havendo exigências a serem feitas, notificar-se-ão os órgãos públicos, na hipótese de o imóvel retificando confrontar-se com bens públicos. Se o bem público for municipal, a notificação é endereçada à municipalidade. Se o bem público for estadual, a notificação é feita à Procuradoria-Geral do Estado e, se for federal, a notificação far-se-á para a Advocacia-Geral da União. Não havendo impugnação ou exigências dos órgãos públicos, será então proferida a decisão.

A terceira e última fase é a da decisão. Se o oficial formou um juízo de convicção a respeito do pedido e das provas apresentadas, deferirá ou não o pedido, cuja decisão deverá ser motivada. A motivação, é a descrição dos motivos de fato e de direito que ampararam a decisão.

6. Dos princípios informadores do procedimento de retificação administrativa

A lei deixou de ser vista como sinônimo do Direito. Este vai muito além, à medida que compreende também um conjunto de princípios e valores sintonizados com os desejos e interesses da sociedade. Desponta à época do pós-positivismo 9, da hermenêutica de princípios 10, entre outras denominações atribuídas ao direito contemporâneo.

Neste contexto, ocorre uma inversão da lógica predominante até bem pouco tempo, que era a da forma predominar sobre o conteúdo. Atualmente, o conteúdo é que se sobrepõe a forma. Isto quer dizer que os princípios e valores contidos na ordem jurídica é que dão conteúdo e, conseqüentemente, legitimidade para os atos. No confronto entre uma lei que não esteja sintonizada com os princípios e valores norteadores da ordem jurídica e um princípio identificado com a ordem jurídica, prevalece o último.

9 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, 9ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p.7

10 COLEHO, Inocêncio Mártires. Interpretação constitucional. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 87 Princípios e regras jurídicas – leis – são elementos do Direito. O Direito é composto por regras, princípios, valores e institutos. Os princípios têm como uma de suas finalidades atribuir unidade e coerência ao sistema jurídico. Os princípios são proposições abstratas inferidas de leis, enquanto que as leis são inferidas de fatos.

11 A seguir arrolam-se alguns princípios norteadores dos processos e procedimentos administrativos. Tem-se que o procedimento retificatório administrativo é uma espécie do gênero procedimento administrativo, que a despeito de suas peculiaridades, é permeado pela principiologia processual.

Num primeiro momento arrolar-se-ão princípios de natureza constitucional, asseguradores dos direitos e garantias do cidadão. Por se tratar de um pedido com intervenção de agente público, é necessário que o sistema jurídico assegure a devida segurança nos termos do artigo 5.º, LV, da CF.

Princípio da acessibilidade aos elementos do procedimento retificatório – preconiza que o interessado na retificação tem o direito assegurado ao exame de toda a documentação acostada, assim como os pronunciamentos do oficial na condução do procedimento.

Princípio da motivação – todas as decisões proferidas no procedimento retificatório devem estar motivadas. Por motivação entende-se a descrição dos motivos de fato e de direito que autorizam a decisão proferida. A motivação é imprescindível para que seja possível o controle jurisdicional do ato.

Princípio da ampla instrução probatória – preconiza que o interessado possui o direito de produzir todas as provas necessárias para comprovar a representação descritiva do imóvel no registro de imóveis.

Princípio da audiência do interessado – o interessado tem o direito de ser ouvido a respeito de seu pedido. Na hipótese de haver impugnação, uma audiência de transação mediada pelo oficial do registro de imóveis poderá ser decisiva para a solução do impasse.

Princípio da representação – preconiza que o interessado pode ser assistido por advogado. Embora não seja necessário, em razão da natureza administrativa, é sempre oportuna a representação de um advogado. O fato de ser um procedimento administrativo, não que dizer que não apresenta um certo grau de complexidade, que muitas vezes extrapola o conhecimento do interessado.

Princípio da revisibilidade – o procedimento é de natureza administrativa, cuja decisão é precária, por não transitar em julgado. A qualquer momento, a decisão proferida pelo oficial estará sujeita ao controle do Poder Judiciário. Como 11 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo, 14ª ed. Rio de janeiro: Forense, 2005, p.73 é possível retificar o registro a qualquer momento, entende-se que eventual prescrição fica prejudicada.

Estes princípios estão sintonizados com o direito público subjetivo dos interessados, assegurados constitucionalmente. A seguir mencionar-se-á um rol de princípios gerais do procedimento administrativo, norteadores da processualidade retificatória.

Princípio da legalidade – tratando-se de procedimento que tem por fim estabilizar expectativas com relação a fatos identificadores de imóvel no registro de imóveis, é necessário que toda a processualização esteja em conformidade com o Direito. Aplica-se a Lei dos registros públicos, em especial o artigo 213, inciso II e, na hipótese de lacuna, supletivamente o Código de Processo Civil.

Princípio da finalidade – busca-se, com a retificação a certeza jurídica. A certeza jurídica é de interesse público. Embora o interesse do requerente da retificação seja imediato, é mediatizado pelo interesse público da sociedade.

Princípio da razoabilidade – o procedimento administrativo é informal por excelência. Mas isto não quer dizer que o oficial, para formar juízo de valor, não possa fazer exigências não formalmente contempladas na legislação. Entretanto, a exigência deve ser razoável.

Princípio da proporcionalidade – a proporcionalidade está diretamente relacionado com o custo x benefício. Exigências descabidas, que impõem um custo maior do que o benefício, devem ser evitadas, pois poderão ser decretadas nulas pelo Judiciário.

Princípio da moralidade – o procedimento retificatório deve estar norteado por valores de moralidade pública. Meios e provas que não estejam sintonizados com os valores da sociedade e do ordenamento jurídico, não devem ser utilizados, sob pena de nulidade do procedimento.

Princípio da oficialidade – após a instauração do procedimento, a movimentação é feita pelo oficial do Registro de Imóveis.

Princípio da segurança jurídica – é o princípio finalístico da retificação. Busca-se a representação fática do objeto sobre o qual recai o direito, que é a configuração geodésica do imóvel, de sorte a distinguí-lo dos demais imóveis.

Princípio do interesse público – embora o interesse imediato da retificação seja do interessado particular, a sociedade também clama pela certeza e, conseqüentemente, pela segurança jurídica. Em outras palavras, é de interesse público a retificação daquilo que não esteja correto. Por ser de interesse público é que se faz necessária a intervenção de agente estatal. Princípio da verdade real – este princípio preconiza que o agente administrativo deve agir no sentido de chegar até a verdade real, independentemente das provas apresentadas. No procedimento retificatório o oficial somente deve decidir procedente o pedido, no momento em que firmar juízo de convicção a respeito da veracidade representativa das provas. Ao confrontar as provas apresentadas com os elementos identificadores dos imóveis lindeiros, terá que ocorrer um encaixe e não a sobreposição. Havendo sobreposição, deve julgar improcedente o pedido.

Princípio da eficiência – o procedimento deve ser eficiente tanto na sua dinâmica quanto na sua finalidade. No que diz respeito à primeira, deve ser eficiente no seu andamento e, em relação à última, a retificação deve efetivamente alcançar o seu intento, de sorte a evitar futuras retificações.

Princípio da publicidade – o procedimento é público. Qualquer interessado legítimo pode tomar conhecimento do procedimento e, se for o caso, impugná-lo.

A impugnação, entretanto, requer do impugnante comprovação da legitimidade de impugnar. Cabe ao oficial fazer o juízo de admissibilidade da impugnação.

Além dos princípios constitucionais e aplicados aos procedimentos administrativos, devem ser considerados também, alguns princípios norteadores do sistema registral imobiliário. Justifica-se a observância deles pela relação direta que a decisão proferida no procedimento possui com aquele.

Princípio da especialidade – o pedido de retificação e a documentação comprobatória apresentada, devem observar a perfeita especialização da configuração geodésica do imóvel, de sorte a extremá-lo dos demais, tornando-o inconfundível.

Princípio da unicidade de matrícula – preconiza que a todo imóvel corresponde uma matrícula e, a cada matrícula, tão-somente um imóvel. Viu-se que imóvel, para efeitos de matriculação, é uma porção terrestre e contínua, isto quer dizer, sem solução de continuidade imposta por bem público, acidente geográfico ou qualquer outra circunstância que possa, material ou juridicamente, impor segregação.

Princípio da disponibilidade – preconiza que o oficial do Registro de Imóveis, ao qualificar o pedido de retificação, deve controlar a disponibilidade quantitativa e qualitativa. A retificação não pode servir de título causal aquisitivo, transformador de posse em domínio, mas apenas de correção daquilo que não está correto, que não corresponde à verdade. Ao controlar a disponibilidade qualitativa, estará impedindo eventual sobreposição representativa de imóveis, com conseqüências danosas.

7. Da autonomia funcional do registrador público de imóveis O registrador público de imóveis é pessoa natural, que por força de um ato de delegação12 do Poder Público, recebe investidura estatal13 para exercer, em caráter privado, os serviços concernentes à instituição registral imobiliária. Investidura que lhe assegura a qualidade de agente público. 14 Ao receber a investidura, pratica os atos que lhe compete, não na qualidade de pessoa natural, em interesse próprio, mas sim, como um agente público. Esses atos, a despeito de serem públicos, são imputados ao registrador. O Oficial não presenta, mas sim representa o Estado. O Estado age, neste caso, por interposta pessoa, descentralizando em favor de particulares a função registral. Ao descentralizar a execução destas atividades o Estado não cria outra entidade, apenas transfere, por delegação, o seu exercício.

O representante do Estado age por sua conta e risco, nos exatos termos definidos pelo ordenamento jurídico, mesmo que estes atos apresentem natureza pública. É com base nesta premissa que se forjou um modelo de independência funcional. Este é o entendimento de Dip15 ao ensinar que: O modelo da independência jurídica do registrador e do notário, como foi antecipado, ajusta-se, entre nós, ao direito posto: notário e oficial de registro são "profissionais do direito", "dotados de fé pública" (art. 3.º, Lei 8.935, de 18.11.1994), gozando "de independência no exercício de suas atribuições" (art. 28, Lei cit.).

Daí que, submetidos à legalidade, têm o dever de observar "as normas técnicas estabelecidas" pelo Poder que o fiscaliza (inc. XIV, art. 30, Lei cit.).”

Em prosseguindo, aduz : Esse modelo, fundado em uma sólida teoria dos saberes jurídicos, corroborado pela tradição e compaginado, pois, com o direito posto – incluso o constitucional –, não se compatibiliza, é verdade, com o fato da poietização da profissão jurídica dos notários e registradores, nem com o fato da administrativização do objeto jurídico primeiro de sua tarefa: a autonomia de vontades contratantes, no caso dos notários, e a propriedade privada, no dos registradores. Tampouco o paradigma da independência jurídica de oficiais de registro e tabeliães é acomodação.

Ações Sociais

Desde o ano de 2008, funcionários do Registro de Imóveis de Lajeado constituíram uma Comissão Social que, engajada na realização de atividades sociais, realiza diversas campanhas com o objetivo de possibilitar a participação em atividades que contribuam no auxílio a pessoas necessitadas e demais ações benéficas para a sociedade.

Seguem abaixo as atividades realizadas pela Comissão Social:
Dezembro/2023: Campanha de Natal
Comissão Social: Augusto, Moreni, Gabriela e Isadora

Nossa campanha de Natal 2023 foi realizada com o objetivo de apoiar a Associação Marinês no Bairro Santo Antônio, na cidade de Lajeado.
Realizamos a doação de 16 kits de material escolar destinados a 16 jovens debutantes.
Outubro/2023: Campanha de dia das crianças
Entrega de brinquedos comprados com valor arrecadado pelos colaboradores do Registro de Imóveis, para campanha de dia das crianças.
Abril/2023: Campanha de Páscoa
Entidade Beneficiada: Centro de Referência da Assistência Social - CRAS

Objetivo da campanha: Promover uma páscoa mais feliz, para cada uma das 30 crianças, de 06 a 11 anos, assistidas pela entidade.
Abril/2022: Campanha de Páscoa
Mateus Miguel Conte

Este ano, nossa campanha será para ajudar o pequeno Mateus Miguel Conte. Um menino de 10 anos, portador de Histiociste das Células (um câncer muito raro). Ele sofre com esta doença desde os 04 anos de idade. Apesar de ter feito um transplante em 2019, no início deste ano, retornou ao Hospital Santo Antoônio, em Porto Alegre, para fazer alguns exames de rotina, e infelizmente teve a notícia de que a doença havia voltado. Assim, para ajudar a família com custos de estadia, transportes e tudo mais, uma vez ele está internado, e que sua mãe teve que sair do emprego para ficar com o menino no hospital, em tempo integral, arrecadaremos a quantia que cada funcionário puder e quiser contribuir. Com o valor total em mãos, faremos um depósito na conta da mãe dele.
Valor arrecadado: R$ 1.500,00
Outubro/2021: Campanha dia das criançcas
FUNDEF
As doações serão destinadas às crianças em tratamento na FUNDEF
Março/2021: Campanha de Páscoa
Escola: Lauro Matias Muller
Foram entregues alimentos e materiais de higiene, além de cestas básicas.
Dezembro/2020: Campanha De Natal
Escola: Lauro Matias Muller
Foram entregues 11 presentes, para 11 crianças no Bairro Planalto em Lajeado.
Dezembro/2018: Campanha De Natal
Beneficiada: Jaqueline, 18 anos, mora no Bairro Conventos e sofre de paralisia cerebral. Foram arrecadados alimentos, materiais de limpeza e higiene para a menina.


Outubro/2018: Campanha de Dia das Crianças
Entidade Beneficiada: Centro Assistencial da Escola Pedro Albino Muller - SLAN Santo Antônio, Lajeado. Foram arrecadados itens de higiene pessoal para adolescentes.
Dezembro/2017: Natal Simon Bolivar

Julho/2017: Dia do Idoso (LAR AMAI)

Março/2017: Pascoa (LAR DA MENINA)

Março/2017: Dia da Mulher - Casa de Passagem - Cruzeiro do Sul
Dezembro/2016: Campanha de Natal
Entidade Beneficiada: Abrigo Trezentos de Gidion, Lajeado.
Foram arrecadados brinquedos novos para presentear as crianças.
Banda FOK do Santo Antonio.


Outubro/2016: Dia das Crianças (Projeto Vida - Santo Antônio)
Hemovale (Doação de Sangue)
Inverno Solidário - SAIDAN
Dezembro/2015: Campanha de Natal
Entidade Beneficiada: Abrigo Trezentos de Gidion, Lajeado.
Foram arrecadados brinquedos novos para presentear as crianças.


Outubro/2015: Campanha do Dia das Crianças – “Só é possível ensinar uma criança a amar, amando-a”.
Entidade Beneficiada: APAE de Cruzeiro do Sul
Foram arrecadados Livros de colorir e lápis de cor.


Julho/2015: Campanha de Inverno.
Entidade Beneficiada: Asilo Lar Tabita, Lajeado.
Foram arrecadados e doados materiais de higiene pessoal, agasalhos, cobertores. Março/2015: Campanha de Páscoa Entidade beneficiada: Banda Fok do Santo Antonio, Lajeado Ação: Foram arrecadados chocolates para a confecção e entrega de ninhos de Páscoa.
Dezembro/2014: Campanha de Natal
Beneficiadas: crianças que deixaram cartinhas para o Papai Noel nos Correios
Ação: Arrecadação de brinquedos novos, para, na medida do possível, presentear as crianças de acordo com os pedidos contemplados nas cartinhas.


Abril/2014: Campanha de Páscoa
Entidade Beneficiada: Pousada da Criança, situada no Bairro Imigrante, Município de Estrela.
Ação: Arrecadação de doces para a confecção de ninhos de Páscoa.
Dezembro/2013: Campanha de Natal
Entidade Beneficiada: FUNDEF - Fundação para Reabilitação das Deformidades Crânio-Faciais
Ação: Foram arrecadados brinquedos novos para presentear as crianças que recebem tratamento pela fundação.


Outubro/2013: Campanha para família de Cruzeiro do Sul
Entidade Beneficiada: família do Município de Cruzeiro do Sul, que está passando por dificuldades.
Ação: Doação de doadas fraldas, leite, roupas infantis e alimentos não perecíveis.


Outubro/2013: Campanha do Dia das Crianças – “A leitura também alimenta”
Entidade Beneficiada: Creche EMEI Sabor da Infância, Bairro Igrejinha, Lajeado.
Ação: Doação de livros infantis para estimular a leitura para crianças de até 6 anos.


Agosto/2013: Campanha de Doação de Sangue
Entidade Beneficiada: Hemovale - Centro Hemoterápico do Vale do Taquari.


Julho/2013: Campanha de Inverno
Entidade Beneficiada: Asilo Lar Tabita, Lajeado.
Ação: Doação de fraldas geriátricas, açúcar, leite integral e roupas de cama.


Maio/2013: Campanha da AAPECAN
Entidade Beneficiada: AAPECAN – Associação de Apoio a Pessoas com Câncer, Lajeado.
Ação: Doação de fraldas geriátricas, açúcar, leite integral e roupas de cama.
Dezembro/2012: Campanha de Natal – “Natal Doce”
Entidade Beneficiada: Escola Municipal Francisco Oscar Karnal, Bairro Santo Antônio, Lajeado.
Ação: Doação de doces, pirulitos e chocolates.


Julho/Agosto/Setembro/2012: Campanha do Dia das Crianças
Entidade Beneficiada: Projeto Abaquar, Bairro Santo Antônio, Lajeado.
Ação: Doação de brinquedos e materiais educativos.


Julho/2012: Campanha de Doação dos Uniformes
Entidade Beneficiada: SADOM – Sociedade de Apoio ao Doente Mental - Hospital Psiquiátrico São Pedro de Porto Alegre.
Ação: Doação de todos os uniformes usados dos colaboradores do Registro de Imóveis, em condições de uso.


Maio/2012: Campanha de Auxílio SUS do HBB
Entidade Beneficiada: Ala do SUS do Hospital Bruno Born – HBB de Lajeado.
Ação: Foram arrecadados e doados materiais de higiene pessoal para a ala pública do Hospital Bruno Born.


Abril/2012: Campanha de Páscoa
Entidade Beneficiada: Asilo Lar Tabita, Lajeado.
Dezembro/2011: Campanha de Natal
Entidade Beneficiada: Creche Mundo Mágico, Lajeado.
Foram arrecadados e doados brinquedos.


Julho/2011: Campanha de Inverno
Entidade Beneficiada: FUNDEF - Fundação para Reabilitação das Deformidades Crânio-Faciais, para beneficiar as crianças e adolescentes atendidos pela entidade.
Foram arrecadados agasalhos e artigos de lã.


Abril/2011: Campanha de Páscoa
Entidade Beneficiada: Campanha realizada em benefício de uma colaboradora do próprio Registro de Imóveis, para contribuir com as despesas para o tratamento de leucemia de seu filho.
Dezembro/2010: Campanha de Natal
Entidade Beneficiada: SAIDAN – Sociedade de Assistência à Infância Desamparada e de Auxílio aos Necessitados, Lajeado.
Foram arrecadadas e doadas bonecas e carrinhos para as 20 crianças de 2 a 3 anos atendidas pela SAIDAN.


Outubro/2010: Campanha do Brinquedo
Entidade Beneficiada: Brinquedoteca do Hospital Bruno Born, Lajeado.
Foram arrecadados e doados brinquedos.


Julho/2010: Campanha do Idoso
Entidade Beneficiada: Lar do Idoso São José, Lajeado.
Foram arrecadados e doados materiais de limpeza e leite. Campanha realizada em comemoração ao Dia do Vovô e Vovó, transcorrido no dia 26 de julho de 2010.


Junho/2010: Campanha do Agasalho
Entidade Beneficiada: famílias cadastradas na secretaria da Igreja Matriz Santo Inácio de Loyola para o recebimento de donativos.
Foram arrecadados e doados agasalhos, cobertores e alimentos não perecíveis.


Abril/2010: Campanha de Páscoa – “Nesta Páscoa, doe chocolates”
Entidade Beneficiada: Centro Assistencial da Escola Pedro Albino Muller - SLAN Santo Antônio, Lajeado.
Foram arrecadados chocolates para a confecção de ninhos de Páscoa para as 41 crianças atendidas pela SLAN Santo Antônio.


Janeiro/2010: Campanha para Desabrigados de Enchente
Entidade Beneficiada: famílias atingidas e desabrigadas pela enchente ocorrida em 04 de janeiro de 2010.
Foram arrecadados e doados materiais diversos para as famílias alojadas no Clube União Centenário, Marques de Souza/RS.
Dezembro/2009: Campanha de Natal
Entidade Beneficiada: SAIDAN – Sociedade de Assistência à Infância Desamparada e de Auxílio aos Necessitados, Lajeado.
Foram arrecadados e doados brinquedos.


Outubro/2009: Campanha do Brinquedo – Dia das Crianças
Entidade Beneficiada: SAIDAN – Sociedade de Assistência à Infância Desamparada e de Auxílio aos Necessitados, Lajeado.
Foram arrecadados e doados brinquedos.


Julho/2009: Campanha de Inverno – “Aquecendo os pés você aquece um coração”
Entidade Beneficiada: Asilo São José de Conventos, Lajeado.
Foram arrecadadas pantufas para os idosos.


Junho/2009: Campanha de Inverno
Entidade Beneficiada: Casa de Acolhida da FUNDEF – Fundação para Reabilitação das Deformidades Crânio-Faciais.
Foram arrecadadas e doadas roupas e agasalhos.


Maio/2009: Campanha de Inverno
Entidade Beneficiada: Casa de Acolhida da FUNDEF – Fundação para Reabilitação das Deformidades Crânio-Faciais.
Foram arrecadados produtos de higiene pessoal, produtos de limpeza e agasalhos.
Outubro/2008: Campanha do Brinquedo
Entidade Beneficiada: Centro Assistencial da Escola Pedro Albino Müller – SLAN Santo Antônio, Lajeado. Estudam na entidade 153 crianças de até 14 anos.
Foram arrecadados e doados brinquedos.

Links Úteis

Anoreg-BR - Associação dos Notários e Registradores do Brasil
http://www.anoregbr.org.br/

ARPEN - RS
http://www.arpenrs.com.br

Assembléia Legislativa - RS
http://www.al.rs.gov.br

Associação dos Registradores e Notários do Alto Uruguai e Missões
http://arn-rs.not.br

Cadastro Geral de Cartórios
http://www.3.mj.gov.br/CartorioInter

Cartórios Online
http://www.cartorioonline.com.br

CNJ - Conselho Nacional de Justiça
http://www.cnj.gov.br

Colégio Notarial do Brasil - Conselho Federal
http://www.notariado.org.br

Colégio Notarial do Brasil - Seção do Rio Grande do Sul
http://www.colnotrs.org.br

COOPNORE - Cooperativa de Economia e Crédito Mútuo dos Profissionais da Área Notarial e Registral do Rio Grande do Sul
http://www.coopnore.com.br

IBAMA
http://www.ibama.gov.br

INSS - Ministério da Previdência Social (Consultas a Dados Previdenciários)
http://www.dataprev.gov.br/servicos/consulta.html

IRIB - Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
http://www.irib.org.br

IRTDPJBrasil - Instituto de Registro de Títulos e Documentos e de Pessoas Jurídicas do Brasil
http://www.irtdpjbrasil.com.br

Legislação Federal
http://www.presidencia.gov.br/legislacao

Previdência Social
http://www.previdenciasocial.gov.br

Procuradoria Geral da Fazenda Nacional
http://www.pgfn.fazenda.gov.br

Receita Federal
http://www.receita.fazenda.gov.br

Revista dos Tribunais
http://www.rt.com.br

Secretaria da Receita Federal
http://www.receita.fazenda.gov.br

SERJUS - Associação dos Serventuários de Justiça - MG
http://www.serjus.com.br

Sindiregis
http://www.sindiregis.com.br

STF - Superior Tribunal de Justiça
http://www.stj.gov.br

STJ - Supremo Tribunal Federalv http://www.stf.gov.br

Tribunal da Justiça do Estado do Rio Grande do Sul
http://www.tj.rs.gov.br

Universidade de Santa Cruz do Sul - UNISC
http://www.unisc.br

Univates
http://www.univates.br

Procuradoria-Geral do Estado do Rio Grande do Sul
http://www.pge.rs.gov.br/

Ministério Público do Rio Grande do Sul
http://www.mp.rs.gov.br/

Ministério Público Federal 4ª Região
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Jurisprudência

Testamento – Cláusulas de inalienabilidade e incomunicabilidade impostas pelos testadores – Falecimento destes – Pedido de levantamento das cláusulas pelo herdeiro – Sentença de improcedência – Flexibilização da vedação contida no artigo 1.676 do Código Civil de 1916 – Circunstâncias do caso concreto que autorizam o cancelamento dos gravames – Apelação provida. (Nota da Redação INR: ementa oficial)

EMENTA

TESTAMENTO – Cláusulas de inalienabilidade e incomunicabilidade impostas pelos testadores – Falecimento destes – Pedido de levantamento das cláusulas pelo herdeiro – Sentença de improcedência – Flexibilização da vedação contida no artigo 1.676 do Código Civil de 1916 – Circunstâncias do caso concreto que autorizam o cancelamento dos gravames – Apelação provida. (TJSP – Apelação Cível nº 0001016-73.2011.8.26.0011 – São Paulo – 4ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Carlos Henrique Miguel Trevisan – DJ 23.01.2012)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0001016-73.2011.8.26.0011, da Comarca de São Paulo, em que é apelante ADRIANO JOSE SINIGOY.

ACORDAM, em 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FÁBIO QUADROS (Presidente) e NATAN ZELINSCHI DE ARRUDA.

São Paulo, 6 de outubro de 2011.

CARLOS HENRIQUE MIGUEL TREVISAN – Relator.

RELATÓRIO

A sentença de fls. 38/40, cujo relatório é adotado, indeferiu o pedido de cancelamento das cláusulas de inalienabilidade e incomunicabilidade que incidem sobre o imóvel descrito na inicial, as quais foram impostas em testamentos deixados pelos genitores do requerente.

Apela o requerente (fls. 46/54) alegando que não houve justa causa nos testamentos a ensejar a manutenção das cláusulas.

O recurso foi regularmente processado.

É o relatório.

VOTO

Trata-se de pedido de levantamento de cláusulas de inalienabilidade e incomunicabilidade que gravam o imóvel localizado na Rua Eugênio de Medeiros, 461, São Paulo, alegando o apelante que recebeu referido imóvel como parte da herança de seus pais, que, nos seus respectivos testamentos (fls. 28 e 29), estabeleceram referidas cláusulas, averbadas junto à matrícula do imóvel em abril de 1988 (fl. 21).

Não se desconhece o teor do artigo 1.676 do Código Civil de 1916, em vigor ao tempo da imposição da cláusula restritiva instituída pelos testadores, ocasião em que a lei não exigia justa causa para a imposição de cláusulas à legítima, ao contrário do que passou a ocorrer com a entrada em vigor do Código Civil de 2002 (artigo 1.848).

Contudo, conforme orientação jurisprudencial adotada por esta Câmara, é de se atenuar a sua aplicação:

Extinção de cláusulas restritivas. Admissibilidade. Doadores impuseram impenhorabilidade e inalienabilidade, mas permaneceram com usufruto vitalício do bem. Mera liberalidade não ocorrida. Egoísmo atroz que não pode prevalecer. Vários donatários já faleceram. Função social da propriedade é de rigor. Apelo provido (Apelação 403.209-4/7-00, Relator Desembargador Natan Zelinschi de Arruda, 15/12/2005)

O prevalecimento dos gravames se apresenta como lesivo aos interesses do apelante uma vez que estará impedido de melhor aproveitar o patrimônio recebido, motivo pelo qual o pedido merece acolhida, respeitado o entendimento diverso constante da r. sentença recorrida.

Conforme orientação jurisprudencial adotada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, é de se atenuar a sua aplicação “quando verificado que a desconstituição da cláusula de impenhorabilidade instituída pelo testador se faz imprescindível para proporcionar o melhor aproveitamento do patrimônio deixado e o bemestar do herdeiro, o que se harmoniza com a intenção real do primeiro, de proteger os interesses do beneficiário” (REsp. 303.424-GO, Relator Ministro Aldir Passarinho Júnior).

No mesmo sentido, “A regra restritiva à propriedade encartada no art. 1.676 deve ser interpretada com temperamento, pois a sua finalidade foi a de preservar o patrimônio a que se dirige, para assegurar a entidade familiar, sobretudo aos posteriores, uma base econômica e financeira segura e duradoura. Todavia, não pode ser tão austeramente aplicada a ponto de se prestar a ser fator de lesividade de legítimos interesses, desde que o seu abrandamento decorra de real conveniência ou manifesta vantagem para quem ela visa proteger associado ao intuito de resguardar outros princípios que o sistema da legislação civil encerra” (REsp. 34.744/SP, relator Ministro César Asfor Rocha).

Igual posicionamento consta de precedentes mais recentes deste Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

Testamento. Pedido de cancelamento de cláusulas restritivas. Necessidade de abrandamento do disposto no art. 1.676 do Código Civil de 1916, aplicável à espécie. Precedentes do STJ. Cláusula lesiva aos interesses dos apelantes, já que impedidos do melhor aproveitamento do patrimônio recebido. Cancelamento determinado. Apelo provido (Apelação nº 504.225-4/6-00, Relator Desembargador Donegá Morandini, 24.6.2008)

É perfeitamente possível a retirada dos gravames de inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade em favor do princípio social da propriedade, no caso, presente, não se justificando que se perpetue os gravames quando desapareceram as razões que nortearam a testadora. Gravame que onera o beneficiário demasiadamente. Cancelamento em atenção ao princípio da razoabilidade. Recurso provido para, afastada a extinção da ação, julgá-la procedente na forma do art. 515, § 3º, do CPC, para decretar o cancelamento dos vínculos que recaem sobre o imóvel objeto da ação, sem qualquer outra imposição à recorrente o que, vale dizer, sem necessidade de subrogação das restrições (Apelação nº 6.462.454.300. Relator Desembargador Octavio Helene, 27.10.2009)

A ação fica, portanto, julgada procedente, determinando-se o cancelamento das referidas cláusulas de inalienabilidade e incomunicabilidade instituídas nos testamentos de fls. 28 e 29, com expedição dos necessários mandados ao Cartório de Registro de Imóveis competente.

Ante o exposto, o voto é no sentido de se dar provimento à apelação.

CARLOS HENRIQUE MIGUEL TREVISAN – Relator.
Fonte: Boletim Eletrônico INR nº 5117 - Jurisprudência (17/02/2012)
Proprietário que vende imóvel e não registra transferência é o devedor do IPTU (TJ/RS) Proprietário que vende imóvel e não registra a transferência é o devedor de IPTU Qui, 08 de Março de 2012 09:30

A 22ª Câmara Cível do TJRS negou pedido de isenção de dívida de IPTU a ex-proprietário que não registrou a transferência do imóvel.

O autor vendeu o imóvel em 1988, mas não registrou a transferência em cartório. Com uma dívida em seu nome de quase R$ 10 mil em IPTU, ele recorreu à Justiça para cobrar o débito do comprador do imóvel.

Isso porque, no contrato firmado entre as partes, ficou definido que os impostos decorrentes do imóvel ficariam a cargo do comprador e atual morador do imóvel. A venda, porém, não foi registrada no cartório Imobiliário e a Prefeitura de Porto Alegre cobra do autor da ação a dívida gravada na matrícula do imóvel.

Sentença

O processo tramitou na 8ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre, onde o Juiz de Direito João Pedro Cavalli Júnior considerou o pedido improcedente.

Segundo o magistrado, o fato de o imóvel não ter sido transferido para o promitente comprador independe para a apuração da obrigação tributária, pois o artigo 34 do Código Tributário Nacional é claro ao estabelecer que o sujeito passivo do IPTU é o proprietário do imóvel, o titular de seu domínio útil ou o possuidor, devendo estes responderem pelas obrigações daí decorrentes perante a municipalidade.

Conforme Lei Complementar Municipal nº 7/73, tanto o comprador como o alienante devem comunicar à Secretaria Municipal da Fazenda a transferência da propriedade.

No caso dos autos, a propriedade por parte dos autores é inquestionável, conforme se vislumbra da certidão do Registro de Imóveis da 2ª Zona de Porto Alegre, afirmou o magistrado.

Houve recurso da decisão.

Apelação

No TJRS, a Desembargadora relatora, Denise Oliveira Cezar, da 22ª Câmara Cível confirmou a sentença do Juízo do 1º Grau. No entendimento da magistrada, os autores permaneceram figurando como proprietários do imóvel junto ao Registro Imobiliário, sem promover o registro do ato de transferência.

A Desembargadora também informou que o Superior Tribunal de Justiça já uniformizou interpretação sobre o tema. Segundo o STJ, tanto o promitente comprador do imóvel, possuidor a qualquer título, quanto o seu promitente vendedor, que detém a propriedade perante o Registro de Imóveis, são contribuintes responsáveis pelo pagamento do IPTU, cabendo ao legislador municipal eleger o sujeito passivo do tributo.

Por unanimidade, os Desembargadores desproveram o recurso de apelação.

Também participaram do julgamento os Desembargadores Carlos Eduardo Zietlow Duro e Maria Isabel de Azevedo.

Apelação nº 70046127445

Fonte: Boletim eletrônico ANOREG/BR - 08/03/2012
Superior Tribunal de Justiça

DIREITO CIVIL. VENDA DE ASCENDENTE A DESCENDENTE SEM ANUÊNCIA DOS DEMAIS. ANULABILIDADE. REQUISITOS DA ANULAÇÃO PRESENTES. 1.- Segundo entendimento doutrinário e jurisprudencial majoritário, a alienação feita por ascendente à descendente é, desde o regime originário do Código Civil de 1916 (art. 1132), ato jurídico anulável. Tal orientação veio a se consolidar de modo expresso no novo Código Civil (CC⁄2002, art. 496). 2.- Além da iniciativa da parte interessada, para a invalidação desse ato de alienação é necessário: a) fato da venda; b) relação de ascendência e descendência entre vendedor e comprador; c) falta de consentimento de outros descendentes (CC⁄1916, art. 1132), d) a configuração de simulação, consistente em doação disfarçada (REsp 476557⁄PR, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, 3ª T., DJ 22.3.2004) ou, alternativamente, e) a demonstração de prejuízo (EREsp 661858⁄PR, 2ª Seção, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, Dje 19.12.2008; REsp 752149⁄AL, Rel. Min. RAUL ARAÚJO, 4ª T., 2.10.2010). 3.- No caso concreto estão presentes todos os requisitos para a anulação do ato. 4.- Desnecessidade do acionamento de todos os herdeiros ou citação destes para o processo, ante a não anuência irretorquível de dois deles para com a alienação realizada por avô a neto. 5.- Alegação de nulidade afastada, pretensamente decorrente de julgamento antecipado da lide, quando haveria alegação de não simulação de venda, mas, sim, de efetiva ocorrência de pagamento de valores a título de transferência de sociedade e de pagamentos decorrentes de obrigações morais e econômicas, à ausência de comprovação e, mesmo, de alegação crível da existência desses débitos, salientando-se a não especificidade de fatos antagônicos aos da inicial na contestação (CPC, art. 302), de modo que válido o julgamento antecipado da lide. 6.- Decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina subsistente, recurso especial improvido. (STJ – REsp nº 953.461 – SC – 3ª Turma – Rel. Min. Sidnei Beneti – DJ 17.06.2011)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Nancy Andrighi e Massami Uyeda votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 14 de junho de 2011 (data do julgamento).

MINISTRO SIDNEI BENETI – Relator.

RELATÓRIO

O EXMO SR. MINISTRO SIDNEI BENETI (Relator):

1.- PATRICK SANTOS GOMES interpõe recurso especial com fundamento nas alíneas "a" e "c" do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, Relator o Desembargador MARCUS TULIO SARTORATO, cuja ementa ora se transcreve (fls. 108):

ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO - CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL DE ASCENDENTE PARA DESCENDENTE (NETO) - CERCEAMENTO DE DEFESA ANTE O JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE - INSUBSISTÊNCIA - EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS SUFICIENTES À PLENA CONVICÇÃO DO JULGADOR - AVENTADO LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO DOS DEMAIS HERDEIROS DO ALIENANTE - DESNECESSIDADE NA HIPÓTESE - PLEITO QUE SOMENTE VISA À DESCONSTITUIÇÃO DE CONTRATO POR INOBSERVÂNCIA DA FORMA PREVISTA EM LEI - PRELIMINARES AFASTADAS - NEGÓCIO CELEBRADO SOB A ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 - INEXISTÊNCIA DE PROVA ACERCA DA ANUÊNCIA DOS DEMAIS DESCENDENTES COM A ALIENAÇÃO PERFECTIBILIZADA - INTELIGÊNCIA DO ART. 1.132 DO CÓDIGO CIVIL (CORRESPONDENTE AO ART. 496 DO CC EM VIGOR) - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. "A transmissão de bens do ascendente ao descendente, se onerosa, deverá obedecer ao mandamento contido no art. 1.132 do CC⁄16 e, em seguida, obrigará o donatário à colacionar no inventário aquilo que recebeu (art. 1.785, CC⁄16). Sendo a transmissão efetuada por interposta pessoa (simulação relativa, art. 102, I, do CC⁄16), afigura-se nítido o propósito de burlar a lei, em flagrante prejuízo aos direitos hereditários dos demais descendentes, que ficam, assim, legitimados para pleitear a anulação do negócio" (AC nº 2005.002158-0, Des.ª Maria do Rocio Luz Santa Rita).

2.- Os embargos de declaração opostos (fls. 76⁄79) foram rejeitados (fls. 82⁄85).

3.- O recorrente alega que o processo é nulo, porque a ação que visa a anular a alienação de ascendente a descendente por falta de anuência dos demais herdeiros teria como litisconsortes necessários todos os herdeiros do doador. No caso, como esses herdeiros não teriam sido chamados a integrar o pólo passivo da demanda, que caracterizaria nulidade do processo por carência de ação. Afirma que essa tese foi suscitada na contestação, mas não foi apreciada na sentença. Isso teria caracterizado "supressão de instância", cerceamento de defesa e falta de motivação e, por conseguinte, violação dos artigos 131, 165 e 458 do Código de Processo Civil.

4.- Afirma que o julgamento antecipado da lide sem produção de prova pericial teria representaria ofensa ao artigo 330, I, do Código de Processo Civil.

5.- Sustenta que a simples ausência de consentimento dos demais herdeiros não é suficiente para anular a alienação feita a descendente. Para tanto seria preciso comprovar, ainda, a existência de simulação. O Tribunal de origem, assim não entendendo, teria malferido os artigos 496 e 1.132 do Código Civil de 1916.

É o relatório.

VOTO

O EXMO SR. MINISTRO SIDNEI BENETI (Relator):

6.- Os autores, ARLEI GOMES, divorciado, e sua irmã, por parte de pai, GISELI CARDOSO GOMES, solteira, moveram ação anulatória de venda de um imóvel urbano, realizada pelo pai de ambos, Sebastião Joaquim Gomes a seu neto, PATRICK SANTOS GOMES, solteiro, sobrinho dos autores, filho de Dirlei, irmão dos autores, o qual havia passado a residir no imóvel com o pai alienante após a morte da companheira deste, Maria Cardoso Machado, alienação essa feita por escritura pública de 18.10.2002, registrada no dia 11.11.2002, mas de que os autores somente teriam tido conhecimento quando o avô alienante deixou no imóvel o filho Dirlei e sua família, inclusive o adquirente, filho deste, quando saiu do imóvel, indo residir com a ex-esposa, Célia Machado Gomes, ao com ela reconciliar-se em novo casamento.

Têm-se os seguintes fatos e a cronologia dos atos jurídicos que segue, para o deslinde das questões em julgamento:

a) O avô vendedor, Sebastião, casou-se com Célia Machado Gomes, de quem se separou, tendo o casal tido os filhos 1) Arlei (ora autor-recorrido), 2) Célia, 3) Maria das Dores e 4) Dirlei.

b) Viveu, o avô-vendedor, Sebastião, em sociedade de fato com Valquíria João Pereira, que era proprietária do imóvel, adquirido antes da união (matrícula de 24.10.1975, fls. 41), bem como proprietária de outro imóvel no litoral, a qual veio a falecer em 21.3.1976.

d) Valquíria veio a falecer no dia 21.3.76, de modo que o imóvel, juntamente com o outro no litoral, foi dela herdado pelo seu único herdeiro, o filho Dirlei.

e) Após a morte de Valquíria, Sebastião, o avô-vendedor, veio a constituir nova sociedade de fato com a companheira Maria Cardoso Machado, tendo, com ela, tido a filha (ora autora) Giseli Cardoso Gomes (nascida a 16.1.1978, fls. 15).

f) Dirlei, filho de Sebastião, o avô-vendedor, e da falecida companheira Valquíria, veio, por sua vez, a falecer no dia, em 8.3.1988, sem filhos, de modo que o imóvel, por ele recebido de Valquíria, juntamente com outro no litoral, foi herdado por Sebastião, o avô-alienante, posteriormente ao nascimento dos autores Arlei e Gisel (nascidos, respectivamente, a 5.1.1952, fls. 14, e 16.1.1978, fls. 15), recebendo o imóvel em inventário realizado na Comarca de Içara, fls. 30).

g) Em 18.10.2002 (fls. 17), o avô-vendedor, Sebastião, alienou o imóvel para neto (Patrick), então com 21 anos de idade (nascido a 29.1.1980, fls. 16), tendo sido a escritura pública de compra e venda de 18.10.2002, registrada no dia 11.11.2002 (fls. 17).

7.- Segundo entendimento doutrinário e jurisprudencial majoritário, a alienação feita por ascendente a descendente é, desde o regime originário do Código Civil de 1916 (art. 1132), ato jurídico anulável. Tal orientação veio a se consolidar de modo expresso no novo Código Civil (CC⁄2002, art. 496).

8.- Também se consolidou o entendimento de que, para a invalidação desses atos de alienação é necessário, além da iniciativa da parte interessada: a) fato da venda; b) relação de ascendência e descendência entre vendedor e comprador; c) falta de consentimento de outros descendentes (CC⁄1916, art. 1132), d) a configuração de simulação, consistente em doação disfarçada (REsp 476557⁄PR, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, 3ª T., DJ 22.3.2004) ou, alternativamente, e) a demonstração de prejuízo (EREsp 661858⁄PR, 2ª Seção, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, Dje 19.12.2008; REsp 752149⁄AL, Rel. Min. RAUL ARAÚJO, 4ª T., 2.10.2010).

9.- No caso, regido pelo Código Civil de 1916, em que não há nenhuma dúvida a respeito da configuração dos três requisitos objetivos, ou seja, a dos três primeiros requisitos (a) fato da venda; b) relação de ascendência e descendência entre vendedor e comprador; (c) falta de consentimento de outros descendentes (CC⁄1916, art. 1132) já mais que presente a nulidade.

10.- Os demais requisitos (“d” e “f”, supra), resultantes da evolução doutrinária e jurisprudencial, operada ainda sob a regência do Cód. Civil de 1916, também estão presentes no caso concreto dada a prática de ato anulável, contra o qual se insurgem os dois autores, na condição de prejudicados, quer dizer, impedindo, eles, a sanação da nulidade, diante do que o que de início era apenas anulável se consolida como nulo.

11.- Com efeito, a simulação de negócio jurídico de pagamento de pretenso débito atinente a transferência de parte da sociedade Tereza Gomes & Cia Ltda e a saldo de obrigações morais e materiais do avô-vendedor para com o filho, genitor do neto adquirente, não teve em seu prol nenhuma credibilidade, seja no campo probatório, visto que nenhum documento veio aos autos, como início de prova da seriedade da alegação (de forma que a ausência de credibilidade da alegação não podia autorizar produção de outras provas, não impedindo o julgamento antecipado da lide), seja porque a própria alegação veio inteiramente vazia de credibilidade, consistindo em mera referência genérica, sem pormenores ou circunstâncias, como datas, fatos, atinentes a aludidas alegações (fls. 31), descumprido, portanto, o ônus da impugnação especificada de fatos alegados na inicial (CPC, art. 302).

12.- O prejuízo aos filhos ora autores é evidente, pois, com a retirada do valor do bem do ativo patrimonial do avô-doador, passam eles, filhos, a ter patrimônio sucessível do genitor em menor monta – fato que, por óbvio, é escusado mais demonstrar.

13.- Por fim, nunca se poderia concluir pela anuência dos demais descendentes, do só fato de não haverem sido acionados como litisconsortes, ou não haverem sido consultados no decorrer do processo.

Se houvesse tal anuência, devia ela ter sido providenciada previamente à celebração do negócio jurídico de venda, ou, quando muito, para sanar o vício de anulabilidade, devia essa anuência ter vindo documentada ulteriormente, por intervenção espontânea ou juntada de declarações válidas de aludidos descendentes aos autos.

E, de qualquer forma, ainda que viesse a anuência de aludidos descendentes não participantes do processo, sempre restaria a não-anuência dos autores, irrecusável ante o próprio acionamento, a afastar qualquer conclusão de anuência.

14.- Pelo exposto, deve subsistir o julgamento do caso dado pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, negando-se provimento ao Recurso Especial.

MINISTRO SIDNEI BENETI – Relator.

Fonte: ANO XI - Boletim nº 5187 - São Paulo, 02 de Abril de 2012
EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. USUCAPIÃO. BENS IMÓVEIS. DIREITO CIVIL. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. “DOAÇÃO VERBAL” OU “PROMESSA DE DOAÇÃO”, INSTITUTO INADMITIDO PELO ORDENAMENTO JURÍDICO, NÃO CONFEREM POSSE COM ÂNIMO DE DONO AO PRETENSO FUTURO DONATÁRIO, QUE SOMENTE POSSUI MERA EXPECTATIVA DE DIREITO DE SE TORNAR PROPRIETÁRIO CASO A DOAÇÃO SEJA FORMALIZADA POR ATO DE LIVRE DISPOSIÇÃO DE VONTADE DO DOADOR. AÇÃO DE USUCAPIÃO ESPECIAL IMPROCEDENTE. APELO NÃO PROVIDO. UNÂNIME. (TJRS – Apelação Cível nº 70039524384 – Santa Cruz do Sul – 17ª Câmara Cível – Rel. Des. Bernadete Coutinho Friedrich – DJ 09.09.2011)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores DES.ª ELAINE HARZHEIM MACEDO (PRESIDENTE E REVISORA) E DES. LUIZ RENATO ALVES DA SILVA.

Porto Alegre, 11 de agosto de 2011.

DES.ª BERNADETE COUTINHO FRIEDRICH – Relatora.

RELATÓRIO

DES.ª BERNADETE COUTINHO FRIEDRICH (Relatora):

Trata-se de recurso de apelação interposto por CARLOS ALBERTO KAUFMANN e LUCIANA LEANDRO KAUFMANN contra sentença proferida na ação de usucapião especial ajuizada em desfavor de ELSTOR ROHSLER e NILSI ROHSLER.

De início, adoto o relatório consignado na sentença:

“Trata-se de pretensão visando obter provimento jurisdicional declaratório a respeito da ocorrência de prescrição aquisitiva em favor dos postulantes sobre um terreno e uma casa. Diz que teria sido funcionário do Frigorífico Frigomonte Ltda, e diante das dificuldades financeiras pela qual passava dita empresa, a pedido do sócio gerente Ary Schunke, teria o autor Carlos aceitado figurar no quadro societário na condição de sócio, em substituição à esposa dele, Érica Schunke. Em troca disso, Ary Schunke teria doado o imóvel e a casa para que o autor morasse com sua família. Tece considerações sobre as incomodações pelas quais passou em função das dívidas da sociedade e a promessa do sócio Ary de que tivesse paciência, pois a casa onde morava não lhe seria tomada. Também noticia a existência de vendas efetivadas por Ary Schunke e esposa, logo antes de seu falecimento, e a notificação que recebeu dos compradores para desocupar o imóvel. Tentam convencer de que a área vendida para os notificantes não compreende o imóvel que pretendem usucapir e que lhe foi doado, até porque, se não fosse assim, o Sr. Ary teria exigido a devolução do imóvel antes de vendê-lo. Argumenta que o registro da venda feita aos notificantes diz que foi transferida apenas a fração de terra onde está construído um prédio de alvenaria próprio para matadouro, sem qualquer menção à casa de moradia onde residem. Invocam a existência de usucapião urbano, pois ocupam a área há mais de cinco anos, com intenção de donos. Pedem a procedência da demanda, e o apensamento à ação revindicatória, que deve ser sobrestada e após julgada improcedente.

Feitas as citações e notificações de praxe, contesta a pretensão os proprietários atuais do imóvel, Elstor Rohsler e sua esposa, alegando que eles não possuem ânimo de dono e que o anterior proprietário apenas permitiu que ali morassem porque o autor era funcionário de sua empresa. Diz que não existem provas da alegada doação, e a própria esposa do falecido não a confirma. Sustenta que o falecido Ary chegou a residir na casa quando esteve separado de fato da esposa. Afirma que o imóvel está sim na fração de área que adquiriu, pois na matrícula do imóvel consta que os demais condôminos possuem frações ideais sem benfeitorias e eles emitiram declarações de que não possuem interesse no imóvel litigioso. Argumenta que os recibos de água e luz em nome do falecido e também em nome do contestante confirma que havia oposição à ocupação dos autores. Impugna a planta apresentada com a inicial, sustentando que a área é maior do que 250m² e também porque se situa dentro da fração adquirida pelos contestantes. Pede a improcedência.

Manifestam-se os autores em réplica, argumentando pela necessidade de perícia contábil na empresa Frigomonte, a fim de demonstrar que falta com a verdade a viúva. Também argumentam que o fato de ter sido delimitada a área usucapienda para o limite do usucapião urbano não configura nenhuma irregularidade.

Diligências requeridas pelo Ministério Público foram cumpridas. Na instrução, foram tomados os depoimentos pessoais e ouvidas quatro testemunhas. As partes debateram em audiência, reiterando os argumentos já lançados por escrito e o Ministério Público, em parecer final, opina pelo julgamento de improcedência da pretensão, diante da falta de prova da posse com ânimo de dono.”

Após a regular tramitação do feito, sobrevém sentença de improcedência da ação.

Inconformados, os autores interpõem recurso de apelação. Em suas razões, reiteram que a posse exercida sobre o imóvel tem origem em doação verbal realizada por ARI SCHUNKE, em gratidão ao fato de haver ingressado na sociedade frigorífica em substituição à sua esposa (ÉRICA MULLER SCHUNKE).

Afirmam que aparentes contradições no depoimento pessoal prestado pelo autor CARLOS reside em sua ingenuidade e em sua precária instrução escolar, de modo que os fatos narrados devem ser analisados em seu todo, no sentido de que o imóvel usucapiendo lhe foi dado a título de doação verbal, que apenas não foi formalizada pelo passamento do doador.

Aduzem haver os demais depoimentos, colhidos em audiência de instrumento e julgamento, comprovado o exercício de posse com ânimo de dono por período superior a cinco anos, estando presentes os demais requisitos objetivos à aquisição originária do domínio pela usucapião especial urbana.

Dizem, também, não se mostrar razoável concluir que a sua posse tem origem em um contrato de comodato, na medida em que o proprietário jamais tomou qualquer medida no intuito de reaver a posse direta antes do seu passamento, apenas o fazendo os apelados, depois de transcorridos mais de cinco anos, conduta incompatível com a do verdadeiro proprietário.

Postulam o provimento do apelo, julgada procedente a ação.

Contra-arrazoado o recurso, sobem os autos a esta Instância, vindo conclusos.

Dada vista ao Ministério Público, sobrevém parecer opinando pelo conhecimento e não provimento do apelo.

Observado o disposto nos arts. 549, 551 e 552, do CPC, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

DES.ª BERNADETE COUTINHO FRIEDRICH (Relatora):

Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do apelo.

Trata a espécie de ação de usucapião especial urbana, onde os apelantes pretendem a aquisição originária de domínio concernente a imóvel que lhes foi doado pelo antigo proprietário.

Em seu turno, os apelados afirmam que os antigos proprietários do imóvel cederam a posse aos apelantes por contrato de comodato, tanto que estes jamais se insurgiram quando da alienação do bem pelos comodantes. Aduzem, também, que o imóvel usucapiendo possui dimensão superior a 250 m², obstaculizando a aquisição originária do domínio pela usucapião especial urbana.

Não prospera o recurso, impondo-se a manutenção da sentença apelada, por seus próprios e jurídicos fundamentos, os quais peço vênia para adotar, agora, como razões de decidir, deixando de transcrevê-los, todavia a fim de evitar indesejada tautologia.

A título de reforço de argumentação, acrescento que o ordenamento jurídico brasileiro não admite a figura da “promessa de doação”, na medida em que futura coerção para que o ato de vontade fosse emanada pelo doador afeta diretamente a liberalidade, condição sine qua non a esta espécie de contrato.

Poder-se-ia cogitar que, justamente pelo fato de a afirmada doação não haver sido formalizada por escritura pública, mostra-se hígida a pretensão relativa à aquisição originária do domínio; caso contrário, sequer haveria interesse em usucapir. Todavia, em se admitindo que o antigo proprietário tivesse a intenção de doar o imóvel usucapiendo, conclui-se que os apelados possuíam mera expectativa de tornarem-se proprietários, o que somente se daria pela averbação da escritura pública de doação. E, esta mera expectativa de direito não se concretizou, mormente porque o antigo proprietário, pretenso futuro doador, alienou o direito de propriedade aos apelados, conduta esta evidentemente incompatível com a malfadada “doação verbal”, por meio da qual os apelantes pretendem justificar o exercício de posse ad usucapionem.

Neste sentido, de observar que o próprio apelante, incauto, consoante os fatos narrados nas razões de apelo, asseverou ter ciência de que para adquirir a propriedade seria necessário “fazer uma documentação e registrar” (fl. 156), donde se evidencia a ausência de exercício de posse com ânimo do dono. Isto, porque, conforme referido anteriormente, enquanto não formalizada a doação, apenas se pode aventar em mera expectativa de direito à aquisição da propriedade, de modo que a posse exercida pelos apelantes estava submetida à posse indireta do antigo proprietário (pretenso futuro doador).

Deste modo, o exercício de posse com ânimo de dono se subsume ao período posterior à alienação do direito de propriedade pelo presumido comodante aos apelados, quando quebrado o vínculo entre o possuidor direto e indireto. Contudo, os apelados, que adquiriram o direito real de propriedade em data de 09/05/2002 (fl. 08, autos da ação reivindicatória), notificaram os apelantes a desocupar o imóvel em 24/08/2006 (fl. 09, autos da ação reivindicatória), verificando-se, pois, interregno inferior a cinco anos, prazo insuficiente à aquisição originária do domínio pela usucapião especial.

Ao final, conforme observa a sentença, a comprovação de pagamento de impostos territoriais e contas de consumo de água e energia elétrica constituem apenas indícios de prova quanto ao exercício possessório, oferecendo mínimos elementos de convicção, por outro lado, quanto à natureza da posse.

Em face do exposto, voto no sentido de negar provimento ao apelo, mantida hígida a sentença.

DES.ª ELAINE HARZHEIM MACEDO (PRESIDENTE E REVISORA) – De acordo com o(a) Relator(a).

DES. LUIZ RENATO ALVES DA SILVA – De acordo com o(a) Relator(a).

DES.ª ELAINE HARZHEIM MACEDO – Presidente – Apelação Cível nº 70039524384, Comarca de Santa Cruz do Sul: "NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME."

FONTE: INR - ANO XI - Boletim nº 5203 - São Paulo, 13 de Abril de 2012

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Documentos para apostilamento: quais podem e quais não podem?

Documentos para apostilamento: quais podem e quais não podem?
Vai viajar e precisa que seus documentos sejam válidos e tenham efeito em outros países? O Apostilamento existe para isso. Ele é como um certificado emitido nos termos da Convenção da Apostila que autentica a origem de um Documento Público. Para saber quais documentos para apostilamento podem ser feitos e quais não podem, continue lendo este texto.

O que é o apostilamento?
A Apostila de Haia é um acordo que facilita o reconhecimento de documentos no exterior, sendo essencial um selo ou carimbo emitido pelas autoridades competentes. Esse selo é colocado no documento como forma de certificar sua autenticidade.

É usado para documentos feitos em território nacional e que precisam ter eficácia em outros países. No entanto, é fundamental lembrar que os documentos para apostilamento são válidos apenas entre países que fazem parte da Convenção.

Documentos para apostilamento
Existem documentos que podem ser apostilados e documentos que não podem. Confira a determinação:

Documentos que a Apostila se aplica
Documentos de natureza particular que tenham sido previamente reconhecidos por notário ou autoridade pública competente;
Documentos públicos provenientes de uma autoridade ou agente público vinculado a qualquer jurisdição do Estado, inclusive os documentos provenientes do Ministério Público, de escrivão judiciário ou de oficial de justiça;
Documentos administrativos;
Atos notariais;
Declarações oficiais apostas em documentos de natureza privada, como certidões que comprovem o registro de um documento ou a sua existência em determinada data
Reconhecimentos de assinatura.
Documentos que a Apostila não se aplica
Documentos expedidos por agentes diplomáticos ou consulares;
Documentos administrativos relacionados a operações mercantis ou alfandegárias;
Documentos a serem apresentados em países não signatários da Convenção da Haia. Nesses casos, o processo de legalização continuará a ser realizado pelo Ministério das Relações Exteriores, por seus escritórios regionais (no Brasil) e Embaixadas e Repartições Consulares (no exterior).

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